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Cultura

Élida Almeida, uma estrela cabo-verdiana em ascensão

31 de maio de 2017

É a nova "menina" da música de Cabo Verde. Élida Almeida conquista os palcos internacionais com sucesso, dando outra luz aos ritmos cabo-verdianos com raízes profundamente africanas.

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Sängerin Elida Almeida aus den Kapverden bei ihrem Auftritt auf dem Africa Festival in Würzburg
Foto: DW/A. Gensbittel

Foi com um sorriso simpático que a nova revelação de Cabo Verde deu uma entrevista à DW África em Wuerzburg, no Afrika Festival, o maior evento de música africana da Alemanha. Com humildade e simplicidade falou-nos de si, da sua música e da sua Santiago.

DW África: A Élida está a internacionalizar em ritmos menos conhecidos de Cabo Verde, como o batuco, tabanka e funaná, se compararmos com a morna e a coladera. Porque apostou nesses estilos?

Élida Almeida (EA): Não apostei, é algo que está na minha genética, no meu sangue. Sou da Ilha de Santiago, Cabo Verde é composto por dez ilhas, é como se cada ilha tivesse a sua cultura, o seu estilo de música. Na Ilha de Santiago o batuco, funaná e tabanka são estilos mais consumidos e são o que identifica a Ilha de Santiago, então isto está no sangue.

DW África: Que lugar ocupa a música que possui mais raízes africanas no seu arquipélago?

EA: Santiago. A iIha de Santiago é o lugar onde se sente uma forte presença de África, da influência e de tudo o que foi o período da escravatura. Também foi a ilha onde os escravos pararam por muito tempo e eu particularmente sou de montanhas onde os escravos se foram esconder no meio de toda aquela confusão. Então, a Ilha de Santiago é onde se sente a maior presença da música africana.

DW África: Referia-me ao panorama musical...

Élida Almeida Sänger aus Cap Verde
Foto: N. Issufo

EA: Tem o seu lugar. Há pessoas que gostam da morna, há pessoas que gostam de ouvir uma coladera e há outras que gostam de algo mais festivo, gostam de dançar batuco, tabanka e funaná. Então, se formos a ver é muito relativo. Mas como eu disse, faz parte da música tradicional de Cabo Verde. É claro que a morna é o estilo que identifica melhor Cabo Verde se falarmos do país, a morna e a Cesária [Évora], mas os outros ritmos estão no "ranking" da música tradicional de Cabo Verde.

DW África: Vem de uma região carenciada de Cabo Verde, e como dizem que todo cabo-verdiano já nasce a tocar um instrumento ou a cantar, deve haver por lá muito talento. As oportunidades e visibilidade chegam aos novos talentos de Santiago?

EA: Chegar não chegam, temos de correr atrás e temos de saber o que queremos. Eu, por exemplo, não nasci no meio musical, na minha família ninguém toca e ninguém canta, então tenho desvantagens em relação aos outros cabo-verdianos. Eu simplesmente comecei a cantar, sem mais nem porque. Mas se quiseres [ser bem sucedido] tens de correr atrás, tens de persistir até que um dia, quem sabe, as coisas hão-de acontecer.

DW África: O seu primeiro álbum é o reflexo, digamos, da sua conturbada infância? A Élida é jovem, tem 24 anos, tem um filho, cuidou dos seus irmãos, portanto, muita responsabilidade muito cedo...

01.06.17. ONLINE LONGA Entrev. Élida Almeida I - MP3-Mono

EA: É um retrato, mas eu não chamaria de uma conturbada infância. Como todo o cabo-verdiano, temos uma vida difícil, Cabo Verde não tem nada. Como todo os cabo-verdianos temos de trabalhar mais se quisermos nos diferenciar dos outros. É um retrato da minha vida, costumo dizer que é um disco autobiográfico, que as pessoas ao ouvirem já sabem que é a Élida Almeida, porque fala da minha vida e de tudo ao meu redor. Tenho músicas que falam dos conselhos que a minha mãe me dava para não me meter com homem casado, tem outra que conta como anunciei a minha mãe que estava grávida, outra que fala do primeiro amor do meu irmão e de como tive de lidar com a situação, visto que eu é que tomava conta dele. Então este trabalho é um resumo da minha vida.

DW África: Também sabemos que a Élida já fez rádio. Foi lá parar por causa da música?

EA: Sim, acho que uma coisa levou a outra. Foi na altura em que estava grávida, tive de parar com os estudos. Sempre gostei de rádio, fui criada a ouvir rádio. Onde nasci e cresci até hoje não há eletricidade, então a nossa única diversão era ouvir rádio a pilhas. Por isso sempre me identifiquei muito com a rádio e achei uma oportunidade bem fixe e aprendi muita coisa, estilos diferentes de música. E isso serviu para me aproximar ainda mais da música.

DW África: É a "menina" do momento no que se refere a música de Cabo Verde. Como está a lidar com este novo mundo?

Élida Almeida Sänger aus Cap Verde
Foto: N. Issufo

EA: Digo que esta nova geração está muito bem representada, a cada dia que passa oiço novas vozes, novos estilos e faço novas descobertas em Cabo Verde. Lido muito bem com esta situação de passar de uma dia para o outro de uma desconhecida para [conhecida]. Onde quer que eu vá as pessoas param-me na rua para tirar fotos, dar conselhos. Tenho muitos fans por aí, as pessoas  dizem "olha, acho que devias fazer isto e aquilo", "acho que não devias fazer isso...", e eu oiço tudo com a maior calma porque as pessoas acabam por fazer parte da minha vida e acabam por ter uma certa influência, o que pensam acabam por ter uma certa importância. Então, eu gosto muito de conversar com as pessoas e de tirar fotos. Quando passo muito tempo fora de Cabo Verde, e tenho a noção de que ainda ninguém me conhece fora de Cabo Verde, estou ainda a procura de um espaço, sinto falta disso. Uma pessoa acaba por se acostumar.

DW África: E como é conciliar a vida artística com a sua vida familiar?

EA: Eu preciso sair, viajar para conseguir o que quero, levar a música de Cabo Verde o mais longe possível. É claro que sinto muita falta da minha família, do meu filho, da minha casa, das minhas coisas, mas tem de ser. Então, é melhor admitir logo a primeira que tem de ser, que tem de haver essa lacuna, essa ausência e essa falta e tentar compensar. Tento sempre compensar nos momentos em que estou em casa com o meu filho, irmãos, mãe e tudo o resto.

DW África: A Élida é jovem, mas já bem sucedida na sua carreira. Isso é um peso para tão pouca idade, ou a sua experiência de vida tornou a sua pouca idade em nada?

Élida Almeida Sänger aus Cap Verde
Foto: N. Issufo

EA: As pessoas costumam dizer que a minha alma é mais velha do que o meu corpo. A vida encarregou-se de me preparar muito bem para a vida! Então, acho que sou precocemente madura, mas não é fácil e tenho essa noção de que tudo isto é mais responsabilidade. Então, isso desafia-me mais, faz com que trabalhe mais, todos os dias aprendo a falar línguas para me comunicar com a pessoas, o que não sabia antes, a aprender a estar no palco, todos os dias a pesquisar, a aprender e aprender. Isso é um certo tipo de pressão que traz coisas boas. Esforço-me sempre para corresponder as expetativas das pessoas.

DW África: Está a preparar o seu próximo trabalho. Quais são as novidades?

EA: Continuo na mesma linha, continuo a ter o meu povo como minha inspiração e tudo o que acontece ao meu redor. E este trabalho é um resumo de tudo o que tem sido essa minha descoberta pelo mundo nesses dois anos. Viajei muito, muito, muito, pelos quatro cantos do mundo e isso vem-se refletindo fortemente nas minhas composições. Então, há ainda um pouco mais de fusões no meu trabalho, entre a música de Cabo Verde, pegando fortemente na tradição, mas com influências de coisas de fora.

DW África: Em termos de intercâmbio ao nível interno, qual é a experiência da Élida?

EA: Relaciono-me muito bem com todos os artistas de Cabo Verde. Gosto mesmo de aprender com os mais velhos, de ensinar alguma coisa aos mais novos, mesmo sendo criança, porque eu também sou uma bebé... Mas já tenho um dueto com a Lura, numa trabalho dela, num tema que é da minha autoria. Também tenho um trabalho com a Ceuzany e dentro de poucos dias vou lançar um dueto com um artista muito popular de Cabo Verde. Tem sido uma boa relação e tenho aproveitado o máximo que posso a aprender e também a dar alguma coisa.

DW África: E em relação aos PALOP, pensa nalguma parceria com alguns músicos?

EA: Eu oiço muita música dos PALOP. Gosto muito dos Tabanka Djaz, da Eneida Marta, da Guiné-Bissau, do Matias Damásio, de Angola, dos Calema de São tomé. Faço questão de consumir tudo o que é dos PALOP, porque sei que me ajuda e têm muita qualidade. E se um dia surgir uma parceria vai ser um privilégio porque são pessoas que admiro muito. 

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África