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A casa amaldiçoada de Braunau am Inn

Volker Wagener
18 de outubro de 2016

Um prédio de mais de 500 anos assombra uma pequena cidade da Áustria: nele nasceu Adolf Hitler. Agora, o governo austríaco confirma a demolição e a construção de um novo edifício – tudo para tentar pôr um fim à maldição.

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Geburtshaus Adolf Hitler Braunau Österreich
Foto: dapd

Ah, se o "Führer" soubesse... A frase irônica, dita por aqueles que não eram exatamente fieis seguidores do líder nazista, voltou a ser usada na Áustria depois do anúncio de que a casa natal de Adolf Hitler, em Braunau am Inn, será demolida, e um novo edifício será construído em seu lugar.

A medida foi confirmada pelo ministro do Interior do país, Wolfgang Sobotka, ao jornal austríaco Die Presse. Segundo ele, ela foi recomendada por uma comissão de especialistas. A nova construção deverá abrigar uma organização social ou autoridades locais. "Ela não lembrará a construção original", disse um porta-voz do Ministério do Interior. Com isso, um debate de anos encontra o seu fim.

Local contaminado pelo nazismo

A casa de cerca de 600 metros quadrados é algo como um lugar contaminado pelo nazismo e uma eterna dor de cabeça para a comunidade local. Os fatos: nela nasceu Adolf Hitler, em 20 de abril de 1889, filho da empregada doméstica Klara Pölzl. Ele morou apenas alguns meses na casa de três andares e com janelas gradeadas no piso térreo – ao que parece, porém, o suficiente para amaldiçoar para sempre o imóvel e também a cidade.

Pois os cerca de 17 mil habitantes de Braunau am Inn simplesmente não conseguem se livrar da maldição de ser o local de nascimento de Hitler. Outras cidades têm um passado nazista bem mais pesado, como Nurembergue, onde eram celebrados os grandes encontros do partido nazista. Mas, hoje em dia, quando alguém pensa em Nurembergue, pensa logo no seu famoso mercado de Natal e no tradicional pão de mel. No caso de Braunau am Inn, todos pensam em Hitler.

Em meados de julho, o governo austríaco votou a favor de um projeto de lei que converteria a casa em propriedade do Estado. De forma concreta: a proprietária receberá uma compensação financeira pela desapropriação. A medida tem como justificativa proteger Braunau am Inn das peregrinações de simpatizantes da cena de direita.

Adolf Hitler Hitler als Kind
Adolf Hitler em 1890. Ele gostava de se referir a Linz, Viena e Munique e ignorar sua cidade natalFoto: picture-alliance/dpa

Atualmente, o Estado aluga o imóvel, e isso desde o início dos anos 70. O aluguel é de quase 5 mil euros por mês. Até 2011, o edifício era utilizado por uma oficina para pessoas com deficiências. Mas desde então, a casa está vazia. No contrato de locação está expressamente escrito que o edifício não pode ser utilizado em seu "contexto histórico", ou seja, também não como memorial às vítimas do nazismo.

A proprietária da casa tem desempenhado há anos um papel dubioso. Originalmente, ela queria vender o imóvel, mas mudou de ideia depois que surgiram potenciais compradores de motivações politicamente questionáveis. Ela também rejeitou as reformas necessárias, assim como alterações no prédio. Além disso, nunca existiu um consenso sobre como o imóvel deveria ser utilizado no futuro. As ideias iam desde a demolição até a construção de um memorial. Até o Ministério do Interior formar uma comissão especial para finalmente decidir o futuro desse complicado endereço.

A casa amaldiçoada

O culto nazista em torno da casa de nascimento de Hitler é antigo. Já em 1938, imediatamente após a anexação da Áustria ao "Terceiro Reich", Martin Bormann adquiriu o imóvel para o partido nazista. Bormann, braço direito de Hitler no partido NSDAP, fez uso de ameaças de expropriação e pagou 150 mil marcos reais (Reichsmark) pela casa de cerca de 500 anos de idade.

A propriedade foi então declarada patrimônio histórico e deveria ter sido transformada em centro cultural, mas Hitler não tinha interesse em testemunhos de seus primeiros anos. Ele retirou sistematicamente de circulação todas as evidências de suas origens humildes. Em vez disso, resplandecem até hoje as iniciais MB, de Martin Bormann, no portão de ferro da casa.

Nos últimos dias da Segunda Guerra, soldados americanos impediram a demolição da casa por um grupo da infantaria alemã. Desde então, o endereço volta e meia é ponto de encontro de extremistas de direita e um incômodo constante para a cidade e o Estado austríaco.

Geburtshaus Adolf Hitler in Braunau
Imagem de data incerta mostra que a casa natal de Hitler chegou a ser usada como bibliotecaFoto: picture-alliance/dpa

Retorno à normalidade?

Há tempos os moradores de Braunau am Inn têm reagido com irritação também aos turistas insuspeitos de qualquer ideologia política radical. Em média, cerca de 50 estranhos passam diante da casa todos os dia – alguns deles apenas lançam olhares furtivos em direção à "casa do mal". Outros tiram selfies e depois somem rapidamente. Há ainda os que raspam partes da fachada como uma espécie de souvenir.

A casa causa constrangimento não só para os moradores, mas também para muitos turistas, que inventam desculpas para perguntar pelo endereço. Os moradores de Braunau am Inn já estão acostumados a ouvir alguém se passar por professor de história somente para dar um ar de legitimidade profissional a sua curiosidade.

Se no local da casa haverá uma estação de bombeiros, um centro comunitário, uma escola ou qualquer outra instituição ainda está completamente indefinido. A única coisa certa no momento é a vontade de tirar a aura de maldade do prédio e fazer com que a normalidade retorne ao local. Se isso de fato vai acontecer, é questionável, pois a imprensa de todo o mundo vai continuar acompanhando o destino do endereço onde Hitler nasceu, para desespero dos moradores de Braunau am Inn.