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Arte

Andrzej Wajda, artista e homem político polonês

10 de outubro de 2016

Diretor criou clássicos da "escola polonesa" desde seus primeiros filmes e seguiu fazendo cinema até os 90 anos. Honrado e premiado, Wajda era visto não só como um grande artista, mas também como uma autoridade moral.

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Andrzej Wajda (1926-2016)
Andrzej Wajda (1926-2016)Foto: picture-alliance/AP Photo/A. Keplicz

O diretor polonês Andrzej Wajda fez cinema até o fim. Apesar de ele já contar 90 anos, a notícia de sua morte, na noite deste domingo (09/10), surpreendeu muitos poloneses. Ainda menos de três semanas atrás, ele fora festejado com aplauso estrondoso no Festival de Cinema Polonês de Gdynia, no norte do país.

Lá, apresentara sua obra mais recente, Powidoki (título internacional: Afterimage – "pós-imagem"). Na época, não havia indícios de que também seria sua última, pois Wajda claramente não pensava em parar. "Quem tem 90 anos é uma pessoa realmente muito idosa. Por isso eu me apresso, e já estou pensando no próximo filme", comentou o mestre, que se apoiava numa bengala para andar.

Películas como Terra prometida (1975), O homem de mármore (1977) ou Danton – O processo da Revolução (1983) lhe valeram fama internacional. Após receber prêmios como a Palma de Ouro do Festival de Cannes e o Urso de Ouro da Berlinale, em 2000 ele foi contemplado com o Oscar pelo conjunto de sua obra.

Gérard Depardieu em "Danton" (1983)
Gérard Depardieu em "Danton" (1983)Foto: Imago

Ingerência estatal na arte: tema atual na Polônia

Andrzej Wajda poderá vir a ser postumamente premiado com a cobiçada estatueta dourada da Academia de Hollywood por Powidoki, já que a biografia filmada do artista de vanguarda Wladyslaw Strzeminski (1893-1952), que se opôs à censura do regime comunista, é a candidata da Polônia ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

"Fiz um filme mostrando que a intervenção na arte não é tarefa do governo", comentou o diretor. O tema é altamente atual em sua terra natal: desde que o governo conservador do partido Lei e Justiça (PiS) tomou posse, no fim de 2015, muitos artistas têm denunciado a ingerência estatal no setor da cultura.

"Katyn" (2007) examina um capítulo da ocupação soviética e da biografia de Wajda
"Katyn" (2007) examina um capítulo da ocupação soviética e da biografia de WajdaFoto: picture-alliance/dpa/Pandastorm Pictures

Ele se engajou até o fim pela liberdade artística: juntamente com outros cineastas, acusou a emissora de direito público TVP de censura por exibir em versão comentada o ganhador do Oscar Ida (2013), de Pawel Pawlikowski, que enfoca uma freira de origem judia em busca da própria identidade.

Elaboração do passado nacional

Nascido em 6 de março de 1926 na cidade de Suwalki, no nordeste, ele estudou belas-artes em Cracóvia e, em seguida, na Escola de Cinema de Lodz. Já suas primeiras produções – Geração (1955), Kanal (1957) e Cinzas e diamantes (1958) – contam entre os clássicos da "escola polonesa".

Nelas o diretor – e em parte também roteirista –, que participara da resistência contra a ocupação nazista alemã, aborda aspectos da Segunda Guerra Mundial e da tomada do poder na Polônia pelos comunistas, após 1945.

A dramática história polonesa esteve constantemente presente na produção cinematográfica de Wajda. Enquanto O homem de mármore era uma crítica impiedosa ao sistema stalinista, O homem de ferro (1981) tematizava a luta dos sindicatos livres no Mar Báltico. Ambos compõem a "trilogia de Danzig", juntamente com a biografia Walesa (2013), sobre o sindicalista e "homem de esperança".

"Walesa" completa em 2013 a "trilogia de Danzig", iniciada em 1977
"Walesa" completa em 2013 a "trilogia de Danzig", iniciada em 1977Foto: picture-alliance/dpa/A. Warzawa

Com Katyn (2007), Wajda ergueu um memorial cinematográfico aos milhares de oficiais poloneses fuzilados em massa pelo serviço secreto soviético em 1940. Tratava-se, também, da elaboração de um trauma pessoal: entre as vítimas do massacre encontrava-se o pai de Andrzej Wajda, um oficial de cavalaria.

Voz de uma nação silenciada

Por seu envolvimento nos debates públicos, Wajda era visto, na Polônia, não só como um grande artista, tanto do cinema como do teatro, mas também como uma autoridade moral. Sem seus filmes, não teria sido possível a fundação do movimento de libertação Solidariedade, em 1980. O cineasta casado quatro vezes e pai de um filha também fez uma breve incursão pela política, elegendo-se senador pelo Solidariedade entre 1989 e 1991.

Alguns críticos acusavam Wajda de, até o fim do regime comunista, em 1989, fazer concessões excessivas ao partido dominante. "Eu era a voz da nação que não podia falar livremente", foi sua réplica.

O ex-presidente Lech Walesa o definiu, nesta segunda-feira, como "uma grande personalidade, um grande polonês, um grande patriota e grande diretor", sempre dizendo frases de "grande sabedoria". "Nós vamos nos rever em breve, eu já fiz as minhas malas", prometeu o respeitado sindicalista.

A Universidade de Cracóvia o declarou um dos maiores diretores da história do cinema e pai fundador da cinematografia polonesa. "A morte de Wajda é uma gigantesca perda para a cultura da Polônia", lamentou o Instituto de Arte Cinematográfica nacional em seu website. O cinema nacional vai pranteá-lo por longo tempo, anunciavam as manchetes.

Certo é que, através de uma obra que reúne cerca de 50 películas, o cineasta polonês tem lugar assegurado na memória de seu país e muito mais além.

AV/kna/afp/dpa