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Após revés no STF, Cunha obtém vitórias

Jean-Philip Struck10 de dezembro de 2015

Deputado faz manobra para substituir líder do PMDB na Casa e consegue fazer com que seu processo de cassação no Conselho de Ética volte à estaca zero.

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Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados

Apesar das especulações de que seu poder vem mostrando sinais de desgaste, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ainda continua a exibir a capacidade em manobrar o jogo político a seu favor. Nesta quarta-feira (09/12), em um espaço de poucas horas, Cunha conseguiu tanto derrubar o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani – um aliado do Planalto –, como articular a troca do relator do seu processo de cassação no Conselho de Ética, o que levou a ação praticamente de volta à estaca zero.

As novas vitórias ocorreram um dia após o revés sofrido pelo deputado e pela oposição no Supremo Tribunal Federal (STF), que mandou suspender o rito de impeachment estabelecido por Cunha até que a questão seja analisada pelos ministros no dia 16 de dezembro. Logo no início do dia, Cunha, ao comentar a decisão do STF, disse que esta quinta-feira seria "um dia normal". Poucas horas depois, ele iniciou nova ofensiva para dificultar a vida do Planalto e para manter o seu mandato.

O primeiro afetado foi Picciani, o líder do PMDB na Câmara, um membro da ala fluminense do partido, simpática ao governo, que vinha manobrando para indicar deputados da sigla favoráveis a Dilma Rousseff na composição da comissão que vai analisar o impeachment da presidente.

Cunha, que enxergava em Picciani um rival pelo controle da Câmara, já vinha trabalhando para neutralizar o deputado desde o fim de semana. Na terça-feira, o líder do PMDB fracassou em assegurar a indicação de aliados do Planalto e viu uma chapa concorrente mais hostil ao Planalto articulada por Cunha e pela oposição ganhar a votação.

Após a vitória – e o subsequente revés no STF –, Cunha, com a ajuda de outros peemedebistas, entre eles o vice-presidente, Michel Temer, renovou sua ofensiva e assegurou que 35 dos 66 deputados do PMDB na Câmara votassem pela destituição do líder. Outras intrigas internas e antigos acordos no PMDB sobre a liderança também pesaram para a adesão dos deputados. No final, o escolhido para o lugar de Picciani foi o deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), um velho aliado de Cunha que atua como relator do novo Código de Mineração – mesmo tendo recebido 1,4 milhão de reais em doações de empresas do setor em 2014.

Cassação

Horas depois, aliados de Cunha conseguiram mais uma vez manobrar para adiar a decisão do Conselho de Ética sobre o eventual prosseguimento do pedido de cassação do mandato do deputado. De quebra, a Mesa Diretora do conselho, que é controlada por Cunha, conseguiu forçar o afastamento do relator do processo, o deputado Fausto Pinato (PRB-SP), que já havia se mostrado favorável ao prosseguimento da ação.

A decisão foi assinada pelo 1º vice-presidente da Mesa, Waldir Maranhão (PP-MA), que, assim como Cunha, também é investigado pela Operação Lava Jato. O Conselho de Ética vem discutindo há mais de um mês o que fazer com Cunha, mas a votação tem sido adiada seguidas vezes graças a uma série de manobras dos aliados do deputado.

O afastamento de Pinato ocorreu por meio de um recurso apresentado pelo deputado Manoel Junior (PMDB-PB), outro aliado de Cunha, que questionou o fato de o partido de Pinato já ter participado do mesmo bloco do PMDB na Câmara. As regras da Casa proíbem que um deputado julgue um colega do mesmo bloco.

Os dois partidos já não fazem mais parte do mesmo bloco, mas a composição dos membros do Conselho ainda segue as antigas indicações da época em que os dois partidos estavam juntos. O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PSD-BA), já havia rejeitado esse argumento, mas os aliados de Cunha recorreram à Mesa Diretora e desta vez foram bem-sucedidos.

Araújo reagiu à manobra de Cunha. "Nós não somos meninos de escola, nós somos deputados. Acho que isso é golpe", disse.

Inicialmente, Araújo afirmou que iria indicar um deputado do PT, partido hostil a Cunha, para a relatoria, mas depois voltou atrás. No final, o escolhido foi o deputado Marcos Rogério (PDT-RO), que assim como Cunha é um integrante da bancada evangélica da Câmara e assinou com o presidente a redação do controverso Projeto de Lei 5069/2013, que exige exame de corpo de delito por parte de vítimas de estupro que desejam realizar um aborto legal.

O deputado afirmou no passado ser favorável ao prosseguimento dos trabalhos de investigação contra Cunha, mas também já votou ao lado de aliados do presidente da Câmara pelo adiamento da votação do parecer de Pinato. "Eu não tenho lado nessa história, não tenho posição de pré-julgamento. Não parto de uma premissa de que quem vai para o Conselho tem que ser condenado ou absolvido", disse o deputado após a sua escolha como novo relator.

Ao comentar com a imprensa seu afastamento, o deputado Pinato lamentou a decisão e afirmou que no período em que foi responsável pela relatoria sofreu uma série de pressões e ameaças

"Sofri ameaças, sofri pressão. Contratei segurança. Tenho policial militar dormindo na minha casa. Um amigo emprestou carro blindado. Tem reservado da Polícia Militar na minha casa. Registrei boletim de ocorrência e protocolei pedido para que o Ministério da Justiça apoiasse as investigações. (...) Só Deus e minha família sabem o que vim passando todo esse tempo (...) Protocolei [o relatório] de medo, porque sofri ameaças, sofri pressão", disse.

Com o novo adiamento e a troca do relator, Cunha conseguiu adiar por semanas qualquer nova decisão do Conselho sobre seu futuro, caso o STF também não intervenha no processo todo. O PSOL, Rede e PRB já anunciaram que deverão ingressar com ações no tribunal para tentar devolver a relatoria do caso para Pinato.