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Ativistas da ex-RDA recebem Prêmio Nacional

Wiebke Schönherr (ca)24 de junho de 2014

Passados 25 anos da queda do Muro de Berlim, líderes dos "protestos de segunda-feira" recebem Prêmio Nacional da Alemanha. Homenagem se dirige a movimento que se iniciou com orações pela paz e acabou mudando o mundo.

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Homenageados Jochen Lässig, Katharina Köhler (por seu pai, Christian Führer), Christoph Wonneberger e Uwe SchwabeFoto: picture-alliance/dpa

Era o ano de 1981. Na Igreja de São Nicolau de Leipzig, fiéis ligados à Igreja Luterana se reuniam, nas noites de segunda-feira, para um culto religioso que denominavam "orações pela paz". "Para nós, naquela época, tratava-se da paz, do meio ambiente e do Terceiro Mundo", explica o alemão Uwe Schwabe, natural de Leipzig, que participou do movimento desde o início.

Como ativista dos direitos humanos, Schwabe recebeu, nesta terça-feira (24/06), o Deutscher Nationalpreis (Prêmio Nacional Alemão), junto aos pastores Christian Führer (Igreja de São Nicolau) e Christoph Wonnenberger (Igreja de São Lucas) e ao Arquivo do Movimento Civil de Leipzig – como representantes dos participantes dos "protestos de segunda-feira".

O prêmio é uma homenagem a cidadãos "cuja coragem revolucionária e renúncia à violência levaram à queda do regime da República Democrática Alemã (RDA)", considerou a fundação Deutsche Nationalstiftung.

Ao longo dos anos, as orações pela paz se tornaram mais políticas. Os organizadores passaram a empreender, com mais frequência, ações também fora das igrejas, com o principal fim de atrair atenção para a destruição ambiental. E havia cada vez mais gente disposta a participar, pois nas orações pela paz se podia falar de política em ambiente protegido.

Montagsdemonstrationen Leipzig 1989
Protestos de segunda-feira pedem "Liberdade" para cidadãos da RDAFoto: picture alliance/Lehtikuva Oy

O Leste a partir nas telas ocidentais

Finalmente, em 1989, a necessidade de mudanças era forte entre a população da RDA, sob regime comunista. Muitos fugiram para o Ocidente através da ex-Tchecoslováquia e Hungria. No entanto, outros cidadãos fizeram a escolha consciente de permanecer na Alemanha Oriental, como Uwe Schwabe: "Eu não queria deixar o terreno livre para a ditadura comunista", afirma o ativista.

Em 4 de setembro de 1989, centenas de milhares foram às ruas, pela primeira vez, para rezar pela paz. Foi a partir daí que as manifestações passaram a se chamar "protestos da segunda-feira". Tratava-se de um dia especial: em Leipzig realizava-se a feira comercial de primavera, com presença de jornalistas ocidentais.

Conscientes de que a mídia do outro lado do Muro estava ávida por ações de oposicionistas alemães orientais, um grupo de oposicionistas se reuniu diante da Igreja de São Nicolau, pela primeira vez carregando cartazes, onde se lia: "Por um país livre com cidadãos livres".

Preisverleihung Deutscher Nationalpreis 2014 in Berlin
Richard Schröder, presidente da Fundação Nacional da Alemanha, discursa na entrega do prêmio em BerlimFoto: picture-alliance/dpa

Na mesma noite, os meios de comunicação do Ocidente mostraram as manifestações nos noticiários. Eles foram assistidos também pelos alemães orientais, que captavam clandestinamente a TV ocidental. Assim, eles ficaram sabendo o que estava acontecendo em seu próprio país, e isso fortaleceu os protestos.

A Stasi (polícia política da ex-Alemanha Oriental) e a polícia tentaram repetidamente expulsar os manifestantes, agredindo-os e prendendo-os. Mas os cidadãos de Leipzig não se deixaram intimidar, e os protestos se espalharam por outras cidades da RDA.

"Nós somos o povo!"

Um mês depois, 9 de outubro, foi o dia da decisão, quando ficou definido que os acontecimentos de 1989 entrariam para a história como uma revolução pacífica, não sangrenta – embora assim não parecesse, a princípio.

"Havia um medo assombroso naquele dia", lembra Uwe Schwabe. A cidade de Leipzig foi completamente isolada. Milhares de policiais se colocaram em posição. A tarefa deles era "suprimir a contrarrevolução" – no jargão do partido único SED.

Espalharam-se boatos de que se havia aumentado tanto o número de camas nas prisões do país, quanto os estoques de sangue nos hospitais, para tratar os eventuais feridos. Tudo indicava que o governo se preparava para um dia sangrento. Eram esperados 20 mil manifestantes. Um grupo de oposicionistas leu um apelo a não violência.

Mas as ruas de Leipzig foram tomadas por 70 mil manifestantes: era demais para a polícia, que se retirou. "Devido ao grande número de participantes, as manifestações permaneceram pacíficas", deduz Schwabe, em retrospecto. "A polícia sabia: se entrasse em cena, haveria um grande derramamento de sangue. Ninguém queria assumir essa responsabilidade."

Um "crescendo" de entusiasmo e coragem

A situação prosseguiu pacífica e os protestos continuaram. Uma semana depois já eram 120 mil pessoas nas manifestações em Leipzig. Passadas duas outras semanas, seu número chegava a 300 mil. Por todas as partes da RDA exigiam-se liberdade de imprensa, eleições livres, liberdade de circulação: "Nós somos o povo!", eram os brados repetidos. Não se exigia a abertura do Muro ou o fim da RDA – ninguém podia imaginar que isso viria a acontecer: o que se reivindicava eram reformas no próprio país.

E as manifestações prosseguiram. Em 5 de novembro, meio milhão foram às ruas em Leipzig – número equivalente à população da cidade, na época. Em outras cidades eram outras centenas de milhares. A população ficou ainda mais furiosa com a nova legislação de viagem, que não concedia liberdade de circulação aos cidadãos da RDA. Sob a autoimposição de permanecerem pacíficos, nesse mesmo dia eles marcharam até o edifício da Stasi.

Leipziger Kirche St. Nikolai
Onde tudo começou: Igreja de São Nicolau de Leipzig ganhou fama mundialFoto: picture-alliance/dpa

Quatro dias mais tarde veio a lei de viagem reivindicada. O então funcionário do SED Günther Schabowski anunciou, numa lendária coletiva de imprensa, liberdade de circulação imediata para todos os cidadãos da República Democrática Alemã.

Naquela mesma noite, os habitantes do país avançaram sobre os postos de fronteira, e o Muro de Berlim caiu em 9 de novembro de 1989. Os protestos da segunda-feira perduraram até 1990, quando se se realizaram as primeiras eleições livres em solo alemão oriental.