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Baviera inaugura centros para acelerar deportações

Esther Felden rk
1 de agosto de 2018

Estado alemão abre primeiros "centros-âncora" para apressar processamento de solicitantes de refúgio na fronteira. Iniciativa é criticada, entre outros pontos, pela aparência de prisão.

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Refugiados esperam diante de cerca em centro de transição na Baviera, que poderá se tornar "centro-âncora"
Refugiados em centro de transição na Baviera, que poderá se tornar "centro-âncora" Foto: picture-alliance/dpa/S. Puchner

Após a polêmica sobre a política de concessão de refúgio que quase derrubou o atual governo federal, o estado da Baviera, no sul da Alemanha, inaugurou nesta quarta-feira (01/08) os primeiros "centros-âncora"do país. As controversas instalações vão abrigar refugiados enquanto esperam uma decisão oficial sobre seu destino.

A iniciativa faz parte do plano do ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, crítico da política migratória da chanceler Angela Merkel e que quer reduzir o número de requerentes de refúgio no país acelerando o processo tanto de acolhimento quanto de deportação.

A ideia é dar mais velocidade à tramitação dos processos sob o mesmo teto: chegada, solicitação de refúgio, decisão se o imigrante pode ficar ou não. Cada um dos chamados "centros-âncora" deverá ter capacidade para abrigar 1.500 refugiados.

Se a decisão sobre a concessão do refúgio for positiva, o respectivo solicitante deverá ser encaminhado a um município. Mas, se o requerimento for rejeitado, a deportação deverá acontecer diretamente a partir do centro.

Em cada uma das sete localidades na Baviera que terão os centros para refugiados, na fronteira com a Áustria, também haverá escritórios do Departamento de Estrangeiros estadual, do Departamento Federal para Migração e Refugiados (Bamf), da Agência Federal de Emprego da Alemanha e dos tribunais administrativos.

A abertura desses centros na Baviera é o pontapé inicial de um período de testes. A fase-piloto dos "centros-âncora" (Ankerzentren) durará seis meses. Em seguida, planeja-se avaliar o funcionamento das instalações.

Apenas depois desses exames, o governo federal poderá criar uma base legal para implementar os centros – e, para isso, precisará do apoio dos diferentes governos estaduais. Poucos destes, porém, são a favor do plano. Além da Saxônia (leste) – onde um desses centros deverá ser estabelecido em Dresden – apenas o estado de Hessen (centro-oeste) e da Renânia do Norte-Vestfália (oeste) demonstraram interesse no modelo.

Um objetivo declarado dos chamados "centros-âncora" é acelerar decisões sobre solicitações de refugiados. Mas Werner Schiffauer tem dúvidas sobre se isso realmente vai funcionar na prática. Ele preside o Conselho de Migração, uma rede nacional formada por cerca de 150 pesquisadores especializados em questões de migração e integração.

Segundo Schiffauer, de certa maneira faz sentido reunir todas as autoridades envolvidas no processo, garantindo assim uma maior cooperação entre elas. Mas ele não acha que, a partir de agora, haverá celeridade. 

"Em casos óbvios, primeiramente os casos dos sírios que vêm diretamente das zonas de guerra, com certeza os processos serão acelerados. Mas o que quase não vai mudar são os casos difíceis, a exemplo de refugiados afegãos que, em parte, já estão fugindo pela segunda vez", explica.

Schiffauer acredita que, futuramente, essas solicitações levarão tanto tempo para ser tratadas como agora, "como mostram os exemplos das cidades de Manching e Bamberg". Nos dois centros de acolhimento bávaros, há bem mais do que mil pessoas – elas esperam sem exercer uma atividade e não têm perspectivas de futuro, além de viverem amplamente isoladas do mundo exterior.

E é exatamente essa situação que organizações pró-refugiados criticam, chamando os centros de "campos de deportação" e alertando contra a formação de guetos de comunidades de imigrantes. "'Centros-âncora' impedem crianças de crescerem de forma apropriada. Causam tensões e agressões", afirma ainda Susanna Krueger, da ONG Save the Children.

O encarregado de combate ao abuso sexual do governo alemão, Johannes-Wilhelm Rörig, também alertou nesta quarta-feira contra o acolhimento de crianças nestes centros, onde os direitos delas – previstos na Convenção de Direitos das Crianças da ONU e com cuja concretização a Alemanha se comprometeu – não estariam garantidos.

Rörig exigiu uma legislação nacional para garantir padrões de proteção contra violência sexual em centros de acolhimento de refugiados. Segundo ele, o ministério alemão da Família teria apresentado "padrões mínimos para a proteção de pessoas refugiadas em abrigos", numa versão revisada com o Unicef em junho do ano passado. Esses padrões deveriam servir como diretrizes para a proteção contra a violência em centros de acolhimento de refugiados, adicionou o encarregado.

Centro de transição para refugiados na Baviera, que poderá ser "centro-âncora" no futuro
Foto: picture-alliance/dpa/S. Puchner

Até 18 meses em abrigo 

"Dez por cento dos habitantes do centro de Manching já estão ali há mais de 18 meses", critica o Conselho de Migração da Baviera num comunicado à imprensa. O texto diz que, nesses grandes abrigos, as pessoas sofrem com "interdição de trabalhar, situação análoga a um depósito de pessoas, privação de dinheiro vivo, falta de cursos de alemão e aulas deficientes".

Oficialmente, Horst Seehofer declarou que ninguém deverá ficar mais de um ano e meio num "centro-âncora". "O tempo máximo de permanência é regulamentado: para famílias, são seis meses, para todos os outros, são 18 meses", disse o ministro do Interior num discurso proferido diante do Parlamento alemão em maio deste ano.

Mas não são apenas as organizações de auxílio que acreditam que esse intervalo de tempo é longo demais. A crítica ao conceito geral dos "centros-âncora" também vêm do Departamento do Trabalho, Integração e Assuntos Sociais do de Berlim. Obviamente, as leis serão respeitadas no estabelecimento dos centros, afirma a porta-voz do órgão, Regina Kreiding. "Mas, politicamente, encaramos como contraprodutivo e desfavorável para a integração quando se abriga tantas pessoas por um período prolongado em locais tão grandes", apontou, em entrevista à DW.

O pesquisador de movimentos migratórios Werner Schiffauer tem uma visão parecida. "Está claro que os 'centros-âncora' servem para dissuadir, estimular a desistência. Trata-se de enviar um sinal aos refugiados de que eles não são exatamente bem-vindos aqui", exemplifica.

Para Schiffauer, esta é uma medida que também pode funcionar, mas com prejuízo para a integração. Ele afirma que as condições difíceis de um "centro-âncora", a exemplo de uma obrigatoriedade controversa de residência (já que eles seriam obrigados a ficar no centro, mas não entrar e sair como querem), poderiam causar traumas adicionais aos refugiados.

Refugiados em centro de trânsito na Baviera
Refugiados em centro de trânsito na BavieraFoto: picture-alliance/dpa/S. Puchner

Aparência de prisão?

Schiffauer também alerta contra as consequências para toda a região na qual funcionará um "centro-âncora", visto como prisão tanto pelos moradores dos arredores quanto pelo público em geral. "Para uma cidade, é muito oneroso ter um 'centro-âncora'. Com ele, coloca-se um corpo estranho num local, que acaba envenenando o clima social e também vai criar iniciativas contrárias a ele", explica o presidente do Conselho de Migração.

Do outro lado, Schiffauer espera que os moradores tentem fugir do cotidiano do "centro-âncora", pelo menos parcialmente. "É de se esperar que especialmente jovens garotos queiram escapar da inospitalidade dessas instalações, protagonizando pequenas fugas para a cidade. Isso tem um alto grau de geração de conflito. Vai haver tensões com o entorno", prognostica o especialista, convencido de que o conceito dos "centros-âncora" tem um caráter simbólico político. "Serve para enviar um sinal à maioria da população: 'estamos fazendo algo, vamos conseguir controlar tudo isso'", acredita.

Mas essa esperança é um equívoco, diz Schiffauer. "Estão prometendo ordem. Mas, factualmente, estão criando mais desordem", afirma, acrescentando que essa política empurra mais pessoas para a ilegalidade.

O pesquisador cita o exemplo das experiências na Suíça, onde já existem instalações do tipo – mas também desilusões. "A metade daqueles que deveriam ter sido deportados simplesmente mergulhou na clandestinidade e agora vive ilegalmente na Suíça ou em um dos países vizinhos", constata. Segundo o Conselho de Migração bávaro, em Manching e Bamberg, também já existe uma taxa de 30% de transição para a clandestinidade.

Com dpa/kna/dw

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