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Bolsonaro e aliados evocam "soberania" para rebater Biden

30 de setembro de 2020

Presidente, Ricardo Salles e Eduardo Bolsonaro repetem mesmo discurso que já indispôs país com europeus para rebater candidato democrata, que ameaçou sancionar Brasil por desmatamento.

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Brasiliens Präsident Jair Bolsonaro und Brasiliens Umweltminister Ricardo Salles
Ricardo Salles e Jair Bolsonaro: ministro já mostrou desdém por outros mecanismos de ajuda internacional, como o Fundo AmazôniaFoto: Marcos Corrêa/Presidência da República do Brasil

A menção ao Brasil durante o debate presidencial dos Estados Unidos na noite de terça-feira (30/09) não foi bem digerida por Jair Bolsonaro nem por membros de seu círculo. "Lamentável, Sr. Joe Biden, sob todos os aspectos, lamentável", disse o presidente.

Durante o duelo entre Donald Trump e Joe Biden, o candidato democrata mencionou a destruição da Amazônia, e disse que, caso seja eleito, pretende organizar um pacote de ajuda de 20 bilhões de dólares (R$ 112 bilhões) para que o Brasil preserve a floresta.

No entanto, Biden advertiu que, se mesmo assim os brasileiros persistirem com o desmatamento, o país sul-americano poderá vir a sofrer "consequências econômicas significativas", sinalizando possíveis retaliações ou sanções.

No Twitter, Bolsonaro mencionou os 20 bilhões de dólares previstos por Biden, afirmando que o país não aceita suborno. "O que alguns ainda não entenderam é que o Brasil mudou. Hoje, seu presidente, diferentemente da esquerda, não mais aceita subornos, criminosas demarcações ou infundadas ameaças", escreveu. "Nossa soberania é inegociável", completou, com letras maiúsculas.

O presidente seguiu dizendo que seu governo realiza "ações sem precedentes para proteger a Amazônia" e declarou que a "cobiça de alguns países sobre a Amazônia é uma realidade".

"Custo entender, como chefe de Estado que reabriu plenamente a sua diplomacia com os Estados Unidos, depois de décadas de governos hostis, tão desastrosa e gratuita declaração. Lamentável,  Sr. Joe Biden, sob todos os aspectos, lamentável", concluiu.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, também se pronunciou. "Só uma pergunta: a ajuda dos US$ 20 bi do Biden, é por ano?", escreveu em seu perfil no Twitter.

Por sua vez, Filipe G. Martins, assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência e membro da ala ultrarradical "olavista" e "antiglobalista" do governo, afirmou pelo Twitter que "nenhum dinheiro pode comprar nossa liberdade e nossa soberania".

"Nosso compromisso com a preservação do meio ambiente, em benefício do Brasil e do mundo, é indissociável do cuidado com essas pessoas e jamais permitirá que elas sejam sacrificadas no altar do ambientalismo hipócrita dos que falam muito e não fazem absolutamente nada", escreveu em outra mensagem.

O primeiro tuíte de Martins provocou uma reposta do deputado Eduardo Bolsonaro, o filho "03" do presidente Jair Bolsonaro. O "ex-candidato" ao posto de embaixador do Brasil nos EUA afirmou que "narrativas fantasiosas são compradas não por quem acredita nelas, mas por quem acha que pode tirar proveito delas".

Eduardo, assim como seu pai, é um fã declarado do atual presidente americano. Em novembro de 2018, quando seu pai já havia sido eleito, ele chegou a se deixar fotografar usando um boné com o slogan "Trump 2020" durante uma visita aos EUA, para espanto de diplomatas brasileiros.

Já Ricardo Salles já exibiu no passado desprezo por mecanismos internacionais de ajuda financeira para a Amazônia. Em 2019, ele promoveu mudanças unilaterais na gestão do bilionário Fundo Amazônia, que conta com recursos da Alemanha e da Noruega. As medidas irritaram os dois países europeus, e a Noruega suspendeu novos aportes para o fundo. O impasse levou ao congelamento de novos projetos de preservação no âmbito do fundo. A Alemanha, por sua vez, também congelou o envio de uma verba de R$ 155 milhões para outros projetos de conservação ambiental no Brasil, diante do que Berlim encarou como uma falta de empenho do governo Bolsonaro para conter o desmatamento.

Em setembro de 2019, Salles chegou a viajar para Berlim para tentar convencer os alemães a liberarem novamente o dinheiro. Ele não ajudou muito sua causa ao dar declarações desastrosas para a imprensa alemã, como ao questionar o impacto da contribuição humana na mudança climática.

À época em que a Alemanha congelou esses R$ 155 milhões, o presidente Jair Bolsonaro reagiu com desprezo, sugerindo para que Merkel "pegasse essa grana" para "reflorestar a Alemanha" e afirmando que o Brasil "não precisa disso", referindo-se ao dinheiro. Bolsonaro também costuma reclamar com frequência da atuação de ONGs internacionais na Amazônia.

Em diversas ocasiões, no entanto, o governo Bolsonaro escancarou que não vê problemas na presença estrangeira na Amazônia se Trump estiver envolvido e se a cooperação for sinônimo de exploração econômica. Em abril de 2019, o brasileiro disse em entrevista que propôs a Trump a abertura da exploração da região amazônica em parceria com os Estados Unidos. "Quando estive agora com Trump, conversei com ele que quero abrir para ele explorar a região amazônica em parceria".

Não foi a única ocasião. Em janeiro do mesmo ano, durante o Fórum de Davos, na Suíça, Bolsonaro, que alinhou sua política internacional incondicionalmente ao governo Trump, afirmou ao ex-vice-presidente Al Gore que "adoraria explorar a riqueza Amazônia com os EUA", aparentemente sem saber que o americano é um ambientalista notório. Espantado com a resposta, o democrata disse não entender o que Bolsonaro quis dizer.