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'Longo caminho até ser levado a sério'

Martin Hoffmann (sm)14 de setembro de 2007

A Rússia divulgou em setembro que o teste da "bomba de vácuo" dera certo. Em entrevista com a DW-WORLD.DE, o especialista em armamentos Sascha Lange duvida da autenticidade dos vídeos divulgados e da existência da arma.

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Televisão russa revela imagens da detonação da 'bomba de vácuoFoto: AP GraphicsBank

DW-WORLD: Os russos divulgaram que fabricaram uma nova bomba de vácuo que representaria a mais potente arma convencional. Por que o senhor duvida dessa informação?

Sascha Lange: Duvido que as coisas hajam ocorrido como os russos afirmam, pois as imagens mostradas na televisão estatal não mostram exatamente o que se afirmara. Por exemplo, mostrou-se um Tupolev 160 Blackjack, um bombardeiro estratégico. Nas imagens, ele realmente abre o tampo, mas não se vê cair bomba nenhuma do avião. Simplesmente há um corte e depois se vê cair um corpo de outra aeronave. É possível reconhecer isso porque o compartimento é diferente e a bomba se solta de outro jeito do que ocorreria em um bombardeiro Blackjack.

Há outras discrepâncias?

Sim. Embora se veja uma arma em queda livre e a explosão, não há como reconhecer se a explosão realmente foi provocada por algo que acabou de cair. Poderia muito bem ser que essa grande explosão tivesse sido detonada no solo e não em decorrência da bomba lançada.

A explosão ocorre num terreno totalmente plano. Depois se mostram imagens de edifícios e veículos que teriam sido destruídos por essa bomba. Mas não dava para vê-los antes da explosão. Em diversos pontos, as imagens não se encaixam direito, e não confirmam as afirmações, de modo algum. Não se mostra um bombardeiro Blackjack lançando uma bomba. As imagens até sugerem algo condizente com as declarações da mídia russa, mas no fundo não mostram nada.

Com relação às fontes, o senhor se refere aos vídeos que passaram na televisão estatal russa?

Exatamente. Eles também passaram aqui nos nossos noticiários, sob a manchete "Rússia tem uma nova bomba". No entanto, a tecnologia de armas não é nada de fundamentalmente novo. O termo preciso seria "armas termobáricas". Os americanos já as utilizaram na Guerra do Vietnã e na última Guerra do Golfo. A idéia partiu dos alemães na Segunda Guerra. Agora, os russos simplesmente estão espalhando a notícia de que têm a maior bomba. Acho que por trás disso há, sobretudo, metas políticas internas, ou seja, levar a população russa a acreditar que Putin é o mais forte e que agora eles também têm a bomba mais potente.

O senhor é capaz de avaliar se a Rússia tem condições de construir uma bomba com o quádruplo de força explosiva da MOAB, a mais potente bomba convencional dos norte-americanos até agora?

Em princípio, sim. Os russos já construíram outras munições com essas ogivas, como – por exemplo – os mísseis de artilharia. Mas quanto à bomba que eles mostraram, não acredito que ela possa ter o quádruplo do potência da MOAB dos americanos. Isso não faz sentido.

Por razões ópticas?

Isso mesmo. A massa não é grande o suficiente. A MOAB é um explosivo de porte, com uma massa de dez toneladas, algo totalmente diferente. Esse lançamento mostrado pela televisão russa me remeteu mais às velhas armas termobáricas americanas, as chamadas Daisy Cutter.

A Rússia alegou ter desenvolvido essa arma para combater o terrorismo. Mas será que ela é adequada para tal?

Isso é tão improvável quanto o argumento de que os americanos querem caçar terroristas com armas nucleares. Para o combate ao terrorismo, essa arma é inadequada. Pelo contrário. Nos combates efetivos, seja no Afeganistão ou no Iraque, os militares estão passando a usar a menor munição possível. A tendência não é usar bombas grandes com a maior força explosiva possível, mas sim a munição mínima com raio de explosão restrito.

E para que serve, então, a arma que os russos chamam de "pai de todas as bombas"?

A função é sobretudo psicológica. Os americanos utilizaram este tipo de arma no Vietnã, a fim de abrir clareiras para os helicópteros nas florestas. No Iraque, elas serviam para bombardear campos minados. Já no Afeganistão, essas bombas raramente foram usadas, pelo que sei. Lá, assim como no Iraque, elas foram usadas mais para como guerra psicológica. Afinal, por mais que se trate de uma arma convencional, ela simplesmente provoca uma grande explosão. Mas, do ponto de vista militar, é uma arma usada bem raramente.

Ou seja, então a bomba foi detonada por razões de promoção política interna?

É isso que eu suponho.

Qual é a posição do Exército russo no ranking internacional?

Sascha Lange Stiftung Wissenschaft und Politik SWP
Sascha LangeFoto: presse

Não lá onde eles gostariam de estar. As Forças Armadas russas sofreram muito com o fim da Guerra Fria. Só aos poucos é que passaram a adquirir novos aviões e tanques. Mas com isso não conseguiram nem compensar o que se tornou obsoleto em seu arsenal. O nível de treinamento caiu drasticamente nos últimos 15 anos; agora a tendência é se elevar, mas – mesmo assim – a partir de um nível bem baixo. Vai ser um longo caminho até as Forças Armadas russas voltarem a ser levadas a sério.

Sascha Lange é biólogo e especialista em armamentos do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP).