1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Cúpula de palácio no coração de Berlim gera polêmica

29 de maio de 2020

Abóbada colocada em local que está sendo reconstruído traz inscrição e símbolos com referências ao cristianismo e ao colonialismo. Prédio abrigará Fórum Humboldt, museu que terá peças da Ásia, África, Américas e Oceania.

https://p.dw.com/p/3czst
Cruz  do Palácio da Cidade de Berlim
Cruz ficará em cima de cúpula com inscrição polêmicaFoto: picture-alliance/dpa/B. Pedersen

Uma controversa cúpula com referências ao cristianismo e ao imperialismo prussiano deve ser colocada nesta sexta-feira (29/05) no topo do Palácio da Cidade de Berlim (Berliner Stadtschloss), numa das últimas etapas da obra de reconstrução do edifício que abrigará o Fórum Humboldt, um museu que contará com artefatos da Ásia, África, Américas e Oceania.

A cúpula tem sido alvo de polêmica. O que está em questão não é apenas uma cruz que ficará no topo, mas também a inscrição que o rei Frederico Guilherme 4º da Prússia acrescentou ao palácio na década de 1840: "Não há outra salvação, não há outro nome dado aos homens, mas o nome de Jesus, em homenagem ao Pai, em nome de Jesus todos os que estão no céu e na terra e debaixo da terra devem se ajoelhar ".

O Parlamento alemão (Bundestag) havia aprovado a reconstrução do palácio sem a cúpula. Defensores da restauração, por meio de uma associação de doadores, conseguiram, no entanto, doações que financiaram a controversa abóbada. A viúva do fundador da empresa de venda por correspondência Otto chegou a doar um milhão de euros (quase 6 milhões de reais) para a cruz.

A cúpula recebeu críticas do curador do museu de Frankfurt, Mahret Kupka, que também é vinculado à Iniciativa de Pessoas Negras na Alemanha (Initiative Schwarze Menschen). "O cristianismo tem sido um canal através do qual o colonialismo também funcionou e foi fortalecido. Em nome do cristianismo, coisas foram roubadas ou destruídas", afirmou.

Durante seu período colonial – de 1884 a 1919, a Alemanha possuiu colônias na África e na Oceania, e algumas foram palco de massacres comandados por alemães, como o genocídio dos hereros, em 1904, na colônia Sudoeste Africano Alemão, atual Namíbia.

Desde a Segunda Guerra Mundial, no entanto, argumenta Kupka, a Alemanha se tornou uma sociedade heterogênea. "Esta é simplesmente uma declaração que realmente mina tudo o que o Fórum Humboldt afirma querer ser", acrescentou sobre a cúpula.

Os defensores de restauração argumentam que a reconstrução do palácio dessa forma, e com um interior moderno muito diferente, restaurará o eixo visual de Berlim a partir do Portão de Brandemburgo e refletirá a reconciliação também contida no cristianismo.

O edifício original, que remonta ao século 18, foi parcialmente destruído durante a Segunda Guerra Mundial e teve seus restos derrubados por autoridades comunistas. No lugar, foi erguido o legendário Palácio da República, na década de 1970. Após intensos debates, este acabou sendo demolido entre 2006 e 2008. Quatro anos mais tarde, em 2012, teve início no local a construção da réplica do palácio prussiano, com o interior moderno e fachadas barrocas.

Em um comentário no jornal Jüdische Allgemeine, com sede em Berlim, o rabino Andreas Nachama, que lidera o conselho alemão de cooperação entre cristãos e judeus, pediu a bispos católicos e protestantes de Berlim que defendam a retirada da citação do rei prussiano da cúpula do palácio.

Nachama argumentou que Frederico Guilherme 4º é conhecido pela "repressão sangrenta da revolução da [então imperial Alemanha] de 1848". "Estou curioso para ver como os bispos de Berlim reagem à apropriação de sua fé, pois certamente são promotores de cooperação e respeito religiosos".

O secretário de Cultura de Berlim, Klaus Lederer, do partido A Esquerda, disse que inclusão da cruz "neutraliza quase tudo o que queremos com o Fórum Humboldt: mostrar quão ambíguas, diversas, intrincadas, mais amplas e profundas nossas raízes realmente são".

Já a ministra alemã da Cultura, Monika Grütters, da União Democrata Cristã (CDU), descreveu a cruz da cúpula como um símbolo cristão "de caridade, liberdade, cosmopolitismo e tolerância", refletido na tarefa do novo centro de Humboldt de ser um "fórum de entendimento" entre as culturas do mundo. Ela acrescentou que o presidente da Associação de Muçulmanos na Alemanha a incentivou a defender as raízes cristãs do país.

Embora a réplica do palácio não tenha todas as suas todas fachadas em estilo barraco, com pelo uma delas – a voltada para o rio Spree – em estilo moderno, Wilhelm von Boddien, diretor da associação que angariou fundos para a obra, disse que deixar de fora a cruz seria contrário à "reconstrução de um monumento perdido".

"Isso não funciona para um projeto como esse. Depois, abre-se imediatamente a porta para outras omissões e torna-se facilmente criticado. Aqui se aplica o princípio ou grávida ou não grávida. Um pouco grávida não é possível", declarou.

LL/dw

______________

A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos no Facebook | Twitter | YouTube 
App | Instagram | Newsletter