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Cair para levantar

Karina Gomes
13 de julho de 2018

Educação dos filhos na Alemanha pode causar espanto, mas aparente frieza dos pais tem objetivo claro: estimular independência e autoconfiança das crianças. O tratamento é de igual para igual, e as regras são claras.

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Criança de bicicleta
Crianças em idade escolar vão sozinhas para todo lado, de bicicleta ou com o transporte públicoFoto: picture-alliance/dpa

Meu ímpeto foi correr para levantar a criança em prantos do chão. Mas contive meu espírito maternal. A mãe esperava o menino de dois anos de idade estirado no chão se levantar. Ela assistia parada ao desespero do filho, que tinha acabado de cair da bicicletinha.

O pai se comportou da mesma forma. "Não foi nada, levante-se. Vamos!", disse. Mas o menino continuava de barriga para baixo aguardando amparo. Depois de minutos em vão, a criança se levantou, sacudiu a poeira do corpo e continuou o passeio em família. Só então os pais levantaram a bicicleta e deram atenção para a criança.

A cena no parque municipal de Weimar, no leste da Alemanha, me deixou em choque. Essa e outras experiências na Alemanha, no entanto, me fizeram entender que a ideia de "cair para levantar" faz parte do processo de educar os filhos por aqui. Desde muito cedo, as crianças aprendem a não derramar um rio de lágrimas por qualquer motivo. Até mesmo por um tombo de bicicleta sem gravidade.

Fazer manha não sensibiliza os pais. A resposta é dura e direta. Meu namorado, alemão, nunca levou uma palmada, mas a mãe sempre ameaçou quando ele chorava à toa: "Você vai parar agora ou quer que eu te dê um motivo real para chorar?" Ele nunca arriscou saber o que aconteceria. Crianças choronas demais não têm vez na Alemanha.

Não ligar para os tombos pode parecer cruel, mas a aparente frieza dos pais tem metas claras: estimular a independência e a autoconfiança das crianças. E também, é claro, evitar shows de birra, principalmente em espaços públicos.

As crianças alemãs assumem responsabilidades desde pequenas. Dependendo da idade, os pais não ajudam os filhos a tirar o casaco ou a colocar os sapatos, mesmo que leve o dobro do tempo. O objetivo é que a criança aprenda sozinha e o mais cedo possível. Crianças em idade escolar vão sozinhas, sem a companhia dos pais, para todo lado, de bicicleta ou com o transporte público.

O tratamento também é de igual para igual. Geralmente, os pais se agacham para falar com os filhos na mesma altura, e não de cima para baixo. Não é não, e as regras são claras.

Com essas premissas em prática, o relacionamento entre pais e filhos amadurece. Faça chuva ou faça sol, passeios ao ar livre estão garantidos. E, se cair durante a brincadeira, basta se levantar.

Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre os hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África tem prêmios jornalísticos na área de sustentabilidade e é mestre em Direitos Humanos.

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