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Chefe do Exército argelino defende afastamento do presidente

26 de março de 2019

Aliado do chefe de Estado, general pede que Abdelaziz Bouteflika seja declarado incapaz de governar e retirado do cargo. Argélia vive onda de protestos contra "presidente-fantasma", no poder há duas décadas.

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O presidente da Argélia, Abdelaziz Bouteflika
Bouteflika, de 82 anos, é presidente da Argélia desde 1999. Com saúde debilitada, há anos ele não fala em públicoFoto: picture-alliance/S. Djarboub

O chefe de gabinete do Exército e vice-ministro da Defesa da Argélia, general Ahmed Gaid Salah, defendeu nesta terça-feira (26/03) que o presidente Abdelaziz Bouteflika seja declarado incapaz de governar, após semanas de intensos protestos populares exigindo a renúncia do líder.

Considerado um dos homens mais fiéis a Bouteflika, Gaid Salah afirmou que a solução para a crise política deve estar dentro da Constituição e mencionou o artigo 102, que prevê a inabilitação do presidente por "doença grave e duradoura".

"Se faz necessário, inclusive imperativo, adotar uma solução para sair da crise que responda às demandas legítimas do povo argelino e que garanta o respeito das disposições da Constituição e a manutenção da soberania do Estado", disse o general, em discurso na cidade de Uargla.

"Uma solução que seja capaz de alcançar o consenso de todas as visões e o acordo unânime de todas as partes", acrescentou ele. A aplicação do artigo 102 já foi demandada por alguns dos opositores argelinos que saíram às ruas nas últimas semanas.

Gaid Salah, nomeado chefe de gabinete do Exército pelo próprio presidente em 2004, lembrou que a situação argelina tem sido marcada por "manifestações populares pacíficas, organizadas em todo o território nacional, que exigem mudanças políticas".

Algerien, Algier: General Gaid Salah
Gaid Salah foi nomeado chefe de gabinete do Exército em 2004 pelo próprio BouteflikaFoto: picture-alliance/dpa/A.Belghoul

Segundo o militar, esses protestos poderiam ser "explorados por partes hostis, tanto dentro como fora do país, para tentar quebrar a estabilidade" da Argélia.

Portanto, "para evitar qualquer situação incerta à nossa nação, é dever de todos trabalhar com patriotismo e sacrifício e privilegiar os interesses supremos do país para encontrar, no futuro imediato, uma solução para resolver a crise", completou.

É raro ver o Exército intervindo diretamente em crises políticas na Argélia, mas as centenas de milhares de pessoas que vêm pressionando Bouteflika a deixar o poder, enquanto aliados importantes o abandonam, levaram os militares a tentar restaurar a ordem.

Após a declaração de Gaid Salah nesta terça-feira, o conselho constitucional da Argélia realizou uma reunião especial para tratar do assunto, segundo informou a emissora privada El Bilad.

É esse conselho que tem o poder de aplicar o artigo 102 da Constituição. O texto prevê o afastamento do presidente se, "por causa de doença grave e duradoura, ele se encontrar em total incapacidade de exercer suas funções".

Caso o conselho constitucional o declare formalmente inapto para o cargo, as câmaras alta e baixa do Parlamento argelino teriam que confirmar a decisão por uma maioria de dois terços.

Segundo a Constituição argelina, é o líder da câmara alta do Parlamento – no caso, Abdelkader Bensalah – que assume interinamente a presidência do país se o presidente for afastado. Novas eleições teriam que ser convocadas.

Presidente-fantasma

Bouteflika, de 82 anos, está desde 1999 na presidência do país norte-africano. Em 2013, ele sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) que o colocou numa cadeira de rodas e o impediu de participar da campanha para as eleições presidenciais de 2014. Mesmo assim, venceu o pleito.

Desde então, Bouteflika não fala em público. Suas aparições são raras, limitadas a imagens gravadas pela emissora estatal durante conselhos de ministros e visitas de líderes estrangeiros.

Faz cinco anos que ele não viaja para compromissos no exterior. Chegou a cancelar de última hora, alegando recaídas de saúde, reuniões já confirmadas com líderes como a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman.

Com preocupações crescentes, nos últimos anos, sobre se a saúde debilitada de Bouteflika lhe permite tomar decisões e agir de forma independente, os detalhes sobre a saúde do presidente vêm sendo tratados como segredo de Estado. Recentemente ele retornou ao país após duas semanas de internação num hospital na Suíça.

A oposição argelina acusa o mandatário de ser um presidente "fantoche de militares", que apenas dá rosto civil a um governo comandado pelas Forças Armadas há décadas, desde que o país conquistou sua independência da França, em 1962.

O governo é também acusado de corrupção, de enriquecer às custas do país rico em gás e de não atender às preocupações dos cidadãos comuns, especialmente os jovens pobres.

Opositores saem às ruas da Argélia todas as semanas desde 22 de fevereiro
Opositores saem às ruas da Argélia todas as semanas desde 22 de fevereiroFoto: Reuters/R. Boudina

Quinto mandato

Diante das intensas manifestações populares, Bouteflika anunciou, em 11 de março,que desistiu de concorrer a um quinto mandato consecutivo nas próximas eleições presidenciais, cerca de uma semana após ter oficializado sua participação na disputa.

O presidente, contudo, decidiu adiar o pleito, antes marcado para 18 de abril, e disse que uma nova data para a votação será estabelecida em uma conferência nacional.

Essa mesma conferência ficará responsável por supervisionar a transição de governo, bem como elaborar uma nova Constituição para o país, que será submetida à população em referendo. Os trabalhos devem ser finalizados até o fim do ano, com eleições sendo convocadas em seguida.

Ao anunciar que deixará a presidência da Argélia após 20 anos no poder, Bouteflika afirmou que seu último dever como presidente é contribuir para a fundação de uma nova república e de um novo sistema que esteja "nas mãos de novas gerações de argelinos".

A manobra não foi suficiente para acalmar a população, que segue indo às ruas. Críticos temem que as movimentações, incluindo o adiamento das eleições, possam abrir caminho para que o presidente avance um sucessor escolhido a dedo por ele mesmo.

EK/afp/ap/efe/rtr/dw

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