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Dian Fossey e "seus" gorilas-da-montanha

Brigitte Osterath (rc)26 de dezembro de 2015

Há 30 anos era brutalmente assassinada em Ruanda a pesquisadora americana que lutara incansavelmente para proteger os primatas da extinção. Utilizando métodos agressivos e pouco ortodoxos, ela fizera muitos inimigos.

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Pesquisadora Dian Fossey entre os gorilasFoto: Foto: The Dian Fossey Gorilla Fund International/www.gorillafund.org/dpa

Até hoje não se sabe a identidade do assassino da pesquisadora de gorilas Dian Fossey. Na madrugada do dia 26 para 27 de dezembro de 1985, alguém invadiu a cabana onde ela morava e a atingiu por duas vezes, no rosto e na cabeça, com uma machete, no que pareceu ser um ato de vingança pessoal.

A americana fizera numerosos inimigos na comunidade local, em razão de seu trabalho. Ela lutava sem descanso contra os caçadores ilegais que ameaçavam a existência de "seus" gorilas-da-montanha. Nos anos 1970, restavam apenas 250 espécimes nas montanhas Virunga, na fronteira da República Democrática do Congo (então Zaire) com Ruanda e Uganda.

Apesar de a maioria dos caçadores não visar os primatas, com frequência estes acabavam presos nas armadilhas destinadas aos búfalos ou antílopes. Fossey temia que os gorilas-da-montanha pudessem estar extintos até o fim do século 20, caso nenhuma medida fosse tomada. Ela acreditava que apenas métodos drásticos poderiam salvar a espécie, considerando inúteis quaisquer metas de preservação de longo prazo.

US-Forscherin Dian Fossey
Fossy declarou guerra à caça furtiva, utilizando métodos drásticosFoto: Foto: The Dian Fossey Gorilla Fund International/www.gorillafund.org/dpa

Métodos pouco ortodoxos

Diversas ONGs defendem hoje que a preservação só é possível com o apoio das comunidades locais, de cujo comprometimento o êxito dos projetos depende. As táticas de Fossey, porém, eram diferentes. Seu objetivo era proteger os gorilas dos humanos utilizando todos os métodos necessários, no que denominava "preservação ativa".

Em seu portal de internet, o Dian Fossey Gorilla Fund International, fundado por ela, admite que seus métodos eram "pouco ortodoxos". Utilizando máscaras, ela afugentava os praticantes da caça furtiva, queimava armadilhas de rede e aplicava tinta de spray no gado a fim de desencorajar os criadores de levá-lo para pastar no parque nacional.

"Essas táticas não eram populares entre os nativos, que lutavam para sobreviver", relata o Fundo Fossey. A situação ficou especialmente violenta após 1977, quando caçadores ilegais mataram Digit, o gorila favorito de Fossey. Quando ela encontrou sua carcaça, o animal de cinco anos de idade tinha sido esfaqueado diversas vezes e tido as mãos e a cabeça decepadas.

A partir daí, a pesquisadora declarou guerra aos caçadores. Ela os enfrentava diretamente, forçando o confronto e não hesitando em tomar a lei nas próprias mãos. Tudo o que se fazia contra os gorilas "dela" virava uma questão pessoal.

Alguns a descreveram como uma mulher amarga, que esnobava outros pesquisadores e encarava todos os africanos com condescendência e rejeição. Outros, porém, a elogiavam como uma heroína dedicada, que queria salvar uma espécie sob risco de extinção.

François Bigirimana, guia doVolcanoes National Park, em Ruanda, que trabalhou com Fossey, conta que admirava seus esforços e comprometimento incansáveis. "Ela era tão corajosa, fazendo o que os guardas ou as autoridades locais não faziam."

Spielfilmszene Gorillas im Nebel
Filme "Na montanha dos gorilas" ajudou a sensibilizar para situação dos primatasFoto: picture-alliance/Bildarchiv

Uma vida pelos primatas

Nascida em 1932 nos Estados Unidos, em San Francisco, Califórnia, Dian Fossey. viajou em 1963 para a África. Durante caminhada por uma trilha em Uganda, ela encontrou um gorila pela primeira vez.

Em sua autobiografia Gorillas in the mist (Gorilas na névoa), publicada em 1983, ela diz que "foi a individualidade deles, combinada com a timidez de seu comportamento, que deixou a impressão mais cativante desse primeiro encontro com o maior dos grandes primatas".

Em 1966, ela retornou de vez à África para se dedicar à proteção e pesquisa dos animais. Em 1967, fundou o centro de pesquisas Karisoke, entre os vulcões de Karisimbi e Visoke, em Ruanda, onde viveu e trabalhou até sua morte.

Os nativos da parte ruandesa das montanhas Virunga a chamavam de "Nyiramacibili" – mulher que vive sozinha na floresta.

Para estudar o comportamento dos primatas, ela precisou estar bastante próxima a eles, para ganhar sua confiança e aceitação. Ela deixava os gorilas à vontade, imitando suas atividades, como a forma de se coçar, e suas vocalizações. Mastigava aipo quando estava próximo ao grupo e caminhava com os punhos no chão.

No final, teve sucesso, conseguindo aproximar-se dos primatas mais do que qualquer ser humano antes dela, estudando sua estrutura social, estratégias de reprodução e personalidades. Na biografia, contudo, Fossey afirma que os humanos não têm direito de estar no mundo dos gorilas. "Qualquer observador é um intruso no domínio de um animal selvagem, e deve lembrar que os direitos deles suplantam os interesses humanos."

Berggorillas in Uganda
Gorilas da montanha aumentaram de número, mas ainda correm risco de extinçãoFoto: Rainer Dückerhoff

Missão cumprida

Os gorilas-da-montanha eram como membros da família para ela, que costumava dizer que se sentia em casa junto a eles. Após sua morte violenta em 1985, Fossey foi enterrada no cemitério de gorilas atrás de sua cabana em Karisoke, ao lado do querido Digit.

Três anos mais tarde, sua biografia foi filmada para o cinema, com a atriz Sigourney Weaver no papel principal. O filme, lançado no Brasil como Nas montanhas dos gorilas, ajudou a conscientizar para a situação da espécie ameaçada de extinção.

Segundo Erika Archibald, do Fundo Fossey, a pesquisadora americana merece o crédito por "fazer com que gente de todo o mundo se tornasse receptiva às necessidades desses animais". E também "deixou bem claro que eles precisam de proteção".

Antiortodoxa, ativista ou simplesmente obstinada: como quer que se descreva Dian Fossey e sua estratégia, ela teve sucesso em sua empreitada. Hoje existem cerca de 480 gorilas nas montanhas Virunga, de um total de 880 em todo o mundo. Assim, são a única espécie primata cujo número está aumentando. Não obstante, a União Internacional para a Conservação da Natureza qualifica os gorilas-da-montanha como "sob grave risco de extinção".