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Eleição presidencial

29 de junho de 2010

O principal candidato da oposição, Joachim Gauck, é o favorito da população, mas tem poucas chances diante do governista Christian Wulff na eleição indireta que determinará o novo chefe de Estado alemão.

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Gauck, Jochimsen e Wulff: um deles será o novo presidenteFoto: AP/DW-Grafik

Poucas eleições para presidente da República Federal da Alemanha despertaram um interesse popular tão grande e causaram debates políticos tão acirrados no país quanto a desta quarta-feira (30/06), quando quatro candidatos se submetem à vontade da Assembleia Federal em Berlim.

A campanha ganhou as redes sociais, como o Facebook; o governo de conservadores e liberais teve de negar reiteradamente especulações de que uma derrota do seu candidato venha a significar o fim da coalizão de governo; e uma velha discussão foi reaberta: por que não há eleições diretas para presidente na Alemanha?

Apenas dois dos quatro candidatos têm reais chances de serem eleitos: o governador da Baixa Saxônia, Christian Wulff, indicado pelos partidos do governo, CDU (União Democrata Cristã), CSU (União Social Cristã) e FDP (Partido Liberal Democrático), e o teólogo evangélico Joachim Gauck, ex-encarregado de organizar os arquivos do Stasi, o serviço secreto da Alemanha Oriental, indicado pelo Partido Social Democrata (SPD) e pelo Partido Verde.

Além deles, concorrem a deputada e jornalista Luc Jochimsen, indicada pelo partido A Esquerda, e um candidato indicado pelo partido NPD, de extrema direita, o compositor Frank Rennicke.

Crise no governo

Se fosse uma simples questão matemática, Wulff estaria eleito: CDU, CSU e FDP têm 644 votos na Assembleia Federal, de um total de 1.244, ou seja, mais do que os 623 (metade mais um) necessários para uma vitória no primeiro turno. Mas essa vantagem de 21 votos é menor do que a de eleições anteriores, e há indícios suficientes de que Wulff não poderá contar com todos os delegados de suas fileiras.

O temor das lideranças da coalizão conservadora-liberal é que a crise em que se encontra a aliança governista tenha reflexos na eleição presidencial, ou seja, que delegados – principalmente do FDP – usem a eleição para manifestar sua insatisfação com os rumos da coalizão.

Motivos para isso não faltam: nas últimas semanas, integrantes da CDU-CSU e do FDP trocaram ofensas pela imprensa, e pontos importantes da agenda dos liberais, como a reforma do sistema de saúde e a diminuição da carga tributária, não avançam.

Assim, diversos representantes do FDP manifestaram simpatia pelo principal candidato da oposição, Gauck. Na Saxônia, os três delegados dos liberais disseram que vão votar nele e, em Bremen, um delegado do partido também abriu o voto para o teólogo.

A situação levou o presidente do FDP, Guido Westerwelle, a assegurar nesta segunda-feira que os liberais estão com Wulff e que no partido há apenas "três, quatro, talvez cinco" delegados que votarão em Gauck. Uma derrota do candidato situacionista traria prejuízos às imagens da chanceler federal Angela Merkel, e de Westerwelle, e poderia piorar ainda mais a já crítica situação da coalizão.

Votos de A Esquerda

Além de dissidentes entre os delegados dos conservadores e liberais, Gauck poderia também contar com votos de A Esquerda no terceiro turno. O partido é forte no Leste Alemão, onde Gauck tem uma história de luta em favor da democracia e dos direitos do cidadão. Representantes do partido chegaram a manifestar simpatia pelo candidato, mas as lideranças rejeitam com veemência a hipótese.

"Para A Esquerda está claro: Joachim Gauck não é nosso candidato, e não há nada que nos faça mudar de posição do primeiro até o terceiro turno", afirmou Gesine Lötzsch, presidente do partido, à emissora Deutschlandfunk.

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A distância entre Gauck e A Esquerda ficou ainda mais acentuada nos últimos dias, depois de o candidato criticar o partido em várias entrevistas. Entre outros pontos, ele afirmou que A Esquerda não tem condições de participar de um governo em nível federal e disse desconfiar da oposição do partido à presença alemã no Afeganistão. "Isso é um pacifismo tático e não ético." Gauck também é um ferrenho crítico da Alemanha comunista, ao passo que muitos membros de A Esquerda são antigos comunistas.

A Esquerda tem 124 delegados, e eles poderiam ajudar a eleger Gauck no terceiro turno, quando basta a maioria simples.

Sem orientação partidária

O voto é secreto e a legislação proíbe os partidos de exercerem pressão sobre os delegados por eles indicados. Mas os partidos governistas tentaram diminuir o risco já na nomeação dos delegados, optando por aqueles mais próximos à linha partidária.

É perceptível, por exemplo, que nesta eleição há menos artistas, esportistas e personalidades indicadas do que em eleições passadas – o voto deles tende a não seguir orientações partidárias. Na Turíngia, o nome de Dagmar Schipanski, da CDU, ex-candidata à Presidência, não foi colocado na lista – talvez por ela ser vista como simpatizante de Gauck, escreve a agência de notícias DPA.

O ex-governador da Saxônia Kurt Biedenkopf, da CDU, se declarou decepcionado com o comportamento dos líderes de seu partido. Segundo ele, "sobrou muito pouco" da ideia original de livre arbítrio na eleição presidencial. Oficialmente nem Wulff nem Gauck estão em campanha. Mas ambos viajaram pela Alemanha para se encontrar principalmente com deputados federais e estaduais, que formam o maior contingente do colégio eleitoral.

Candidato do povo

Apesar de Gauck ter chances reduzidas na Assembleia Federal, a maior parte da população alemã prefere o teólogo do lado oriental. Uma pesquisa feita pelo instituto Emnid a pedido do jornal popular Bild am Sonntag apontou que 42% dos alemães consideram Gauck o melhor candidato, contra 36% que preferem Wulff. Em outra pesquisa, da rede de televisão ARD, a proporção é de 43% contra 37%.

O apoio popular a Gauck também se evidencia na internet. No Facebook, a página "Joachim Gauck for President", que foi criada por admiradores e não é administrada pelo candidato, tem 13 mil apoiadores. Já a página de Christian Wulff, criada e mantida por ele, tem 3.800 membros.

Eleição indireta

Na Alemanha, o presidente não é eleito pelo voto direto da população, mas pela Assembleia Federal, que se constitui especialmente para esse fim. Dela fazem parte os 622 deputados do Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão) e mais 622 delegados enviados pelas bancadas dos 16 estados da federação.

O número de delegados é proporcional à população dos estados. O mais populoso, a Renânia do Norte-Vestfália, tem também o maior número de delegados: 133. O menor de todos, Bremen, envia cinco delegados. Apesar de indicados pelas bancadas estaduais – portanto, indiretamente pelos partidos – os delegados têm livre arbítrio para votar, o que é assegurado pela lei.

A votação ocorre em três turnos. Nos dois primeiros, um candidato deve obter a maioria absoluta (metade mais um) para ser eleito. No terceiro basta a maioria simples (ser o mais votado entre todos).

Os legisladores alemães do pós-guerra optaram conscientemente pela eleição indireta e por um papel predominantemente representativo para o presidente, devido às experiências da República de Weimar. O poder e a representatividade do presidente de então são vistos como fundamentais para a ascensão de Adolf Hitler.

A discrepância entre a vontade da população e o provável resultado da Assembleia Federal reacendeu na Alemanha as discussões sobre a eleição direta para presidente. Pesquisas mostram que 60% da população apoiam a ideia.

Uma mudança constitucional como essa necessitaria de dois terços dos votos do Parlamento para ser levada adiante. Mas os grandes partidos CDU e SPD, e também o Partido Verde, rejeitam a ideia, o que, na prática, a torna pouco provável.

AS/dpa/rtr/afp/epd

Revisão: Roselaine Wandscheer