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Segurança euroasiática

17 de outubro de 2010

As instituições da União Europeia muitas vezes não podem operar com eficiência em matéria de segurança, pois não contam com o respaldo de países importantes, como a Rússia. Especialistas sugerem novas alianças de defesa.

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Relatório propõe outro triunvirato para política de segurançaFoto: AP

A chanceler federal alemã, Angela Merkel, se encontra nesta segunda-feira (18/10) com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e o russo, Dimitri Medvedev, na cidade francesa de Deauville, a fim de discutir a cooperação dos três países em matéria de segurança.

Os dirigentes também conversarão sobre eventuais posições comuns na cúpula do Grupo dos 20 (G20), a ser realizada de 11 a 12 de novembro, na Coreia do Sul. Da agenda do encontro também constam os objetivos que a França tentará alcançar quando assumir a liderança do G20, em novembro próximo, e do Grupo dos Oito (G8), em janeiro de 2011.

O encontro na cidade francesa é realizado em um momento em que as relações entre a Rússia e a União Europeia parecem estar melhorando, sobretudo após sinais de aproximação por parte de Moscou e a gradativa integração dos Estados do antigo bloco soviético à UE.

Bergkarabach Heckenschütze
Situação no Alto Karabakh ainda é tensaFoto: RIA Novosti

Entre as questões de segurança a serem abordadas em Deauville está a estabilidade das regiões em crise nas fronteiras orientais da Europa e focos de conflito em potencial, como a Transnístria, na Moldávia, e a disputa entre a Armênia e o Azerbaijão pela região do Alto Karabakh, no sul do Cáucaso.

Apesar da importância dessas questões de segurança para as nações que compõem a Federação Russa e a União Europeia, o Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR, na sigla em inglês), que se autodefine como "o primeiro think tank paneuropeu", acha que o encontro em Deauville tem a agenda certa, mas os participantes errados.

Relatório favorece cooperação com Rússia e Turquia

Em um relatório recente, o diretor do ECFR, Mark Leonard, e o politólogo búlgaro Ivan Krastev argumentam que uma tríade entre União Europeia, Rússia e Turquia poderia ser mais eficiente para a segurança europeia e para a estabilidade das regiões em crise do Leste Europeu e da Ásia Central.

"Um fórum informal com parceiros-chave poderia revitalizar as instituições formais de segurança europeia", declarou Mark Leonard à Deutsche Welle. "Uma das razões pelas quais as instituições europeias estão estagnadas hoje é o fato de a Rússia questionar sua legitimidade."

"Enquanto isso, a Turquia está frustrada com a miopia com que certos países-membros europeus estão impedindo a aceitação do país na UE. É tão difícil viabilizar coisas por meio das instituições formais que as potências da Europa muitas vezes começam a atuar fora delas. Isso não é nada bom para a UE, pois queremos um movimento continental por meio de instituições multilaterais, em vez de esferas de influência ou equilíbrio de poder. O relatório conclui que devemos nos envolver com outros parceiros para revitalizar essas instituições."

"A UE está perdendo a oportunidade de pensar criativamente sobre uma nova arquitetura de segurança e desenvolver sua própria concepção sobre o futuro da ordem europeia", acrescentou Leonard.

Europa encorajada a assumir maior responsabilidade

Südossetien: Mehrere hundert Tote bei Kämpfen NO FLASH
Guerra na Geórgia revelou fraqueza europeiaFoto: dpa

Considerando que os Estados Unidos, que sempre protegeram a Europa, estão transferindo o foco para seus próprios interesses no Afeganistão, no Irã e e na China, o ECFR chama a União Europeia a uma responsabilidade maior para com seus vizinhos. O relatório aponta que o atual sistema de segurança europeu não conseguiu impedir as guerras no Kosovo e na Geórgia, as disputas de gás e petróleo entre a Rússia e a Ucrânia e as tensões entre Moscou e antigas repúblicas soviéticas. Estaria, portanto, na hora de se adaptar a uma nova realidade.

"A UE, a Rússia e a Turquia são bastante afetadas pelos Estados situados na fronteira leste do bloco europeu e têm desenvolvido políticas de vizinhança complexas para administrar as relações com o oeste dos Bálcãs, o Leste Europeu e a Ásia Central", afirma Mark Leonard. "Essa zona de instabilidade é ameaçada por tensões étnicas, Estados fracos e questões de energia."

O relatório sugere que um diálogo tríplice que apontasse para um plano de segurança com a Rússia e a Turquia poderia permitir à UE reduzir as tensões em suas fronteiras, desmilitarizando as regiões mais instáveis do continente e resolvendo conflitos estagnados.

Caso os primeiros resultados dessa iniciativa se mostrassem satisfatórios, os países da UE poderiam se tornar mais receptivos para a proposta do presidente Medvedev sobre um tratado de segurança europeu. Até agora, a sugestão do líder russo vem sendo encarada com ceticismo por diversos países, entre os quais os EUA, que acreditam que um tratado desses poderia minar a Otan e atribuir à Rússia o poder de vetar as atividades da aliança.

O ECFR não acha que um aparato de segurança envolvendo a Rússia pudesse ameaçar o conselho Otan-Rússia ou outras estruturas existentes, como a Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE). Afinal, um novo fórum trabalharia ao lado de estruturas já vigentes.

Vantagens de um fórum tríplice de segurança

Asher Pirt, pesquisador do British East West Center, uma ONG que trabalha com a Rússia e a Comunidade dos Estados Independentes (CEI), acredita que a UE, a Rússia e a Turquia também possam tirar proveito de uma aliança tríplice.

"A Rússia, a Turquia e a União Europeia têm toda clareza de que a estabilidade na antiga União Soviética é muito importante para todos", declarou o pesquisador à Deutsche Welle.

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Conflitos étnicos no Quirguistão tiveram repercussão mundialFoto: AP

"Conflitos em potencial podem causar inúmeros problemas para todas as grandes potências. Intervenções militares são dispendiosas e politicamente perigosas. Ajuda humanitária é cara e nenhuma das grandes potências deseja assistir à tragédia do conflito. A questão dos refugiados também é fundamental para essas três potências. Afinal, os conflitos podem se espalhar e gerar instabilidade dentro de suas próprias fronteiras, algo que todos querem evitar."

Pirt acredita que essa tríade possa ter um efeito positivo sobre regiões instáveis, pois cada uma das partes contribuiria com sua competência e seu conhecimento de causa. "Além disso, a Turquia e a Rússia têm vínculos linguísticos com grupos étnicos em toda a antiga União Soviética", lembrou ele.

Para Pirt, "a União Europeia ainda precisaria pensar em como financiar projetos de longo prazo capazes de promover o entendimento entre as facções de vários conflitos". Isso incluiria o apoio a projetos de desenvolvimento de longo prazo para incentivar a educação, o mercado de trabalho e as práticas democráticas nessas regiões.

Um trabalho de décadas

No entanto, mesmo que uma aliança tríplice venha a se tornar realidade, a União Europeia, a Rússia e a Turquia teriam que enfrentar notáveis dificuldades para resolver os conflitos nas regiões vizinhas em crise.

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Presidente Dimitri Medvedev e premiê turco, Recep Tayyip Erdogan, assinaram acordos em junho deste anoFoto: AP

"Uma solução desses conflitos só acontecerá mesmo se todos os envolvidos realmente quiserem que isso aconteça, não importa quanta pressão sofram", declarou Pirt. "Sanções não funcionam, pois quem sofre é a população, e não as lideranças políticas."

"Lidar com questões de segurança como essas pode levar décadas, e não apenas meses", conclui o especialista. "Se a aliança não conseguir chegar a um consenso em como lidar com esses problemas, qualquer tentativa de resolvê-los estará fadada ao fracasso."

Autor: Nick Amies (sl)
Revisão: Augusto Valente