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Fora do armário: cultura gay chega aos museus

Rodrigo Rimon28 de maio de 2006

Exposição em Zurique busca avaliar o quanto da subcultura gay foi incorporado ao cotidiano heterossexual – seja na moda, na música, no cinema, na propaganda ou naquilo que eles fazem melhor que ninguém: festas.

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Cartaz publicitário da Telecom PTT de 94: 'Meu coração pertence a você'Foto: Plakat Telecom PTT, 1994, Sammlung Museum für Kommunikation, Bern

Os anos 90 teriam sido os da emancipação masculina: a década em que os homens se livraram de estereótipos arcaicos, da idéia de que “homens de verdade” não se interessam por roupas, cosméticos, cortes de cabelo etc. Uma prova disso seria o conceito de metrossexual, usado e abusado pela mídia internacional. Só que os verdadeiros protagonistas deste processo não seriam bem eles, mas seus colegas de vestiário – os gays.

Isso é o que propõe a exposição Gay Chic – da subcultura ao mainstream, organizada pelo Museu do Design de Zurique, na Suíça. Em cinco módulos temáticos – moda, propaganda, televisão e cinema, vida noturna e música pop – a mostra pretende mostrar “como o estilo da subcultura gay [e, em menor escala, lésbica] foi transferido para o cotidiano visual de heterossexuais, ao qual dá novos impulsos”.

No entanto, para comprovar a veracidade dessa tendência, os curadores Cynthia Gavranic e Urs Küenzi se apóiam em uma tese um tanto questionável: a de que o desenvolvimento da sociedade para melhor teria proporcionado uma alteração da percepção de gays e lésbicas na sociedade, abrindo espaço para uma troca mútua de estilos. Esta seria, por sua vez, completada por maior flexibilidade na troca de papéis sociais, proporcionada pelo estilo de vida pós-moderno.

Transferência cultural

A exposição é pequena, mas convence em uma primeira visita. Começando pela moda, a mostra não só resgata estereótipos da cultura gay, como um figurino andrógino da garçonnette por excelência Marlene Dietrich (original, emprestado pelo Museu do Cinema de Berlim), mas também aborda, por exemplo, a fixação entre gays por cuecas Calvin Klein (ao menos desde a campanha publicitária estrelada pelo ator Mark Wahlberg) e os diversos penteados de David Beckham.

Gay Chic - von der Subkultur zum Mainstream
Marinheiros na campanha da marca italiana Diesel de 94Foto: Diesel Spa, Werbung Diesel, 1994

A publicidade, aliás, seria um dos veículos principais de propagação da cultura gay, pois teria descoberto que “gay vende”. Argumentando que diversas campanhas de marketing são antes testadas entre consumidores homossexuais, a mostra realça até que ponto campanhas atuais incorporaram elementos da obra de artistas como Bruce Weber, Pierre et Gilles e Robert Mapplethorpe.

A mostra também aponta para o sucesso de programas de TV como o americano Queer eye for the straight guy, no qual um homem heterossexual é submetido a uma metamorfose estilística executada por um grupo de estilistas, cabeleireiros, decoradores e outros profissionais – todos gays. Além, claro, da popularidade desfrutada hoje em dia por cineastas como Pedro Almodóvar e François Ozon, cujas obras reproduzem nas telas um pouco da realidade desta (ex-)subcultura.

Mas é da vida noturna e da música pop que vêm os argumentos mais incisivos, embora o que esteja em jogo não seja a música em si, mas sua estética e atitude. Afinal, nelas a tênue fronteira da androginia vem sendo cruzada desde os anos 80 por artistas como Boy George e Wham!, e a estética fetichista virou pop no corpo de Freddy Mercury. Isso sem esquecer a trajetória de sucesso de gêneros como a house music, que surgiu praticamente entre drag queens de Nova York.

Gays são peças de museu?

Gay Chic - von der Subkultur zum Mainstream Vanity Fair
Cindy Crawford e K.D. Lang na capa da Vanity Fair de agosto de 93Foto: Fotoatelier hgkz

No entanto, embora a exposição tenha encontrado ressonância imediata na mídia, seja em veículos de imprensa especializados, seja em semanários e jornais diários, a recepção nem sempre foi positiva.

Para o jornal suíço Die Wochenzeitung, “nem tudo que é gay se destaca por apurados critérios estéticos. Situar entre os gays o desenvolvimento de tendências de moda heterossexuais é um pouco demais de gel nos cabelos. Gay Chic é menos um estilo de vida libertário que uma estética criada pela necessidade. Não se está sendo justo com a subcultura homossexual ao carregá-la posteriormente de glamour”.

De fato, gays e lésbicas não são o ponto nevrálgico da exposição. Aqui, a cultura gay aparece como resquícios de uma cultura passada, sob cujas ruínas uma outra despontou. O que faltou foi mostrar o que restou disso e que cara tem essa subcultura hoje em dia. Afinal, ninguém quer viver um estilo que se pode ver no museu em troca de um ingresso.

A exposição Gay Chic – da subcultura ao mainstream, fica até 16 de julho no Museu do Design de Zurique, na Suíça.