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Fusão de ministérios ameaça meio ambiente e agricultura

1 de novembro de 2018

Possível junção das duas pastas no governo Bolsonaro é rejeitada não apenas por ambientalistas, mas também por setores do agronegócio, devido a potencial prejuízo para exportação de commodities agrícolas.

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Máquinas em plantação de soja no Brasil
Para importar produtos agrícolas do Brasil, muitos países exigem cumprimento de leis ambientaisFoto: Getty Images/AFP/Y. Chiba

Os preparativos para a transição de equipes no Ministério do Meio Ambiente do governo atual para o do presidente recém-eleito Jair Bolsonaro, que teria início ainda em novembro, foram interrompidos pelo anúncio da fusão da pasta com a da Agricultura, nesta terça-feira (30/10). 

"Recebemos com surpresa e preocupação o anúncio da fusão com o Ministério da Agricultura", admitiu o atual ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, após a decisão ser divulgada pelo pelo deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), apontado como futuro ministro da Casa Civil.

Setores do agronegócio também receberam mal a notícia. "Essa junção pode passar para o mercado externo um sinal muito ruim, o que prejudica a nossa pauta de exportação. O agronegócio brasileiro exporta 100 bilhões de dólares por ano em commodities", disse Luiz Cornacchioni, diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), em entrevista para a DW Brasil. 

Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro havia cogitado a possibilidade de unir os ministérios. Um pouco antes do segundo turno, após fortes críticas, o então candidato voltou atrás, para, dois dias depois de ser eleito, seu futuro ministro da Casa Civil novamente reafirmar a fusão.

Dando continuidade ao vai e vem, na noite desta quarta-feira, a assessoria de Bolsonaro informou que o presidente eleito ainda não decidiu sobre a junção das pastas. O anúncio foi feito após o presidente eleito se reunir com o produtor rural Luiz Antônio Nabhan Garcia, que, ao deixar o encontro, disse não haver nada confirmado sobre a fusão e que Bolsonaro "quer ouvir todo mundo" antes de decidir.

No contexto brasileiro, os dois ministérios têm funções quase opostas. O do Meio Ambiente, além de combater o desmatamento e atuar na conservação dos diferentes biomas brasileiros, cuida de questões ligadas ao saneamento, controle da poluição, licenciamento de obras de infraestrutura, como hidreléticas. 

O da Agricultura, por sua vez, é responsável pelo estímulo à agropecuária, ao agronegócio. "Temos mais a perder que ganhar", opina Cornacchioni sobre a fusão. "Essa não é a opinião de todos, mas é a da maioria", comenta sobre o setor. 

Com crescente relevância no PIB brasileiro nos últimos anos, para exportar, o agronegócio precisa atender a mercados que exigem respeito a leis ambientais. União Europeia (UE) e Japão são apontados como os mais exigentes. 

Após o anúncio de Onyz Lorenzonti sobre a fusão dos ministérios, nesta terça, o atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, também lamentou a medida. Segundo Maggi, a junção das pastas "trará prejuízos ao agronegócio brasileiro, muito cobrado pelos países da Europa pela preservação do meio ambiente".

"Já não está fácil fazer negócio no cenário internacional, ainda mais com essa guerra comercial entre Estados Unidos e China. Imagine se a gente sofre uma redução de 10% na nossa pauta de exportação? São 10 bilhões de dólares!", diz o diretor executivo da Abag, pontuando que a perda equivaleria ao total exportado pelo agronegócio da Argentina. 

Perda de credibilidade 

Visto como líder no âmbito de negociações internacionais de meio ambiente por abrigar a maior floresta tropical do mundo, o Brasil desenvolve vários projetos no âmbito do Ministério de Meio Ambiente com financiamento internacional.

Segundo um levantamento feito pela pasta, nos últimos dois anos, 1,6 bilhão de reais vieram de países como Estados Unidos e Alemanha e de fundos internacionais, como o Global Environment Fund (GEF).

O Fundo Amazônia, criado para combater o desmatamento, contou com 605 milhões de reais no mesmo período, valor doado principalmente por Noruega e Alemanha. Em caso de extinção do ministério, ainda não se sabe se os repasses teriam continuidade.

Caso a junção dos ministérios seja efetivada, a cooperação internacional correria riscos, avalia Duarte. "A sobrecarga do ministro com tantas e tão variadas agendas ameaçaria o protagonismo da representação brasileira nos fóruns decisórios globais", diz nota assinada pelo ministro de Meio Ambiente.

Falso paradoxo

Para André Guimarães, representante da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, eliminar o Ministério do Meio Ambiente para favorecer o setor do agronegócio não é inteligente.

"A visão mais moderna da produção, e que grande parte do agronegócio entende, é produzir mais e preservar mais", analisou em entrevista à DW Brasil. "A floresta é nossa fábrica de chuvas. E a agricultura depende da chuva", argumenta sobre a importância da conservação. 

Esse papel atribuído às florestas, evidenciado por diversos estudos científicos, é reconhecido por representantes do agronegócio. "Nós entendemos que a variável ambiental faz parte da equação. Se tirar a questão da sustentabilidade, a conta do agro não fecha", diz Cornacchioni, da Abag.

A responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente, na visão de Duarte, extrapola os limites territoriais do país. "Fragilizar a autoridade que ele representa, no momento em que a preocupação com a crise climática se intensifica, seria temerário. O mundo, mais do que nunca, espera que o Brasil mantenha sua liderança ambiental", finaliza. 

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