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Ideia de mudar Carta pacifista ganha novo impulso no Japão

Julian Ryall ca
4 de maio de 2017

Para muitos japoneses, a Constituição que manteve país afastado de qualquer conflito durante mais de sete décadas ainda é motivo de orgulho. Mas ameaças de Coreia do Norte e China estão levando governo a rever tabu.

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Japan Fernsehen - Nordkorea Raketentest - Bild von Kim Jong-un
TV japonesa mostra teste de míssil norte-coreanoFoto: picture-alliance/Kyodo

Como conservador, o primeiro-ministro Shinzo Abe expressou, frequentemente, o desejo de fazer alterações em partes da Constituição que tratam das políticas de segurança nacional e defesa do Japão, mas nunca esteve em posição de levar à frente tais pretensões.

No entanto, a atual situação geopolítica na região Ásia-Pacífico e, em particular, no nordeste asiático, está levando medo aos japoneses. Eles estão preocupados com o regime da Coreia do Norte, que possui armas nucleares e mísseis balísticos para levá-las até o Japão.

Eles também estão preocupados com a China, que se apropriou e militarizou ilhas no Mar do Sul da China reivindicadas por várias nações. Pequim fez semelhante reivindicação sobre as desabitadas Ilhas Senkaku, ao largo de Okinawa, e a que Pequim se refere como arquipélago Diaoyu. A Guarda Costeira chinesa adentra frequentemente águas territoriais japonesas em torno dessas ilhas, ignorando pedidos para que saia.

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Para o japonês comum, estes são tempos preocupantes. e um número suficiente deles chegou à conclusão que a Constituição, promulgada há sete décadas, não é mais apropriada para os dias de hoje e precisa ser atualizada. E a parte que mais precisa de atualização é o Artigo 9°, que estipula que o povo japonês "renúncia para sempre à guerra" e que "forças áreas, marítimas e terrestres, como também outros potenciais de guerra, nunca serão mantidos."

Sucessivos governos afirmaram que o artigo não proíbe o Japão de ter a capacidade de se defender, permitindo assim a existência das Forças de Autodefesa. No entanto, isso limita realmente tudo que possa ser considerado uma projeção do poderio japonês.

Uma pesquisa de opinião pública conduzida pela agência de notícias Kyodo News, poucos dias antes do 70° aniversário da Constituição, mostrou que 49% dos entrevistados acreditavam que o Artigo 9° precisa ser reformado, superando os 47% que se opõem a qualquer mudança. Quando Abe assumiu o cargo, em dezembro de 2012, 51% da população eram contra tal mudança constitucional, e 45% a favor.

Abe prometeu na última segunda-feira (02/05) a iniciar um debate no Parlamento japonês sobre uma mudança da Constituição. Durante um comício organizado por sua legenda, Partido Liberal Democrático, o premiê disse que é hora de "mostrar ao povo, com confiança, a nova visão para o futuro do país e como poderia ser uma Constituição ideal."

"Pacífico e rico"

O primeiro-ministro disse estar comprometido a criar "um Japão pacífico e rico, enquanto o país enfrenta desafios que vão da ameaça à segurança regional ao encolhimento da população e da força de trabalho."

No país, muitos conservadores acham que a atual Constituição foi imposta ao Japão derrotado por aliados vingativos no rescaldo da guerra e que ela precisa refletir as realidades de hoje.

"Acredito que o Artigo 9° deveria ter sido revisado muitos anos atrás", diz Yoichi Shimada, professor de Relações Internacionais na Universidade de Fukui. "As ameaças enfrentadas pelo Japão são óbvias e maiores a cada ano. Temos a Coreia do Norte á nossa porta com armas nucleares e mísseis, sem falar das armas biológicas e químicas que se acredita que o regime tenha desenvolvido.

Segundo ele, essa é a ameaça mais imediata, mas a longo prazo o maior perigo para a soberania –japonesa  como as nações em torno do Mar do Sul da China aprenderam – são as ambições territoriais de Pequim.

"A atual Constituição diz, basicamente, que temos de confiar nos nossos vizinhos, mas é irrealista pedir que confiemos na China, Coreia do Norte ou Rússia", opina o professor. "Temos de ser capazes de nos proteger."

Desafios de longo prazo

Stephen Nagy, professor de Relações Internacionais na Universidade Cristã Internacional em Tóquio, diz que, pela primeira vez, Abe possui fatores importantes a seu favor em seu intuito de mudança.

"O fator de curto prazo que preocupa os japoneses é a Coreia do Norte, que está claramente construindo uma variedade de mísseis com o potencial de lançar ogivas com armas nucleares e químicas sobre alvos japoneses", afirma.

"O desafio de longo prazo é representado pela China, que está demonstrando assertividade na região, como já vimos no Mar do Sul da China e estamos vendo no Mar do Leste", reforça o professor.

As pesquisas de opinião pública respaldam a posição de Abe, embora ainda haja grande apego à Constituição que manteve o Japão afastado de qualquer conflito durante mais de sete décadas. Para muitos japoneses, sua Carta Magna pacifista é motivo orgulho.

"Abe vem falando há alguns anos sobre a importância da aliança nipo-americana como parte da política de segurança do país, e que é necessário uma maior flexibilidade na forma como as forças militares japonesas funcionam junto a seus aliados – e que requer alterações no Artigo 9°", afirma Nagy.

"Eu não acredito que Abe queira obter o apoio para impor mudanças radicais na Constituição, mas ele será capaz de realizar as alterações que melhorem as capacidades de segurança do Japão e suas alianças", completa.