1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Entrevista

Jan M. Schäfer (sm)17 de junho de 2008

O sociólogo suíço Jean Ziegler conversa com a DW-WORLD.DE sobre o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas e critica o papel dos EUA e o estilo de liderança do secretário-geral da ONU.

https://p.dw.com/p/ELno
Ziegler: 'Para países em desenvolvimento, direitos econômicos têm prioridade absoluta'Foto: AP

Jean Ziegler, sociólogo e autor do livro O Império da Vergonha, foi relator especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para direito à alimentação. Em março de 2008, foi eleito para a comissão assessora do mesmo conselho, que está reunido em Genebra até 18 de junho.

DW-WORLD.DE: Sr. Ziegler, o Conselho de Direitos Humanos da ONU recebe críticas freqüentes, porque os países do sul estão em maioria de dois-terços em comparação com o Ocidente. Com isso, muitas propostas da Europa acabam por ser bloqueadas. O que tem que mudar?

Jean Ziegler: Na ONU, todo país tem um voto. Não há como mudar isso. Evidentemente a maioria de dois terços é um fator de poder considerável. Mas não tem nada a ver com conspiração ou coisa do gênero. É ótimo haver o Conselho de Direitos Humanos. Todos os governos importantes participam – só os Estados Unidos não. À parte disso, o órgão é bastante representativo. Os países têm trajetórias históricas, valores e interesses diversos, em parte antagônicos. A única coisa que ajuda é o diálogo. E o Conselho de Direitos Humanos é o contexto para isso.

Os Estados Unidos anunciaram que vão renunciar ao seu status de observador no Conselho de Direitos Humanos. Qual o papel dos EUA?

O Conselho de Direitos Humanos é a terceira instância mais importante na hierarquia da ONU, mas os Estados Unidos resolveram se manter totalmente à parte. Entre outras coisas, eles se oporiam a uma avaliação da situação dos direitos humanos no país. E agora eles suspenderam o montante de sua contribuição anual à ONU destinado ao Conselho de Direitos Humanos. Ou seja, também é uma espécie de represália orçamentária. Os EUA eram contra o conselho desde o início. O embaixador de Washington na ONU, John Bolton, disse que o órgão não passaria de um fardo. Desde a fundação do Conselho, há dois anos, o papel norte-americano é totalmente negativo. Mais sabotagem impossível.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, está procurando um sucessor para Louise Arbour, que se afasta no final de junho do cargo de alta comissária para Direitos Humanos. Agora os diplomatas e as organizações de direitos humanos o estão acusando de falta de transparência. Ban Ki-moon não costuma muito jogar com cartas abertas?

Juridicamente, o secretário-geral tem o direito de decidir sozinho quem nomear para o cargo de alto comissário. Ele não está violando nenhuma regra, mas sua atuação é pouco transparente. Isso é perigoso, pois falta apoio público. Psicologicamente, também não é bom. Deveria haver uma ampla consulta à sociedade civil, aos países democráticos e assim por diante. E só depois se deveria chegar ao perfil da pessoa adequada, da mesma forma como se faz numa universidade, quando surge uma vaga. Faz-se um concurso para o cargo e explica-se o que se espera do candidato.

O que o secretário-geral deveria fazer concretamente?

Ele deveria esclarecer em que direção pretendemos seguir com os direitos humanos. Os direitos políticos têm prioridade política ou econômica? Para os EUA, o Canadá, a Austrália e outros governos, não existem direitos econômicos. Conseqüentemente, não existe direito à alimentação. Isso significa que a fome no mundo só poderia ser resolvida pelo mercado. Para os países em desenvolvimento, os direitos econômicos têm prioridade absoluta, porque esses países vivem a fome, o subdesenvolvimento e a pobreza. Neste ponto, seria preciso deixar claro o que se espera do novo alto comissário, em vez de permitir – por trás de portas fechadas, no estilo do Vaticano – que se propaguem boatos.