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Justiça alemã debate direito à morte assistida

Daniel Heinrich | Mara Bierbach av
17 de abril de 2019

Especialistas em medicina paliativa e suicídio assistido e pacientes graves discordam de rígida legislação atual sobre o tema. Igreja Católica está entre os que se opõem à prestação de serviços para a morte.

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Paciente em cama de hospital
Doentes graves que recorrem à Justiça evocam direito de morrer de uma determinada formaFoto: picture-alliance/C. Ender

Logo no início de dois dias de debates sobre a morte assistida, nestas terça e quarta-feira (17/04), o presidente do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, Andreas Vosskuhle, fez questão de deixar claro que o procedimento não tratava do "julgamento moral ou político do suicídio", mas sim "exclusivamente, da constitucionalidade de uma forma concreta no direito penal, com aplicação restrita".

Uma vez que a temática da morte assistida carrega consigo alta carga emocional, faz sentido o jurista ter procurado estabelecer uma meta clara através de uma classificação objetiva, de modo a moderar as expectativas.

Os debates marcam a abertura de um processo programado para durar várias semanas, em que a corte suprema da Alemanha examinará a constitucionalidade da Lei sobre a Penalização da Promoção Comercial do Suicídio. Ela foi aprovada em novembro de 2015, após longos e polêmicos debates no Bundestag (câmara baixa do Parlamento), em que os deputados foram liberados para votar independente da linha partidária.

O objetivo da lei era que o órgão legislativo da Alemanha pudesse agir contra associações como a Sterbehilfe Deutschland, que oferecia suicídio assistido, por exemplo disponibilizando medicamentos letais. O procedimento, legal em países como a Suíça, passou a ser penalizado após a legislação de 2015.

Num total de seis casos, associações para morte assistida, especialistas em medicina paliativa e doentes graves que desejavam assistência para dar fim à vida apresentaram recurso contra a lei. Um ponto nevrálgico é o Parágrafo 217, segundo o qual: "Quem tenha a intenção de promover o suicídio de outrem, lhe ofereça, obtenha ou intermedeie a oportunidade para tal em caráter comercial [geschäftsmässig], será punido com pena de até três anos de prisão ou uma multa."

Embora todos os reclamantes considerem a regulamentação rigorosa demais, os motivos individuais de suas queixas são diversos. Médicos protestam contra o termo "geschäftsmässig", que do ponto de vista jurídico não se refere apenas a ofertas propriamente comerciais, mas sim a todas realizadas repetidamente, como conversas em que os pacientes expressam seu desejo de morrer.

Os profissionais temem ser penalizados por tratar de pacientes terminais ou consideram a morte assistida moralmente justificável, se não há saída para o sofrimento. Os doentes graves que apresentaram queixa ao Tribunal Constitucional evocam, em primeira linha, o direito da personalidade, o qual, a seu ver, incluiria o direito de morrer de uma determinada forma. As associações para morte assistida, por sua vez, queixam-se de que a legislação os impede de agir por seus afiliados.

A principal defensora do direito, por sua vez, é a Igreja Católica. O presidente do Comitê Central dos Católicos Alemães (ZdK), Thomas Sternberg, resume as ressalvas dos representantes eclesiásticos: "O respeito à autodeterminação de cada ser humano e à sua dignidade inalienável na situação existencial extrema da morte exige, além da garantia de um tratamento paliativo abrangente, também essa proibição legal."

Segundo ele, haverá consequências imprevisíveis, caso o Tribunal Constitucional dê razão aos reclamantes. Se for liberada a assistência organizada ao suicídio por associações especializados, "apelar para ela poderá se tornar normalidade social", teme.

Pessoas especialmente frágeis e enfermas precisam ser protegidas de pressões externas e internas, prossegue Sternberg. "Com a oferta de um suicídio assistido, reforça-se o sentimento de não querer ser uma carga para ninguém, mais ainda se a assistência se transforma numa opção legal e socialmente aceita." E essa tendência seria o contrário de uma concepção difundida de autodeterminação.

A Igreja conta com o apoio de políticos conservadores, como o ex-ministro da Saúde Hermann Gröhe. Mas também o presidente da Câmara Federal dos Médicos, Frank Ulrich Montgomery, é da opinião que a morte assistida como prestação de serviço deva ser proibida na Alemanha.

"Enquanto médicos, devemos ter claro que nos aproximamos do leito [do paciente] para ajudar, curar, e não para matar. Pessoas com sofrimento existencial necessitam de assistência médica e atenção humana. A medicina paliativa pode oferecer isso. A morte assistida comercial, não."

Uma sentença do Tribunal Administrativo Federal ilustra quão díspares são as visões da Lei sobre a Penalização. Em 2017, o órgão decidiu que o Instituto Federal de Medicamentos e Produtos Médicos poderia ser obrigado a fornecer medicamentos letais a requerentes incuráveis e com dores, "em caso de sofrimento extremo".

Tomando-se esse veredicto como diretriz, em situações extremas o Estado poderia estar obrigado a permitir a esses pacientes a aquisição de substâncias fatais. Nesse sentido, a decisão do Tribunal Constitucional é, literalmente, uma questão de vida ou morte.

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