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Mais do que apenas musa

6 de maio de 2012

Independente, bem educada e criativa: Luise Straus foi mais do que apenas a musa do pintor Max Ernst. Livro reúne textos de autoria da historiadora da arte, pioneira do dadaísmo e escritora, morta pelos nazistas.

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Foto: Greven Verlag/Max Ernst Museum Brühl

Paira no ar a pergunta: Será que Max Ernst teria se transformado no astro da arte moderna mesmo sem Luise Straus? Talvez sim, mas não há dúvidas de que sua ex-mulher abriu diversas portas em seu caminho. "Max Ernst era um homem que vinha da província, da pequena cidade de Brühl", conta o professor Jürgen Wilhelm, um dos organizadores do volume Eine Frau blickt sich an (Um olhar voltado para si própria, em tradução livre), publicado pela editora alemã Greven, contendo contribuições de Luise Straus a cadernos de cultura da época, bem como contos de sua autoria, datados dos anos de 1933 a 1941.

"Max se aproveitou muito do fato de que Luise conhecia a cena da arte e dos museus de Colônia. E também de que ela tinha um apartamento grande, no qual aconteciam regularmente saraus dadaístas", explica Wilhelm. Para participar destes encontros, o artista suíço Hans Arp, por exemplo, se deslocava de Zurique, onde morava, e o escritor Tristan Tzara vinha de Paris. Max e Luise se transformaram rapidamente no "casal dadaísta" da região do Rio Reno, protestando, com um comportamento provocante, contra os valores estabelecidos da época.

Luise Strauß Kunsthistorikerin Journalistin und Künstlerin
Luise Strauss quando estudante, em 1912Foto: Greven Verlag/Max Ernst Museum Brühl

"A localização privilegiada do nosso apartamento já nos colocava no centro de tudo para todos os artistas jovens, que acreditavam na reconstrução de um mundo novo, fumando infindáveis cigarros e tomando ininterruptamente chá", resumiu Straus em sua autobiografia intitulada Nomadengut (Bens nômades, em tradução livre). Enquanto vivia, ela certamente subestimou sua função como mentora da arte de seu tempo.

Uma das primeiras mulheres a concluir doutorado no país

"Lou", como era chamada pelos amigos, era para sua época uma mulher extraordinariamente independente, segura de si e com boa formação escolar. Filha de um fabricante judeu de chapéus, ela nasceu em Colônia, no ano de 1893, tendo sido uma das primeiras mulheres na Alemanha a concluir um doutorado, finalizado em 1917, em História da Arte. A seguir, passou a trabalhar como assistente no Museu Wallraf-Richartz, tendo se tornado diretora interina do mesmo em 1919.

Luise Strauß Kunsthistorikerin Journalistin und Künstlerin
Pouco depois de ter concluído seu doutorado, entre dadaístas:, no ano de 1919: Max Ernst é o segundo da esquerda para a direitaFoto: Greven Verlag/Max Ernst Museum Brühl

Max Ernst, dois anos mais velho e filho de um professor, conheceu Luise na Universidade de Bonn. Embora os pais dos dois fossem veementemente contra a união entre uma judia e um católico, Max casou-se com Luise pouco depois do fim da Primeira Guerra Mundial, em 1918. Dois anos mais tarde, nasceu Jimmy, o filho do casal. A união não perdurou por muito tempo, contudo, pois Max Ernst se apaixonou pela femme fatale Gala, mulher de seu amigo, o poeta Paul Éluard. Em 1922, ele viria a se separar subitamente de Luise, forçada a partir de então a criar sozinha o filho Jimmy.

Nos cadernos de cultura de Paris

Apesar da discriminação que sofria na condição de mãe solteira, Luise Straus conseguiu se estabelecer no decorrer dos anos seguintes como historiadora da arte, escrevendo entre outros para revistas conceituadas como Der Querschnitt. A partir de 1933, como judia sob as ameaças do regime nazista, acabou fugindo – como muitos outros intelectuais perseguidos – para Paris. Na cidade, teve que recomeçar sua carreira como escritora, pois críticas de arte do "país inimigo" eram mal vistas. Sendo assim, a emigrante Luise passou a escrever reportagens, perfis e crônicas de Paris, que são agora, muitos anos mais tarde, publicados em Eine Frau blickt sich an.

Os temas tratados por ela eram diversos: uma visita ao ateliê do arquiteto Le Corbusier, o tráfego moderno de carros, uma noite no teatro de variedades ou as peripécias do amor. Esses textos de jornal, publicados entre 1933 e 1941, são testemunhos fascinantes de uma época, pois Luise Straus era uma observadora perspicaz, capaz de enxergar para além das fachadas reluzentes da metrópole da moda e da boemia.

Com seu tato psicológico, mas não isento de humor, ela relatava acerca daqueles que, apesar de fracassados, exaustos ou desesperados, continuavam tentando a sorte na cidade. E, com boas doses de auto-ironia, ria com frequência das ilusões e da mentalidade parasita de muitos aspirantes a artistas.

Visto negado para os EUA

Mas Luise Straus parece não ter querido enxergar os riscos de sua própria situação. Em sua autobiografia, escreveu: "Fascinada pela existência clara, sem vínculos, mas no fundo completamente sem perspectivas, cometi naquela época talvez um erro. Eu deveria ter emigrado para os EUA. (...) Mas naquele momento não acreditávamos na catástrofe, não queríamos acreditar".

Luise Strauß Kunsthistorikerin Journalistin und Künstlerin
Com o filho Jimmy, em Paris, em 1935Foto: Greven Verlag/Max Ernst Museum Brühl

Quando fez estas anotações entre 1941 e 1942, já era tarde demais. Com seu novo companheiro, o fotógrafo Fritz Neugass, Luise Straus fugiu de Paris para o sul da França, mas seu pedido de visto para os EUA foi negado. Neste momento, ela negou a oferta de Max Ernst, que havia emigrado para Nova York e se disposto a se casar com ela pró-forma, a fim de possibilitar sua emigração.

Em vez disso, optou pela clandestinidade na casa do amigo Jean Giono, em Manosque, onde escreveu ardentemente sua autobiografia. Em fins de abril de 1944, foi por fim presa e, em junho do mesmo ano, deportada em um dos últimos trens de Paris para Auschwitz. Apenas cinco semanas antes dos aliados desembarcarem na Normandia.

Autora: Gisa Funck (sv)
Revisão: Francis França