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México: 200 anos

16 de setembro de 2010

Governo conduz celebrações pelos 200 anos de independência do México, mas boa parte da população não vê motivos para comemorar em função dos problemas que o país enfrenta.

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Desfile homenageou os participantes da guerra pela independênciaFoto: AP

O tradicional grito "Viva México", pronunciado pelos políticos mexicanos, relembra o chamado do padre Miguel Hidalgo y Costilla, nas primeiras horas de 16 de setembro de 1810, que deu início à luta pela independência do país domínio da coroa espanhola.

Este é um dos atos oficiais mais importantes no México, repetido anualmente tanto na capital como em outras cidades do país e até mesmo no exterior. Em 2010, ano do bicentenário da proclamação, no entanto, a lembrança da independência é motivo de um debate especial entre os mexicanos.

O governo do conservador Felipe Calderón faz o possível para manter o tom festivo da celebração, tendo até encarregado um compositor de música pop de criar um "Hino do Bicentenário", além de festejar o o dia do "grito" com concertos, desfiles e todas as pompas. As autoridades do país decretaram um feriado especial de três dias para comemorar os 200 anos de independência.

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Miguel Gregorio Antonio Ignacio Hidalgo y Costilla y Gallaga Mondarte, revolucionário mexicano

Uma grande quantidade de mexicanos, no entanto, não vê motivos para festejar. Os efeitos da crise financeira internacional ainda são sentidos pela população. Muitos atribuem a difícil situação da economia do país precisamente a atos e omissões do governo de Calderón.

Uma pesquisa de opinião revelou que 57% dos entrevistados acreditam que a situação do México hoje é pior do que em 2006, quando o atual presidente assumiu o poder. E segundo um estudo realizado pela empresa Demotecnia, 64% dos mexicanos consideram desperdício a construção de monumentos relacionados ao bicentenário da independência mexicana.

Alma Noser, especialista da Anistia Internacional em assuntos sobre o México, concorda. Em entrevista à Deutsche Welle, ela assinalou que "o governo mexicano gastará milhões de pesos em festas pomposas, com convidados de todo o mundo e personalidades da política e do universo do entretenimento".

Ao mesmo tempo, "a população festejará autenticamente nos bairros e nos lugarejos, sem a participação do Estado. Os próprios cidadãos se organizaram, como sempre. As festas populares fazem parte da cultura mexicana e não têm muito a ver com bicentenários e outros eventos oficiais".

Violência e ceticismo

Outra questão que alimenta o pessimismo entre os mexicanos é a violência do narcotráfico e a resposta do Estado ao problema: a chamada "guerra às drogas".

O caso de Chihuahua [estado no norte do México, palco de massacres e chacinas atribuídas à guerra entre os cartéis do narcotráfico] reflete esta situação. Outra pesquisa revelou que, devido à violência em Ciudad Juarez e em vários outros locais no norte mexicano, 70% da população consideram perdida a batalha do governo contra as quadrilhas do tráfico.

"Medo, histeria, rebeldia, são todos sintomas de uma sociedade desesperada que não sabe como reagir a essa violência", disse a responsável pela enquete María de las Heras ao jornal El País.

O desespero atinge o conceito que estes mexicanos têm das liberdades individuais próprias. Prova disso é que metade dos entrevistados declarou na enquete que gostaria que fosse decretado o estado de exceção em Chihuahua.

Independência e liberdade

A intervenção militar não é a panacéia que muitos esperavam. Em 5 de setembro último, soldados abriram fogo contra um veículo em que viajavam civis próximo a um posto de controle militar no estado de Nuevo León. O incidente, em que morreram um jovem de 15 anos e seu pai, causou indignação em todo o país, mas não foi o único caso de "danos colaterais" na guerra entre o governo mexicano e o crime organizado.

De fato, "a impunidade pelas violações dos direitos humanos no México é um mal endêmico e constitui uma negação do Estado de Direito", considera Alma Noser.

Gangues de criminosos "são um Estado dentro do Estado. Essas pessoas cometem massacres terríveis [como recentemente na fronteira com os Estados Unidos, causando a morte de 72 migrantes da América Central]. Muitas vezes, funcionários públicos estão envolvidos na perseguição e nos maus tratos a migrantes. Pode-se então falar de um Estado com deficiências muito graves, onde acontecem violações dos direitos humanos".

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Militar segura águia nas comemorações pelos 200 anos da independência do MéxicoFoto: AP

É verdade que o México abriu as portas a organizações de direitos humanos e que usa instrumentos legais contra a tortura, diz a especialista da Anistia Internacional. No entanto, acrescenta ela, "é um país muito dividido, altamente polarizado, com um potencial muito alto de conflitos sociais, perda de legitimidade das instituições políticas, enorme corrupção estatal, muitos conflitos eleitorais, um profundo desrespeito pelos direitos dos indígenas e um racismo chocante".

Noser prossegue, citando como problemas "a tortura, a impunidade, a falta de justiça em muitos estados mexicanos, o fracasso da política neoliberal, enormes problemas de migração e uma pobreza extrema, especialmente nos estados de forte presença indígena".

Pessoalmente, Alma Noser acredita que questões como a criação de empregos, a abolição dos tribunais militares em casos de violação dos direitos humanos por parte do Exército mexicano, ou mesmo uma legislação antidrogas, seriam presentes muito mais valiosos para a população do que festejos oficiais pelo bicentenário da independência.

Autor: Enrique López Magallón (rw)
Revisão: Soraia Vilela