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Exposição

Soraia Vilela16 de dezembro de 2008

Museu dedica exposição a casais de artistas. A interseção entre vida pública e privada, paixões avassaladoras e rupturas fatais são alguns dos temas refletidos nas obras expostas.

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Niki de Saint Phalle e Jean Tinguely: um entre os 13 casaisFoto: Jill Krementz

Lendária foi a ligação entre alguns casais na história da arte, sendo Auguste Rodin e Camille Claudel talvez o mais célebre entre eles. O Museu Wallraf-Richartz, em Colônia, rastreia as relações amorosas entre 13 casais de artistas – em sua maioria europeus – passando para isso pelo expressionismo, primitivismo russo, dadaísmo até chegar à action painting.

Ao detalhar no catálogo, nas visitas guiadas e em informações adicionais sobre as obras a trajetória afetiva desses casais, a mostra dá ao observador a "permissão" para olhar pelo buraco da fechadura sem maiores constrangimentos. Ao buscar detalhes – acima de tudo os conflitos dramáticos – dessas relações de casal, os curadores oficializam a relevância dessas vidas privadas para a evolução da história da arte.

Teria Frida Kahlo tematizado tanto a solidão, não fossem as incontáveis relações amorosas de seu então marido Diego Rivera, que teve até mesmo um caso com a irmã da artista? Teria Hannah Höch, uma das expoentes do dadaísmo em Berlim na segunda década do último século, prestado em suas colagens abstratas tamanha homenagem aos trabalhos manuais tidos como tipicamente femininos, não fossem as intempéries de sua relação amorosa com o também artista Raoul Hausmann?

Narrativas comuns

Ausstellung Künstlerpaare Wallraf-Richartz-Museum & Fondation Corboud
Frida Kahlo e Diego Rivera, em 1934Foto: Joan Munkacsi

Algumas situações recorrentes saltam aos olhos na mostra: quase que sem exceção, pelo menos um dos artistas que forma o casal vem de uma família abastada, podendo, para isso, se dedicar à arte sem maiores preocupações. E não raro sustentar o outro.

Outra "coincidência", honrosas as exceções, são as relações entre homens décadas mais velhos que as mulheres, como bem ilustra o exemplo de Rodin, que tinha nada menos que 24 anos a mais que Camille Claudel.

Várias das ligações amorosas entre os 13 casais da mostra são apresentadas através de uma narrativa melodramática: paixões avassaladoras, que pouco tempo depois acabam em rupturas bruscas, levando um dos artistas literalmente à loucura, com internações em instituições psiquiátricas e outros transtornos. Como o caso de Claudel, que após a separação de Rodin passou 29 anos internada, tendo morrido num hospital psiquiátrico em completo abandono.

Conflitos refletidos nas obras

Ausstellung Künstlerpaare im Wallraf-Richartz-Museum Köln
'A Sombra', de Auguste Rodin, e 'Sakountala ou O Abandono', de Camille ClaudelFoto: picture alliance/dpa

No caso de Rodin e Claudel, a idéia da exposição é explicitar a imagem que cada um tinha do outro, ambas refletidas em seus trabalhos: enquanto Rodin via em Claudel a fragilidade e suavidade de uma beleza melancólica, ela representava o escultor em suas obras através de traços marcantes e uma força extraordinária. O sofrimento e desespero dos conflitos entre os dois se tornam centrais para a constituição da obra tanto de um quanto do outro.

Outra peculiaridade que salta aos olhos no contexto dos artistas célebres é o fato de que alguns deles, que construíram obras comuns no decorrer de alguns anos, acabaram se casando oficialmente depois de estarem separados de fato, a fim de assegurarem a divisão justa da herança. Este foi o caso, por exemplo, de Natalia Gontcharova e Mikhail Larionov e de Niki de Saint Phalle e Jean Tinguely.

Para além dos fragmentos do discurso amoroso

Mais consistente, contudo, que uma exposição que registra as idas e vindas dos casais de artistas teria sido talvez uma mostra que abandonasse os limites das artes plásticas para adentrar o terreno do discurso amoroso entre escritores e intelectuais do século 20.

Exemplos de interseção entre vida e obra certamente não faltariam: a começar pela estranha ligação entre a filósofa Hannah Arendt, obrigada a fugir da Alemanha nazista por ser judia, e seu então professor Martin Heidegger, acusado de colaboração com o regime de Hitler. Mesmo após o fim da Segunda Guerra, Arendt, vivendo nos EUA, manteve uma estreita correspondência com Heidegger.

Ausstellung Künstlerpaare Wallraf-Richartz-Museum & Fondation Corboud
Frida Kahlo, 'Diego e Frida 1929-1944' (I) ou 'Retrato duplo Diego e Eu' (I), 1944Foto: VG Bild-Kunst

Entre outros casais cuja relação foi relevante para a produção intelectual estão Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre, Lou Andreas-Salomé e Rainer Maria Rilke, Ingeborg Bachmann e Paul Celan ou Anaïs Nin e Henry Miller, além dos homossexuais Arthur Rimbaud e Paul Verlaine ou Jean Cocteau e Jean Marais.

Uma mostra que estabelecesse as relações entre altos e baixos e encontros e rupturas refletidos nas obras de autores como esses talvez conseguisse mais do que simplesmente aguçar o voyeurismo em relação à vida privada de nomes célebres da história da arte.

A mostra Casais de Artistas. Amor, Arte e Paixão pode ser vista no Museu Wallraf-Richartz, em Colônia, até o dia 8 de fevereiro de 2009.