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Barreira à imigração

3 de setembro de 2009

União Europeia se torna fortaleza contra imigração ilegal. Há críticas sobre o tratamento que alguns países-membros dispensam aos estrangeiros. DW-WORLD conversou com a Cruz Vermelha sobre a situação nas Ilhas Canárias.

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Mais de 8 mil imigrantes foram resgatados na costa das Ilhas Canárias em 2008Foto: picture-alliance/dpa

Para cruzar o mar, eles chegam a pagar 3 mil euros: uma fortuna na África. Muitas vezes, um vilarejo inteiro poupa dinheiro para que uma pessoa consiga chegar à "terra rica". Quanto menor o custo da viagem, mais pessoas entram no barco, e maior se torna o perigo.

Manuel Sánchez sabe de muitas histórias tristes: ele é o responsável pelas Equipes de Resposta Imediata em Emergência da Cruz Vermelha nas Ilhas Canárias, que, pela proximidade com o continente africano, é um dos principais pontos de entrada de imigrantes ilegais na Europa. A União Europeia se esforça para bloquear suas fronteiras, nas quais homens como Sánchez trabalham diariamente.

DW-WORLD: Nos últimos tempos se tem ouvido muitas críticas, por exemplo, à política migratória da Itália. Sobre a Espanha se ouve menos. Por quê?

Manuel Sánchez: Os espanhóis, e sobretudo os canários, que estão vivendo essa situação de uma forma muito particular, foram imigrantes não faz muito tempo. Eles também tiveram que deixar sua terra por motivos econômicos e isso faz com que, de alguma maneira, eles compreendam e se identifiquem com o destino dessas pessoas.

Como é a assistência oferecida aos imigrantes que chegam à costa das Ilhas Canárias?

Nosso primeiro objetivo é salvar vidas. Se localizamos um barco na água, o principal é, com nossos próprios meios ou com os do Salvamento Marítimo, garantir que a tripulação alcance a costa sã e salva. Uma vez em terra, os imigrantes recebem serviços sanitários, de alimentação e abrigo. Quando todos estão em boas condições, aí ficam sob tutela das forças de segurança.

E a partir desse momento eles ficam a cargo da polícia…

Sim. O que acontece é que algumas dessas pessoas, uma vez detidas e à disposição judicial, são enviadas para Centros de Internamento. Nos CIs, a Cruz Vermelha colabora por meio de psicólogos, assistentes sociais, intérpretes, e continua com o tratamento médico e sanitário.

Flüchtlinge aus Afrika auf dem Weg nach Teneriffa Spanien
Vilas inteiras juntam dinheiro para que uma pessoa tente entrar na EuropaFoto: AP

Esses Centros de Internamento, como o que existe na ilha italiana de Lampedusa, também têm sido objeto de muitas críticas. Qual é a situação na Espanha?

Nos Centros de Internamento, as diferentes administrações tentam prestar a melhor ajuda e o melhor serviço nas melhores condições possíveis, e na Cruz Vermelha tratamos de contribuir também com o que podemos.

As melhores condições possíveis são também condições dignas?

A intenção é que sejam dignas. Mas tentar julgar a situação concreta de cada centro é algo que foge às nossas possibilidades.

Mas vocês têm acesso a esses centros e sabem se neles se tratam bem os imigrantes ou não…

Posso dizer que nós nunca tivemos nenhum problema. Ao contrário: as forças de segurança e o pessoal da administração têm feito sempre tudo o que está em suas mãos para nos apoiar no trabalho com os imigrantes.

A União Europeia tem apresentado, já há muitos anos, medidas contra a imigração ilegal. Quase sempre são fundos destinados a financiar repatriações, programas de treinamento para a guarda costeira ou criação de patrulhas navais comuns. Essa é a política correta?

Para poder ajudar os imigrantes, a Cruz Vermelha recebe contribuições financeiras e logísticas do governo espanhol e da União Europeia. Nós, que realizamos o trabalho na praia e de atenção continuada aos imigrantes em terra firme, não poderíamos fazer nosso trabalho sem esses recursos.

Mas se pode combater a imigração ilegal simplesmente com o chamado "bloqueio de fronteiras"?

Os movimentos migratórios são inevitáveis. O ser humano migra para melhorar suas condições de vida. A partir de diferentes administrações se está levando a cabo um trabalho notável: existem importantes projetos europeus em curso, tanto nos pontos de chegada quanto de partida. Mas a imigração é algo natural que vai continuar.

Quantos imigrantes chegam por ano às Ilhas Canárias?

Em 2008 foram mais de 8 mil, e de janeiro até agora já foram 1.839. Houve uma redução de quase 70%, mas é preciso destacar que o número de pessoas desaparecidas no mar é desconhecido.

Immigrant auf den Kanarischen Inseln
Cruz Vermelha oferece apoio psicológico a imigrantes que serão repatriadosFoto: AP

Uma queda de 70% é bastante significativa. A que ela se deve?

As causas são múltiplas. Uma delas é o sistema de controle de fronteiras, que está salvando muitas vidas ao evitar que essas pessoas se lancem ao mar por países como a Mauritânia, mas ao mesmo tempo isso está provocando um aumento da imigração através do norte da África, com o objetivo de entrar na Europa pelo sul do continente.

Também conta o fato de que nos últimos tempos o governo espanhol tem realizado um importante esforço diplomático, e hoje existem tratados de cooperação com quase todos os países emissores de migrantes. O percentual de repatriações é bastante elevado, e isso faz com que algumas pessoas desistam da viagem. Além do mais, há a influência do trabalho informativo que se desenvolve nos países de origem, e também da crise econômica.

Tudo isso não significa que o problema da imigração diminuiu. Sabemos que está se concentrando um grande contingente para "dar o salto". As pessoas na África querem viver melhor, e a Europa para elas é sinônimo de uma vida melhor.

O que os imigrantes esperam encontrar na Europa?

Eles acreditam que a primeira coisa que vão encontrar ao chegar é um emprego, com o qual pretendem juntar dinheiro para enviar aos familiares e vizinhos que os ajudaram a pagar a viagem. Nos custa muito explicar que, sem uma permissão de trabalho, eles não têm como arranjar emprego. Quando estão aqui já há alguns dias, começam a se dar conta de onde estão, de qual é a situação e de que provavelmente serão enviados de volta aos seus países.

Deve ser muito duro…

Sim, o golpe emocional é tremendo, por isso trabalhamos com psicólogos. Essas pessoas que viveram o estresse de cruzar um deserto durante meses e atravessar o mar durante dias chegam em terra e se dão conta de que todo o esforço, todas as ilusões, tudo o que haviam lhes dito e todo o dinheiro que sua família e seu vilarejo receberiam, tudo isso se perdeu no caminho.

Autora: Luna Bolívar Manaut/FF
Revisão: Roselaine Wandscheer