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Não há solução mágica para os problemas da Tunísia, diz presidente

Sarah Mersch (ca)21 de março de 2013

Dois anos após revolução, país enfrenta série de desafios enquanto tenta consolidar democracia. Em entrevista à DW, Marzouki fala em "extremismo secular e religioso" e diz que maior barreira ao avanço é psicológica.

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Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images

Berço da Primavera Árabe, a Tunísia conseguiu pôr fim às mais de duas décadas de ditadura de Zine el-Abidine Ben Ali, mas mergulhou numa depressão econômica e num turbilhão político. Hoje, pouco mais de dois anos após a queda do ditador, o país está mais livre, mas ainda engatinha como democracia, tropeça numa série de problemas estruturais e tenta se equilibrar entre islamismo e secularismo.

Para o presidente Moncef Ben Mohamed Bedoui-Marzouki, eleito em dezembro, não há mágica e um dos principais desafios é vencer a barreira psicológica. Em entrevista à Deutsche Welle antes de uma visita à Alemanha, ele diz que o erro dos tunisianos é acreditar que os problemas simplesmente desaparecem após uma revolução: "Antes tínhamos os problemas de uma ditadura, hoje temos os problemas de uma democracia."

Deutsche Welle: O senhor sempre se engajou pela unidade e moderação entre as diferentes forças políticas. Essa estratégia ainda é justificável na Tunísia, mesmo após a morte do político oposicionista Chokri Belaid?

Moncef Marzouki: Claro, agora mais do que nunca. Porque, se este país pretende resolver seus problemas socioeconômicos, então precisa de estabilidade política. Eu quero que nós encontremos um consenso com vista à Constituição e ao governo. Nós precisamos de uma mensagem conciliadora para pacificar o país, de modo que a transição para a democracia tenha continuidade.

A Tunísia ainda não superou a crise – como deverá ser a formação do novo governo sob a liderança do primeiro-ministro Ali Larayedh?

Temos os problemas de um país que acaba de passar por uma revolução e que está ocupado, no momento, com a construção de estruturas democráticas. Comparado a outros países, vemos uma diferença muito clara: Portugal precisou de oito anos para a democratização; os espanhóis, três anos; nós o faremos em dois. A Tunísia passou por crise políticas, mas o país sempre se manteve estável. Acredito que estamos indo muito bem.

Demonstrationen in Tunis am 16.03.2013
Tunisianos protestam em prol do fim do governo islâmico na TunísiaFoto: Reuters

Que setores estão funcionando bem?

Dois anos atrás, ainda havia uma ditadura aqui, sem liberdade de expressão, sem liberdade de manifestação, sem a possibilidade de criação de organizações sem fins lucrativos. Conseguimos chegar a essa liberdade agora. A mídia reclama o dia todo sobre o governo e o presidente. Mais de mil ONGs e mais de cem partidos foram criados. Quanto a isso, a transição está completa. No plano socioeconômico, estamos atrasados, porque tivemos de constatar que a situação é pior do que pensávamos.

Estamos trabalhando, mas não temos uma varinha mágica. Além disso, estamos reconstruindo as instituições do Estado. Estamos tomando o tempo necessário para que os órgãos regulatórios da mídia, a autoridade eleitoral e a lei da independência do Poder Judiciário se baseiem num consenso o mais amplo possível. Trata-se de um trabalho longo, complexo e frustrante. Embora percamos uma quantidade impressionante de tempo e energia, esse é o verdadeiro processo de aprendizagem da democracia.

O senhor enfatiza que a revolta na Tunísia teve principalmente razões sociais e econômicas, mas quando se acompanha os debates na Assembleia Constituinte e na mídia, trata-se principalmente de questões de identidade.

Existem dois tipos de extremismo na Tunísia: o religioso e o secular. À primeira categoria pertence o salafismo, que é somente uma fachada de um problema social. O empobrecido proletariado se volta contra o Ennahda, que se considera um partido islamista burguês. Por outro lado, há os extremistas seculares, que tremem de raiva só de ouvir a palavra "islã". Para a maioria dos tunisianos, as principais questões são comida, água, eletricidade e desenvolvimento econômico.

Recentemente, perante o Parlamento Europeu, o senhor disse que o período pós-revolucionário é mais difícil que a própria revolução. Qual é o maior desafio?

É um desafio psicológico. As pessoas acham que os problemas simplesmente desaparecem após uma revolução. Mas eles apenas mudam: antes tínhamos os problemas de uma ditadura, hoje temos os problemas de uma democracia. É claro que há resultados concretos e imediatos da democracia: o fato de as pessoas não terem mais medo é algo sensacional. Mas principalmente as expectativas econômicas são tão grandes que acabam em decepções. As exigências de que a corrupção desaparecesse do dia para a noite e de que todos conseguissem um posto de trabalho é, no entanto, impossível de realizar.

Chokri Belaid Oppositionsführer Tunis Tunesien Ermordung Protest
Líder oposicionista Chokri Belaid foi assassinado em fevereiroFoto: Reuters

Muitos países da União Europeia (UE) apoiaram durante muito tempo o antigo presidente Ben Ali., Hoje a UE apoia o novo governo, mas critica o fortalecimento dos islamistas. Para o senhor, a Europa é um parceiro confiável?

A UE é nosso principal parceiro e queremos que continue assim. É verdade que muitos europeus não fazem diferenciação entre islamista e terrorista. Eles terão de mudar essa opinião e aprender, que há diferentes tipos de islamistas. Da mesma forma que os democrata-cristãos na Europa, também haverá por aqui islamistas democráticos, que são conservadores, mas que ao mesmo tempo respeitam a democracia.