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Novo Papa herda 1,2 bilhão de fiéis e um sem-número de problemas

12 de março de 2013

Enquanto contorna imbróglios externos, Pontífice terá que lidar com queda do contingente de católicos e enfrentar temas delicados como aborto, união gay e relação com outras religiões – de forma diferente de Bento 16.

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Foto: Reuters

Se a primeira grande viagem do novo Papa for mesmo ao Rio de Janeiro, ele estará ali, durante a Jornada Mundial da Juventude, diante de um exemplo concreto de seus desafios futuros. O estado é o primeiro do Brasil onde os católicos já não são mais a maioria, clara tendência num mundo cada vez mais secularizado e um reflexo da que talvez seja a maior crise da história da Igreja.

O 226º sucessor de São Pedro herdará 1,2 bilhão de fiéis e um sem-número de problemas. Terá que ter mão de ferro para lidar com as questões internas, mas, ao mesmo tempo, ser carismático, capaz de falar a língua do povo, estar ao lado dos pobres e, sobretudo, esforçar-se para devolver ao Vaticano a influência e o prestígio de outrora.

A queda no número de fiéis não é exclusividade do Rio, onde, entre 1940 e 2010, a proporção de católicos despencou de 91% para 46%. Na América Latina, que concentra 41% dos católicos do mundo, a quantidade de adeptos também está em queda, assim como na Europa. O Velho Continente está cada vez mais secular, fenômeno que, aliado à crescente migração de muçulmanos do Norte da África, ajuda a tirar espaço do catolicismo.

O problema já chamara a atenção de Bento 16, que criou um departamento (dicastério) exclusivo para a nova evangelização e convocou para ele um sínodo de bispos. Ao novo Papa, caberá canalizar as propostas apresentadas, entre elas o estabelecimento de uma catequese adequada e a aplicação de novas linguagens para atrair fiéis, sobretudo os mais jovens.

"O grande desafio para a Igreja talvez não venha de fora. Na América Latina, por exemplo, o maior desafio é como a fé é celebrada, como ela é vivida, comunicada e evangelizada", admitiu recentemente Guzman Carriquiry, secretário-geral da Pontifícia Comissão para a América Latina.

Pedofilia no centro das preocupações

Ao mesmo tempo em que, internamente, terá que reformar a Cúria, tornar o Estado vaticano mais eficiente e limpar a sujeira exposta pelo Vatileaks, o novo Pontífice precisará lidar com questões externas delicadas. Entre elas, o diálogo com outras religiões, o papel da mulher na Igreja, a postura oficial sobre a bioética, além, naturalmente, do aborto, do casamento gay e dos escândalos de pedofilia.

Tudo isso demandará unidade – um desafio numa Igreja que se viu minada nos últimos anos por rixas políticas internas. "São Pedro nos ensinou que cada um de nós precisa trabalhar para construir a unidade da Igreja", disse nesta terça-feira (12/03) o cardeal decano, Angelo Sodano, antes do início do conclave. "Todos nós estamos convocados a cooperar com os pastores, em especial com o sucessor de São Pedro, para obter a união na Igreja Católica."

Vatikan Papstwahl 2013
Lidar com perda de fiéis é desafio para Igreja CatólicaFoto: JOHANNES EISELE/AFP/Getty Images

As reuniões que antecederam o conclave foram a portas fechadas, mas, a julgar pelo que foi filtrado pela imprensa italiana, no centro das preocupações dos cardeais está a pedofilia. Durante décadas, como disse o próprio Bento 16, a Igreja praticou um "silêncio cúmplice", mas agora está tendo que lidar com escândalos em série. O novo Bispo de Roma precisará não só lidar com questões legais, mas também superar as alas mais conservadoras dentro da Santa Sé, que defendem a adoção de uma linha dura e não admitem publicamente a má-conduta dos padres.

"Todos cometemos erros. Às vezes não compreendemos completamente a gravidade de certas situações", reconheceu na semana passada o cardeal norte-americano Theodore Edgar McCarrick, de 82 anos.

Papel da mulher em pauta

A pedofilia é o escândalo de maior repercussão, mas poucas questões dividem tanto a Igreja – ou a deixam tão vulnerável a críticas – como a postura sobre o aborto e a camisinha. Em sua primeira viagem à África, onde há mais de 22 milhões de contaminados com o vírus HIV, Bento 16 causou indignação ao dizer que distribuir preservativos "agrava o problema". Depois, teve que modificar sua postura e dizer que preservativos eram aceitáveis "em certos casos".

Ao sucessor de Joseph Ratzinger caberá também contornar a questão do casamento gay sem perder mais fiéis. Na contramão dos países europeus e alguns estados norte-americanos, que estão legalizando a união entre pessoas do mesmo sexo, Bento 16 declarou que o casamento homossexual destrói "a essência da criatura humana".

Vatikan Papst Nachfolge
Igreja terá que abrir diálogo com outras religiõesFoto: REUTERS

O novo Pontífice terá ainda que rever o papel da mulher. Um sacerdócio feminino parece, pelo menos a médio prazo, totalmente fora de questão, mas muitas exigem uma maior participação nas tarefas da paróquia, da mesma forma que alguns laicos.

Em pauta também terá que estar o diálogo com outras religiões. Bento 16 estendeu algumas pontes, mas o Vaticano ainda terá que aprender como melhorar as relações com o islã sem gerar preocupações no Ocidente e com os judeus. Essas relações estão ainda mais complicadas depois da decisão de pôr a caminho da santificação o papa Pio 12, criticado por seu papel durante o Holocausto.

Mais do que um passado impecável, o novo Papa terá que ter habilidade para se equilibrar entre as demandas externas e internas que o cargo impõe. E precisará ser rápido e eficiente para lidar com todos os desafios que Bento 16 não sentiu forças para enfrentar, optando, assim, por renunciar.

Autor: Rafael Plaisant Roldão
Revisão: Augusto Valente