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O Brasil pode lucrar com o protecionismo de Trump?

Fernando Caulyt
30 de janeiro de 2017

Saída americana do maior acordo comercial do mundo, o TPP, pode ser positiva para agronegócio. Mas especialistas são céticos de que política do novo governo dos EUA possa, de forma geral, beneficiar economia brasileira.

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Symbolbild Wirtschaft in Brasilien
Plantação de soja em Mato Grosso: saída americana do TTP pode resultar em benefícios pontuais para o agronegócio Foto: picture alliance/dpa/R. Pera

O que é, afinal, protecionismo?

O discurso protecionista de Donald Trump tem causado apreensão entre parceiros comerciais dos Estados Unidos. Mas se potências como a Chinapodem ver, com isso, novas portas se abrindo, o Brasil, segundo especialistas, tem pouco a lucrar a curto e médio prazo.

Desde que chegou à Casa Branca, Trump retirou os EUA do Tratado Transpacífico (TTP), maior acordo comercial da história, que engloba 12 países, e prometeu renegociar o Nafta, o pacto de livre-comércio dos americanos com México e Canadá.

A não adesão americana ao TTP, em específico, pode resultar em benefícios pontuais para o agronegócio brasileiro, que deixará de perder mercado para as commodities dos EUA que entrariam nos países signatários com tarifas diferenciadas.

"Hoje, brasileiros e americanos vendem para os países signatários produtos do agronegócio. Mas, com o TPP, basicamente só os EUA passariam a vender”, afirma José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). "A revogação fez com que o Brasil deixasse de perder os mercados que tem hoje.”

O acordo de livre-comércio eliminaria grande parte das barreiras comerciais entre Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Cingapura, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Vietnã e os EUA. O TTP era um meio de os americanos aumentarem sua influência na região Ásia-Pacífico. O primeiro objetivo era isolar comercialmente a China e, o segundo, criar uma reserva de mercado para os produtos dos EUA, especialmente do agronegócio.

Os benefícios para o Brasil, afirmam especialistas, param por aí. A renegociação ou o fim do Nafta como é hoje poderá trazer prejuízos ao Brasil.  Os mexicanos teriam que olhar para outros mercados e, seus produtos, principalmente do agronegócio, disputariam diretamente com os brasileiros.

Para Marcos Troyjo, diretor do BricLab da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, há também uma ampla de produtos industriais em que os mexicanos são mais competitivos que o Brasil.

"Isso tem a ver com o acesso aos mercados e às dezenas de acordos preferenciais que o México logrou mesmo depois de ter negociado o Nafta”, diz Troyjo. "Mas outros fatores, como menor carga tributária, legislação trabalhista menos restritiva, enfim, um melhor ambiente de negócios também pesam muito em benefício dos mexicanos.”

De forma geral, o protecionismo americano não traria nenhum benefício a médio e longo prazo para o Brasil, segundo o economista Mauro Rochlin, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). "Ter um mercado americano mais aberto seria muito mais vantajoso aos brasileiros em termos gerais do que o país ser beneficiado no comércio com o Pacífico”, afirma.

Tendência de distanciamento

Para Castro, da AEB, o Brasil não tem razão para ser atingido por nenhuma medida protecionista de Trump por ter uma participação pequena no comércio bilateral e ter déficit na balança comercial com os EUA – em 2016, foi de 646 milhões de dólares e, em 2015, de 2,4 bilhões de dólares. O déficit comercial teve uma queda considerável devido à recessão do país, que diminuiu as importações de produtos americanos.

"O país estava avançando, a passos lentos, na costura de um acordo comercial bilateral com os EUA – que é a preferência de Trump em vez dos tratados regionais e multilaterais”, diz Castro. "A longo prazo, o protecionismo pode dificultar as relações com o Brasil, a menos que os EUA fechem um acordo bilateral positivo com o país – algo que, por não estar entre as prioridades de Trump neste momento, não seria imediato.”

Por outro lado, Troyjo diz que a conjuntura nos EUA não convida a maiores aproximações com o Brasil, seja para aumento ou diminuição dos fluxos comerciais. Segundo ele, a não ser que ocorra uma inflexão da linha de política externa apontada por Trump durante a campanha, os EUA estarão muito voltados a si próprios.

"E isso não é uma boa notícia para o Brasil, que precisa muito do vigor das exportações para retomar o crescimento econômico”, explica o especialista, da Universidade de Columbia. "Assim, fica mais difícil utilizar o comércio exterior como trampolim do crescimento do PIB brasileiro se o maior mercado do mundo está encoberto por uma densa névoa protecionista.”

As medidas que Trump vêm adotando estão fazendo a moeda americana se valorizar em relação às de outros países. Com o dólar forte, exportar produtos para os EUA é mais barato, e importar fica mais caro. Assim, os EUA vão acabar atraindo mais nações que querem vender para o mercado americano, e os americanos vão perder a competitividade na exportação de seus produtos quanto ao aspecto preço.

"O problema do Brasil são os custos. Mesmo que eventualmente sejam adotadas medidas protecionistas contra a China, México e outros países e isso abra espaço para a colocação do produto brasileiro no exterior, o nosso problema é que, hoje, não temos custos competitivos”, opina Castro. "O problema não é necessariamente de mercado externo. Por isso, o país precisa fazer reformas estruturais para reduzir custos e, assim, inserir de forma competitiva seus produtos em outros mercados.”