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O dilema de aplicar sanções econômicas à Venezuela

Alexandre Schossler | José Ospina-Valencia
1 de agosto de 2017

Projeto de Maduro para mudar Constituição recebeu ampla condenação internacional. Mas sancionar a indústria petrolífera é medida arriscada: efeitos seriam sentidos sobretudo pela população, e não pela elite política.

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Nicolás Maduro discursa para apoiadores em Caracas
Nicolás Maduro discursa para apoiadores em CaracasFoto: picture-alliance/dpa/M. Quintero

A reação do presidente Nicolás Maduro à inclusão de seu nome na lista de líderes sancionados pelos Estados Unidos, após a eleição de uma Assembleia Nacional para mudar a Constituição, não poderia ser mais expressiva da impotência de muitos países diante dos rumos da Venezuela.

Maduro disse estar "orgulhoso" das represálias e acrescentou que o presidente Donald Trump está cometendo "o maior erro de sua vida" ao se meter com a Venezuela. "Eu não recebo ordens do imperialismo, não recebo ordens de governos estrangeiros", afirmou Maduro, chamando Trump de "imperador" e afirmando que a "Ku Klux Klan está no poder na Casa Branca".

Nesta segunda-feira (31/07), os EUA tacharam Maduro de ditador e o colocaram num grupo seleto de governantes sancionados, ao lado dos líderes da Síria, Bashar al-Assad, da Coreia do Norte, Kim Jong-un, e do Zimbábue, Robert Mugabe.

A indiferença de Maduro dá a medida do dilema em que a comunidade internacional se encontra. Cada vez mais observadores afirmam que a Venezuela está deixando a passos largos a democracia para se tornar uma ditadura. E a cobrança por sanções econômicas aumenta, principalmente sobre os Estados Unidos e a União Europeia (UE), que, ao lado da China, são os principais parceiros comerciais do país sul-americano. Mas retaliações são mesmo a melhor solução?

Dependência dos EUA

A UE é o terceiro parceiro comercial da Venezuela, com importações no valor de 1,3 bilhão de euros em 2016, e os investimentos europeus representam um terço dos investimentos estrangeiros no país. Já os Estados Unidos adquiriram mercadorias no valor de 10,9 bilhões de dólares em 2016, dos quais 10 bilhões são petróleo. Os EUA compram cerca de 40% da produção do país sul-americano. Isso equivale a 750 mil barris diários de petróleo bruto. Ao mesmo tempo, os EUA dependem hoje bem menos de importações de petróleo graças à expansão da produção própria, com base no fracking.

Já para Caracas, as vendas de petróleo para os Estados Unidos são fundamentais, pois são praticamente as únicas que geram caixa. Segundo cálculos do professor de políticas energéticas Francisco Monaldi, da Universidade Rice do Texas, o restante da produção abastece o mercado interno, é usado para pagar dívidas com a China ou a Rússia ou é enviado, com subsídios, a Cuba.

Como resultado, sobram "uns 800 mil barris que geram caixa e que, em sua maioria, vão para o mercado americano", afirmou Monaldi à agência de notícias Efe. Diante dessa dependência, eventuais sanções dos Estados Unidos à indústria petrolífera venezuelana ou mesmo um bloqueio econômico teriam um efeito devastador sobre a economia do país latino.

Sanções à indústria petrolífera?

A expectativa, portanto, recai principalmente sobre os americanos. Por que, então, não usar essa situação para pressionar o governo de Maduro, que já enfrenta enormes dificuldades econômicas para garantir comida e medicamentos à população. "É complicado", avalia o especialista em política energética David L. Goldwyn, em declarações ao jornal The New York Times.

Na opinião dele, e também de muitos analistas internacionais, sancionar a indústria petrolífera venezuelana é uma medida arriscada e cujos efeitos seriam sentidos sobretudo pela população, e não pela elite política do país. "Esta é uma estratégia de risco muito elevado com um presidente como Maduro", afirmou a professora de políticas públicas Jill Kasle, da Universidade George Washington, ao jornal argentino Clarín. "Essas sanções prejudicariam mais a população do que os líderes."

Essa é também a interpretação feita na União Europeia. Bruxelas já disse que não descarta sanções, mas a questão é definir quais. O ministro das Relações Exteriores da Espanha, Alfonso Dastis, descartou restrições econômicas porque, segundo ele, elas afetam a população e não os responsáveis pela situação. Por isso, ele defendeu medidas "individuais, seletivas e específicas".

Ao elevar ainda mais as já enormes dificuldades enfrentadas pela população, sanções que afetem diretamente a economia venezuelana poderiam resultar em mais violência nas ruas, uma crise de refugiados em países vizinhos e até mesmo num golpe militar, avaliam analistas.

Elas poderiam também ter efeitos negativos nos próprios Estados Unidos, como argumentou a associação americana dos produtores de combustíveis e petroquímicos, em carta ao governo. Ela advertiu para uma possível alta dos preços para os consumidores. E especialistas em energia dizem que a Venezuela poderia substituir os EUA por China e Índia como principais compradores.

Nova Cuba?

Sanções econômicas também elevariam a solidariedade a Maduro entre os países vizinhos e dariam credibilidade ao discurso de vítima do imperialismo que é parte constituinte do chavismo e que, na versão do governo, sempre foi a explicação para as dificuldades econômicas enfrentadas pelo país.

Como afirmou o analista colombiano Roberto Cajamarca, sanções à indústria petrolífera venezuelana só aumentariam a carestia e o desabastecimento, sem garantia alguma de que Maduro cairia, e "poderiam ser usadas por Maduro para se consolidar no poder e usar um discurso de vitimização". Como exemplo, ele aponta para a ditadura dos Castro em Cuba.

Segundo ele, o mais difícil é justamente alcançar um ponto de equilíbrio na hora de lidar com a Venezuela. "Por um lado, é importante intensificar a pressão sobre Maduro para fazê-lo aceitar uma negociação que permita uma transição. Por outro, as sanções não podem ser tão drásticas que afetem o povo venezuelano", explicou, em entrevista à DW.