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O renascimento do uísque irlandês

Arthur Sullivan ip
15 de abril de 2019

A "água da vida" voltou a fluir no país que já foi o seu maior produtor mundial. Depois do forte declínio, produção ganhou força nos últimos dez anos, impulsionada por uma nova geração e investimentos externos.

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Chris Hayes, da Teeling Whiskey Distillery. Inaugurada em 2015, ela foi a primeira nova destilaria de Dublin em 125 anos
Chris Hayes, da Teeling Whiskey. Inaugurada em 2015, ela foi a primeira nova destilaria de Dublin em 125 anosFoto: DW/A. Sullivan

A primeira coisa que uma pessoa sente quando entra na destilaria Teeling Whiskey, no distrito de Liberties, em Dublin, é o rico aroma – diferente, mas difícil de definir.

"Isso vem dos fermentadores", explica o brand embassador Chris Hayes quando entra na área de visitação do que se tornou, em 2015, a primeira destilaria de uísque a ser inaugurada em Dublin em 125 anos.

"O cheiro é diferente a depender de qual tipo de uísque está sendo feito no dia em que você vier aqui. E ele é tão distinto porque vem dali, logo ali trás", diz Hayes, apontando para uma parede que separa o local da sala de fermentação e destilação.

Dublin já foi a capital mundial do uísque, uma bebida que deve o seu nome a um anglicismo da expressão em irlandês uisce beatha, ou "água da vida". Durante o seu apogeu, no século 19, o uísque irlandês representava cerca de 60% do consumo global. A maior parte era feita em Dublin, onde as maiores destilarias do mundo estavam situadas.

No entanto, a partir do final do século 19, o uísque irlandês entrou num período de franco declínio. Na década de 1960, sobraram apenas algumas poucas destilarias em operação na Irlanda, e elas logo se consolidaram no grupo Irish Distillers, uma decisão que evitou o fim do uísque irlandês.

Na década de 1970, a destilação de uísque em Dublin havia cessado completamente, e a produção anual era de menos de 400 mil caixas (4,8 milhões de garrafas) por ano, abaixo do pico de cerca de 12 milhões de caixas (144 milhões de garrafas) na virada do século 20.

William Lavelle, chefe da Irish Whiskey Association, na Jameson Distillery em Dublin, Irlanda
William Lavelle, chefe da Irish Whiskey Association: "O que aconteceu foi fenomenal"Foto: DW/A. Sullivan

A partir dos anos 1980, as vendas de uísque irlandês se recuperaram fortemente, impulsionadas por grandes investimentos estrangeiros, como os da empresa de bebidas francesa Pernod Ricard (que assumiu a Irish Distillers em 1988). Mas só nos últimos anos o uísque irlandês passou a experimentar um renascimento.

"O que aconteceu na década atual foi fenomenal", comenta William Lavelle, diretor da Associação de Whisky Irlandesa, no local da antiga Destilaria Jameson, no centro da cidade de Dublin.

"Em termos de destilarias, passamos de quatro no início da década em 2010 para 24. Da mesma forma, se olharmos para as vendas, foram 6 milhões de caixas no início da década, e a indústria irá provavelmente dobrar esse montante para 12,5 milhões até o final de 2020. É realmente a década do renascimento do uísque irlandês", avaliou.

Os números são mesmo impressionantes. Há vários anos que o uísque irlandês é o destilado envelhecido de mais rápida expansão no mundo, aumentando gradualmente sua participação global, que atualmente é de cerca de 5%. A demanda global por uísque também está crescendo em velocidade acelerada.

O bourbon americano e o uísque escocês detêm a maior participação maior no mercado geral, mas o uísque irlandês tem crescido a um ritmo bem mais veloz. Em 2017, as vendas de uísque irlandês cresceram mais de 10% em relação ao ano anterior.

Ainda mais impressionante é o número de novas destilarias que surgiram em Dublin e em todo o país. Além do aumento observado desde 2010, estão mais 20 para os próximos anos.

A inauguração da Destilaria Teeling, há quatro anos, foi um momento significativo. Os fundadores, Stephen e Jack Teeling, vêm de uma família com experiência em destilaria (o pai, John, fundou a Cooley Distillery em County Louth em 1987), mas os altos custos iniciais, o fato de levar no mínimo três anos para que um novo uísque possa ser vendido e o fato de que fazia mais de um século que nenhuma destilaria era inaugurada em Dublin mostram que a decisão foi ousada.

Uísque Vintage Reserve, da Teeling
Vintage Reserve, que ganhou prêmio de melhor puro malte do mundoFoto: DW/A. Sullivan

O investimento valeu a pena. No mês passado, o Vintage Reserve de 24 anos da marca (oriundo da antiga Cooley Distillery) ganhou o prêmio de melhor puro malte do mundo no World Whiskeys Awards e, no final de 2018, Teeling começou a vender garrafas do primeiro uísque destilado em Dublin em mais de 40 anos.

Hayes diz que a Teeling faz parte de uma onda de novas marcas de uísque irlandesas que as pessoas estão dispostas a experimentar à medida em que se tornam conscientes dos novos estilos e sabores do uísque irlandês.

"Antigamente as pessoas se fixavam em uma ou duas marcas de uísque irlandês, e hoje elas estão dispostas a experimentar um pouco mais e provar coisas novas", afirma. "Antes, elas tinham uma imagem do uísque irlandês, e agora estão descobrindo que há muitos tipos e marcas diferentes para escolher."

Para Lavelle, há várias razões por trás do renascimento. Uma é o nível de investimento feito nos últimos 30 anos por multinacionais estrangeiras, como a Pernod Ricard, que criou "supermarcas" de uísque irlandês, como Jameson, hoje um dos uísques mais vendidos no mundo.

Ele também destaca a bravura e o espírito empreendedor de pequenas destiladoras, como a Teeling, por abraçarem o uísque irlandês e estarem dispostas a se engajar na destilação em menor escala, que muitas pessoas pensavam que jamais voltaria à Irlanda.

Outro fator importante é a maneira como o uísque irlandês tem sido comercializado nos últimos anos, com foco no turismo de uísque. Embora já se tenham passado muitas décadas desde que um uísque tenha sido feito na Jameson Distillery de Dublin, o centro de visitantes dela atrai mais visitantes por ano do que qualquer empreendimento semelhante na Escócia ou em Kentucky, o lar do uísque norte-americano.

Embora hajam desafios para a indústria, como as bebidas que afirmam ser uísque irlandês em vários mercados internacionais, Lavelle avalia que a tendência atual de crescimento se manterá por algum tempo antes de estabilizar.

"Haverá mais crescimento. Não estamos presentes na Ásia e ainda não estamos na África. Nos próximos dez anos, é aí que se verá uma grande virada", avalia. "O uísque irlandês continuará crescendo. Em algum momento, irá se estabilizar em termos de quantidade de novas destilarias sendo abertas, mas a decolagem real começou há apenas cinco anos. Isso significa que ainda temos outros 10 ou 12 anos antes de uma estabilização."

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