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Opinião: As perspectivas pós-eleição são sombrias

8 de novembro de 2016

A disputa pela Casa Branca afetou a reputação das instituições americanas e a dignidade do cargo de presidente. A elite política do país deve aproveitar o fim da campanha para refletir, opina o jornalista Miodrag Soric.

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Miodrag Soric
Miodrag Soric é correspondente da DW em Washington

Brigar faz parte da democracia americana assim como a bandeira nacional faz parte do patriotismo deste povo. Na história dos Estados Unidos, os candidatos à presidência sempre brigaram ferozmente, disputaram o poder com meios leais e, por vezes, desleais. Mas uma vez que a decisão era tomada, o perdedor felicitava o vencedor, as pessoas se uniam novamente. Democratas e republicanos se tornavam americanos novamente.

Este momento tão importante para o regime democrático não virá depois desta eleição – não importa quem no final chegar à Casa Branca. A campanha foi suja demais para isso; os ataques mútuos, violentos demais, pessoais demais, dolorosos demais. Não eram adversários políticos que se enfrentaram, mas gladiadores políticos, que se comportaram como inimigos mortais; não eram oponentes que se encontraram com um nível mínimo de respeito, mas rivais que se acusaram mutuamente do pior possível.

Claro, para muitos americanos, tudo isso teve certo valor de entretenimento no início da campanha eleitoral. Mas quanto mais tempo este espetáculo se arrastava, mais eles iam se afastando dele. Quem vai votar, muitas vezes não opta por um candidato específico, mas por aquilo que considera ser o "mal menor".

O modo como ocorreu a disputa pelo poder nesta campanha provocou dano à democracia americana. A dignidade do cargo foi afetada. A confiança dos americanos em suas instituições – o Congresso, o governo, o FBI – provavelmente deve que continuar a decair. O que vai tornar o ato de governar ainda mais difícil no futuro. As perspectivas são sombrias.

Diferentemente do que afirmam os ideólogos do Tea Party, um acordo não é, de forma alguma, uma coisa ruim. Pode ser que um acordo seja apenas um sucesso parcial, mas é um sucesso. Toda a democracia vive desta arte do possível. Os eleitores americanos não esperam nenhum milagre de seus representantes em Washington – mas eles devem fazer de vez em quando seu trabalho: governar, colocar os interesses das pessoas em primeiro plano e, para isso, trabalhar em conjunto.

Isso tem sido ignorado solenemente há anos pelas elites políticas em Washington, que estiveram envolvidas com seus próprios joguinhos de poder. E foi exatamente disso que se aproveitou o forasteiro político e aventureiro Donald Trump. E puxou o discurso político para baixo, ao nível da linguagem vulgar.

Isso não tem nada a ver com clareza – mas, isso sim, com a exclusão de todos aqueles que discordam. Agora, todos notaram: a sociedade americana está mais dividida do que nunca. Mas se isso é algo que nem mesmo Barack Obama conseguiu superar em oito anos, como agora Trump ou Hillary poderão superar?

É um pouco negligente Donald Trump já falar com antecedência de fraude na eleição e afirmar que só vai reconhecer o resultado se ele ganhar. E é triste o desprezo com o qual Hillary Clinton fala daqueles que, por alguma razão, têm inclinação pelo rival dela. Ela não deveria, isso sim, se perguntar o que faz com que o mineiro de Kentucky ou mecânico de Ohio optem por Trump? O que fez de errado o establishment em Washington, ao qual a família Hillary pertence, para que a coisa tenha chegado a esse ponto?

Mas antes da eleição não havia tempo para autocrítica. Até o último segundo, os dois lados focaram na mobilização de seus seguidores. Caso as pesquisas estejam certas, Hillary Clinton tem vantagem apertada. Uma surpresa é, então, bem possível.

Quando finalmente os sons estridentes da campanha eleitoral silenciarem, quando a fumaça da batalha eleitoral se dissipar, uma nova manhã começará na América. A elite política do país deve aproveitar o momento para refletir. Talvez para se lembrar de que o poder não é um fim em si mesmo. Ele deve servir ao bem comum – com toda a humildade, diante do povo soberano.