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Merkel, a sorte da UE

9 de julho de 2020

Para a União Europeia é uma feliz coincidência que uma gestora de crise experiente, à frente da maior economia do continente, esteja na liderança diante do maior desafio da história do bloco.

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Angela Merkel no Parlamento Europeu
Merkel no Parlamento EuropeuFoto: Reuters/Y. Herman

Quando procura inspiração em questões europeias, Angela Merkel escuta a Nona Sinfonia. Como disse a chanceler alemã em seu discurso de posse da presidência alemã do Conselho Europeu, a música deste hino europeu e a temática de fraternidade de Beethoven são como a Europa: sempre se descobre algo novo e sempre se fica impressionado novamente.

Coesão, solidariedade, democracia e direitos fundamentais. É sobre esses pilares que Merkel quer trabalhar nos próximos meses. Mas foi um tanto nebuloso o discurso da chanceler aos parlamentares europeus: infelizmente, não havia muitas informações concretas sobre como ela pretende enfrentar o maior desafio da história da União Europeia (UE) – as conseqüências da pandemia.

Merkel espera ser capaz de chegar a um acordo sobre um enorme fundo de reconstrução e o orçamento plurianual antes do fim do verão europeu. Os mais vulneráveis, diz ela, devem ser ajudados sem sobrecarregar os mais fortes. É gentil da parte dela, mas como isso pode ser feito? O escopo, o financiamento e o desembolso da ajuda à reconstrução continuam a ser altamente controversos. Infelizmente, não há nenhuma indicação de Merkel de como ela quer reconciliar doadores e beneficiados.

Merkel está diante de nada menos que uma revolução europeia. A superação da atual crise poderia unir os Estados da UE mais do que nunca através da dívida conjunta. O argumento mais forte que a chanceler alemã pode usar par isso é a grande escala do desafio.

O desafio é tão grande que todos têm que entender: sem um acordo rápido, não haverá nada além de fracasso. A própria Merkel já fez uma reviravolta em maio com sua proposta para um fundo de reconstrução financiado pela dívida. Ela está se esforçando, lembrando a todos que a UE já superou tantas crises. Mas esta é maior do que todas as outras.

E o foco não pode ser apenas na UE, o que em si já seria bastante difícil. A chanceler tem enfatizado repetidamente que a Europa deve estar consciente de sua responsabilidade no mundo. Mas ela não disse como a UE deveria agir nesta crise econômica e política global. "Parceria com a África" e "diálogo com a China" surgiram como chavões sem conteúdo. Ela nem sequer mencionou EUA e América do Sul, Oriente Médio, Ásia...

Para a União Europeia é uma feliz coincidência que uma gestora de crise experiente estabeleça o rumo decisivo para a vida após a pandemia. É um golpe de sorte que essa gestora também represente o Estado-membro mais forte da UE, que, embora enfraquecido pela pandemia, continua a ter um bom desempenho. Quem, senão Angela Merkel, poderia conseguir manter a UE unida nesta crise profunda? Ela ainda tem dinheiro e está pronta para usá-lo.

É também uma feliz coincidência que Merkel tenha que assumir esta enorme tarefa no final de sua carreira política. Ela não aspira mais seguir no cargo, não precisa mostrar nenhuma consideração e não está planejando deixar nenhum legado. Ela pode agir mais livremente do que muitos outros. Ela sinalizou isso para os parlamentares: vai agarrar esta oportunidade. Dois anos atrás, em 2018, ela era chamada de o "pato mais manco" da UE. Agora está sobrecarregada de expectativas e esperanças excessivamente altas. A maré muda rápido.

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Bernd Riegert
Bernd Riegert Correspondente em Bruxelas, com foco em questões sociais, história e política na União Europeia.