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Opinião: Militares alemães precisam de mais coragem civil

Udo Bauer
17 de maio de 2017

O escândalo envolvendo simpatizantes da extrema direita recoloca na berlinda as tradições militares da Bundeswehr. Já é hora de se desligar inteiramente do passado do Exército nazista, opina o jornalista Udo Bauer.

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Udo Bauer é jornalista da DW
Udo Bauer é jornalista da DW

Todo Exército deste mundo cultiva tradições: canções de soldados, símbolos, artigos devocionais e histórias de valentia e heroísmo em batalha visam incentivar os militares da ativa. Os superiores do passado são um exemplo.

Isso talvez soe estranho para cidadãos sem experiência militar. Do ponto de vista dos soldados, porém, que arriscam a própria vida por seu país, trata-se de algo importante, tanto para a coesão social da tropa como para sua identidade.

Ainda assim, muitos alemães ficaram chocados pela apresentação, nos espaços sociais das casernas da Bundeswehr, de memorabilia da Wehrmacht(Forças Armadas da Alemanha nazista) e do romantismo soldadesco remanescente da Segunda Guerra Mundial. Com razão, pois idealizar de modo tão unilateral o aparato militar do nazismo, como modelo para os soldados, é perturbador e historicamente leviano.

Sim, houve heróis militares nas Forças Armadas de nossos pais e avôs. E, sim, a maior parte dos soldados da Wehrmacht permaneceu "limpa" – até o ponto que isso seja possível numa guerra. Por outro lado, partes do Exército de Adolf Hitler também foram culpadas dos mais graves crimes de guerra.

A Wehrmacht travou uma brutal guerra de extermínio no Leste Europeu. Ela apoiou ativamente a milícia armada da Waffen-SS na deportação dos judeus e com execuções em massa de civis. Ela intencionalmente deixou morrerem de fome centenas de milhares de presos de guerra soviéticos.

Por isso, a Wehrmacht não pode ser o modelo para os soldados de um Estado democrático, atuantes em alianças e missões internacionais.

Imagine-se que soldados poloneses, estacionados numa caserna alemã no contexto de uma missão da Otan, se deparem com artigos devocionais das Forças Armadas nazistas, incluindo armas com que seus antepassados foram abatidos. O resultado seria um escândalo sem igual.

Por isso é correto a ministra da Defesa Ursula von der Leyen mandar limpar as casernas de tal memorabilia. Também deve ser revisto o assim chamado "Decreto da Tradição" da Bundeswehr, que desde 1982 regulamenta que tradições que o Exército deve ou não cultivar. A intenção é que ele passe a normatizar mais concretamente também a forma de lidar com a Wehrmacht.

Melhor seria o Ministério da Defesa fazer tábula rasa: fora com toda e qualquer tradição da Wehrmacht; fora com os nomes de seus generais, que até hoje indicam casernas da Bundeswehr – homens que não tiveram a coragem de se revoltar contra os planos hitleristas de uma campanha de extermínio, nem de renunciar ao posto.

Em vez disso, essas casernas deveriam receber os nomes de integrantes da resistência antinazista, de Claus von Stauffenberg, Henning von Treskow e outros. Esses oficiais da Wehrmacht, que tentaram matar Hitler, foram corajosos até a morte, e seriam modelos apropriados para soldados modernos. Mais coragem civil é do que precisam os nossos militares.