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Primeiro ano do governo Hollande ampliou afastamento entre Paris e Berlim

Andreas Noll 15 de maio de 2013

Aliança entre França e Alemanha é o motor da UE, mas 12 meses após a posse do presidente francês, relação poucas vezes esteve tão ruim. Fragilidade econômica francesa contrasta com domínio alemão, dificultando sintonia.

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Foto: Getty Images

Quando o presidente francês, François Hollande, comenta sua relação com a chanceler federal alemã, Angela Merkel, ele gosta de falar num convívio marcado por "tensões amistosas". Em outras palavras, a parceria entre Berlim e Paris já viveu tempos melhores.

No primeiro aniversário da posse de Hollande, a constatação não chega a surpreender – mas bem que a situação poderia ser melhor. Quem sucedeu o inquieto e impulsivo Nicolas Sarkozy foi um político cujo toque pragmático e sóbrio se assemelha ao estilo de Merkel. Mesmo assim, eles ainda não entraram em sintonia, apesar de já se tratarem pelo primeiro nome.

Política sem beijinhos

As razões para a relação difícil são muitas e começaram já durante a campanha presidencial francesa. Na época, Merkel fez abertamente campanha para a reeleição de Sarkozy, fato que Hollande parece ainda não ter perdoado. Agora, o socialista aposta de forma ostensiva na eleição para chanceler do candidato do Partido Social Democrata (SPD), Peer Steinbrück, e numa consequente mudança de poder em Berlim.

Porém, muito mais importante do que o difícil início desse convívio é o desenvolvimento das relações de força entre ambos os Estados. A França está economicamente e, portanto, politicamente, enfraquecida; enquanto a influência alemã na Europa cresce em ritmo constante.

EU-Gipfel zur Zukunft der Union Angela Merkel Francois Hollande
Apesar das aparências, cooperação entre Merkel e Hollande é difícilFoto: Reuters

Se a economia francesa há cerca de uma década ainda podia se comparar à alemã, hoje ela ficou para trás. Mesmo prometendo aos eleitores que faria tudo melhorar, Hollande assumiu o poder sob condições extremamente difíceis, incluindo uma dramática desindustrialização, acompanhada por uma taxa de desemprego nunca antes vista na Quinta República. Um ano depois de sua eleição, há 322 mil desempregados a mais do que antes.

Muitos socialistas franceses culpam a austeridade imposta pela Alemanha pela crise na Europa. E, de fato, a chanceler alemã tem rejeitado regularmente propostas apresentadas por Hollande, seja o compartilhamento da dívida na Europa ou uma mudança de atribuições para o Banco Central Europeu (BCE).

Governando com partido dividido

O certo é que Angela Merkel no momento não quer nem uma partilha da dívida, nem um BCE político ou programas de investimento de curto prazo. Ela está convencida de que o principal parceiro da Alemanha só poderá se recuperar através de reforma estrutural abrangente. Uma similar à criada em 2010 por seu antecessor, Gerhard Schröder, sob o nome de Agenda 2010. Não só Merkel, mas muitos especialistas em economia franceses e alemães tinham esperança que o pragmático socialista, pertencente à ala mais à direita do seu partido, tivesse coragem para realizar essa tarefa hercúlea.

Um ano após sua eleição, aparentemente não haverá uma grande reforma implementada por François Hollande. Ele prefere pequenos ajustes paulatinos, como, aliás, também faz a chanceler alemã, que deseja implementar em consenso social. Entre eles, está prevista, inclusive, uma quebra da rígida estrutura do mercado de trabalho francês. Para os parceiros alemães, entretanto, esse ritmo não é rápido o suficiente. O principal candidato às eleições parlamentares alemãs do Partido Liberal alemão, Rainer Brüderle, acusa o governo socialista da França de ter arruinado a economia do país, refletindo uma opinião que não é só dele, mas também de outros membros do governo em Berlim, que preferem não ser tão explícitos.

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Relação entre os governos é permeada por "tensões amistosas"Foto: AP

Pior crise da Quinta República

A chanceler e seus ministros evitam fazer críticas abertas à liderança francesa. Até porque o espaço político de manobra do presidente já está bastante restrito ultimamente. Um ano depois de tomar posse, Hollande tem taxas de popularidades tão ruins como nenhum outro presidente antes dele.

Os franceses o consideram um governante sem autoridade e titubeante, de política indecisa e contraditória. A queda de autoridade se reflete também nos meios de comunicação, que apelidam o presidente de "monsieur faible" ("senhor frágil"), ao mesmo tempo que enfatizam a liderança inconteste de Merkel na Europa. Com isso, aumenta a pressão, principalmente vinda de seu partido, para que ele finalmente se mexa e arrisque uma mudança política na França e na Europa.

O debate em torno da convenção partidária dos socialistas sobre a política europeia, agendada para meados de junho, é prova da tensão atual. Um documento interno do partido acusa a chanceler de "não pensar em outra coisa, além de poupança para a região além do Reno, na balança comercial de Berlim e na próxima reeleição". A passagem foi excluída neste meio tempo, mas a raiva na política de austeridade da chanceler parece não conhecer limites entre alguns setores socialistas.

O partido está profundamente dividido sobre qual a melhor política econômica e também em outros assuntos. Entre os mais numerosos, estão os que defendem mais endividamento, um Estado de bem-estar maior, mais influência estatal sobre a economia e que pedem a seu presidente que finalmente forme uma coalizão europeia contra os poderosos alemães. Mas o presidente ainda reluta em cortar o cordão umbilical com a Alemanha e se aliar a Espanha e Itália, liderando um bloco dos países do sul do continente.

Fußball Freundschaftsspiel Deutschland - Frankreich
No futebol, como na vida: líderes assistem a amistoso entre seleções, em fevereiro. Vitória foi dos alemãesFoto: Bongarts/Getty Images

Pouca chance de melhora

Num período de tempo bom, os contrastes entre alemães e franceses podiam ser ignorados. Mas a tempestade causada pela crise do euro faz com que os conflitos aflorem. Mesmo a nível de trabalho, o clima está cinzento entre Berlim e Paris, segundo afirmou recentemente o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung. Mas a aliança franco-alemã continua sendo fundamental para mover a política europeia. Além disso, o medo de uma paralisação permanentemente da França é grande em todas as capitais do bloco.

Merkel e Hollande também sabem disso e acordaram no início do ano apresentar aos seus parceiros europeus, até o fim de junho, um documento conjunto para uma maior integração da União Europeia. Isso seria, na verdade, uma grande oportunidade. Especialmente porque Angela Merkel se afasta do método comunitário de forma muito mais forte do que seus antecessores e tende a lutar por uma Europa dos Estados nacionais, como é do gosto dos franceses. No entanto, a abordagem comum deverá vir meio magra, segundo analistas. Pelo menos até as eleições gerais alemãs, as relações entre os dois países devem continuar paralisadas.