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Provocador e insultador, Peter Handke completa 70 anos

6 de dezembro de 2012

Ele escreveu best-sellers, insultou o público e rompeu com tabus políticos: o austríaco Peter Handke é um dos mais célebres escritores de língua alemã.

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Foto: picture-alliance/dpa

Quando ele adentrou o palco da literatura, os escritores ainda usavam óculos de aros grossos e ternos comportados. E o bolor do pós-Guerra ainda pairava sobre a Alemanha. Foi quando este jovem inquieto da província austríaca da Caríntia começou a chocar o establishment literário com sua jaqueta de couro surrada e seus cabelos longos. Ele acusava a literatura contemporânea alemã de sofrer de "impotência descritiva". Em pouco tempo, no mais tardar com a peça de teatro Publikumsbeschimpfung (Insulto ao público), transformou-se no enfant terrible da cena literária da Alemanha.

Provocação como método

Seus gestos provocativos marcaram tanto sua literatura quanto sua imagem pública. Em seus textos, o escritor mistura Nietzsche com letras de bandas de rock, escrevendo tanto sobre uma jukebox quanto sobre suas raízes eslovenas. Com o passar dos anos, ele consequentemente passou a extrair da própria vida o material narrativo para a literatura que produzia.

Peter Handke
Jovem e afoito: Handke no passadoFoto: picture-alliance/dpa/Bildarchiv

O conto Wunschloses Unglück (Bem-aventurada infelicidade), no qual Handke elabora o suicídio da própria mãe, é até hoje um daqueles textos que abalam e ao mesmo tempo fascinam o leitor. Frases transbordantes, frequentemente interrompidas por perguntas, fazem parte de seu estilo literário, permeado por páthos e dúvidas.

Nos anos 1980 e 1990, na Alemanha, era quase impossível ignorar a existência de Peter Handke. O medo do goleiro diante do pênalti, por exemplo, tornou-se leitura obrigatória nas escolas alemãs. Handke traduzia obras alheias, assumia a direção de peças teatrais e escrevia roteiros, como por exemplo o do filme Asas do Desejo, dirigido por seu amigo Wim Wenders.

Ao fim, essa presença intensa pareceu incomodar o próprio escritor. O revolucionário de então havia se transformado num literato para a classe intelectual – premiado diversas vezes, entre outros, com o renomado Prêmio Georg Büchner.

Peter Handke Trauerfeier Slobodan Milosevic HOCH
Peter Handke no enterro de Slobodan MiloševićFoto: ullstein bild - AP

Opção pela Sérvia

Em 1996, como se quisesse evocar mais uma vez o espírito do desconforto, voltar a ser o espinho literário no consenso social, Peter Handke tomou partido político – para muitos, em prol da causa errada. Depois do desmembramento da antiga Iugoslávia, empenhou-se em defesa da Sérvia e protestou contra o bombardeio do país pela Otan. Handke visitou tanto o criminoso de guerra sérvio Radovan Karadžić como o túmulo de Slobodan Milošević. E escreveu sobre isso.

Seu relato Uma viagem de inverno pelos rios Danúbio, Sava, Morava e Drina ou justiça para a Sérvia foi seriamente criticado pelos cadernos de cultura dos jornais de língua alemã. A Comédie Française de Paris tirou de cartaz uma peça de Handke, alegando a cegueira política do escritor. A polêmica chegou ao auge em 2006, com a concessão do prêmio Heinrich Heine ao autor. Ao fim da batalha midiática, Handke abdicou voluntariamente da premiação.

Espantar os maus espíritos

Quem produz grande literatura pode cometer grandes erros? Handke é um reacionário político ou um escritor com desejo de provocar, que queria torpedear a unanimidade pública? Ele próprio passou a negar cada vez mais respostas claras a essa questão, recolhendo-se à sua casa nos arredores de Paris e só raramente concedendo entrevistas.

Kombo Fotomontage Heinrich Heine und Peter Handke
Handke abdicou voluntariamente do Prêmio Heinrich Heine, após longas polêmicasFoto: Fotomontage/dpa/DW

Em 2008, foi publicado seu livro Die morawische Nacht (Noite da Morávia), a história de uma odisseia pela Europa em busca da própria vida. A obstinação política de então deu lugar a uma autorreflexão poética. Parecia que Handke queria afugentar os maus espíritos dos últimos anos.

Manter distância, observar as coisas a partir da margem e ainda assim trazer à tona o que há de mais pessoal e íntimo – essa contradição sempre marcou Peter Handke, tanto a pessoa quanto a sua literatura. Nesta quinta-feira (06/12), ele comemora 70 anos, este grande e desconfortável escritor.

Autora: Aygül Cizmecioglu (sv)
Revisão: Alexandre Schossler