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Regras de Maastricht para o euro continuam sendo ignoradas

Zhang Danhong md
7 de fevereiro de 2017

Tratado que criava a União Europeia e abria caminho para adoção do euro foi assinado há 25 anos na cidade holandesa. Desde então, critérios para uso da moeda única nem sempre foram respeitados pelos signatários.

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moedas de euro
Foto: picture-alliance/dpa/U. Deck

Sete de fevereiro de 1992 foi a data da assinatura do Tratado de Maastricht: a antiga Comunidade Europeia dava lugar à União Europeia (UE) e era lançada a pedra fundamental para uma política externa e de segurança comuns. O acordo abria ainda caminho para a introdução de uma moeda comum, o euro, e o consequente fim das moedas nacionais. Ele era o passo mais ambicioso já dado para a integração da Europa.

Dois dos mais importantes pontos do tratado, os chamados "critérios de convergência", estão relacionados à disciplina orçamentária e, com isso, à estabilidade da moeda europeia: o deficit orçamentário de um país integrante da união monetária não pode exceder 3% do Produto Interno Bruto (PIB), e a sua dívida pública não pode superar 60% do PIB. Sobretudo a Alemanha insistiu nesses pontos, embora a ideia dos 3% tenha sua origem num jovem francês.

Guy Abeille era um funcionário de baixo escalão no Ministério francês das Finanças quando, em 1982, recebeu a missão de formular uma regra para limitar os deficits públicos que fosse ao mesmo tempo simples e soasse como competência econômica. Naquela época, o deficit público francês estava ameaçado de sair de controle após a experiência socialista do presidente eleito no ano anterior, François Mitterrand.

O deficit público francês de então correspondia a 2,6% do PIB. Abeille pensou: um teto de 1% seria irrealista; 2% também colocaria o governo sob pressão. Então, optou pelos 3%. Foi assim, de forma simples e arbitrária, que nasceu a fórmula mágica que mais tarde foi incluída nas negociações sobre o Tratado de Maastricht como um dos mais importantes critérios para a adesão à união monetária.

Três quintos são 60%

"A marca de 60% para a dívida pública também é de natureza arbitrária", diz Oliver Sievering, da Escola Superior de Administração Pública e Finanças de Ludwigsburg. Afinal, no início dos anos 1990, a dívida pública de muitos países era justamente de cerca de 60% do PIB. Os dois percentuais acabaram virando piada entre os economistas: "Se a economia cresce nominalmente 5%, então a dívida pública pode aumentar 3%. Três quintos são 60%", relembra Sievering.

Mas logo ficou claro que um crescimento anual de 5% era utópico. O mesmo vale para a meta de 60% no caso de muitos países, como Bélgica, Itália e Grécia. Então, a opção foi se concentrar no critério dos 3%, dentro da lógica de que, com ele, pelo menos o endividamento estava evoluindo numa direção positiva. À exceção da Grécia, todos os candidatos a adotar o euro citados no relatório de convergência do Instituto Monetário Europeu de 1998 apresentavam um deficit público inferior a 3% do PIB.

Alguns deles lançaram mão de truques para se manter dentro dos 3%, incluindo a Alemanha. O governo alemão vendeu ações da empresa de telecomunicações Deutsche Telekom e da empresa de correio Deutsche Post ao banco estatal KfW para reduzir, assim, sua dívida. A Itália até criou um imposto europeu, restituindo-o, em grande parte, aos contribuintes logo após a adoção do euro.

Mau exemplo de Alemanha e França

Os dois critérios de Maastricht não valem só na hora de adotar o euro – eles devem também ser cumpridos após a entrada no clube, para que a moeda comum mantenha uma base sólida. Essa exigência veio principalmente da Alemanha. Só que foi justamente a Alemanha que, junto com a França, ultrapassou o limite de 60% do deficit em 2002 – e os dois pesos pesados ​​do euro acabaram apelando para um jeitinho: flexibilizaram as regras e conseguiram, assim, evitar bilhões de euros de multa. "Isso prejudicou muito a disciplina orçamentária em toda a área do euro porque os outros países disseram: 'Se a Alemanha e a França não respeitam os critérios, por que nós temos que respeitar?'", comenta Sievering.

No auge da crise financeira, quase todos os países estavam fora da meta. Hoje, a maioria dos membros do euro tem o deficit público novamente sob controle, só que, no tocante à dívida pública, somente os três Estados bálticos, a República Tcheca, a Eslováquia e Luxemburgo estavam abaixo do limite de 60% em 2015. A Alemanha novamente não ampliou seu endividamento em 2016, mas sua dívida pública ainda é de 70%, bem acima do limite permitido.

Embora os critérios de Maastricht tenham sido violados mais de 200 vezes, nunca foi imposta uma penalidade. "Ninguém quer condenar o outro a uma multa porque sabe que, em alguns anos, ele mesmo pode estar nessa situação e aí vai ficar contente se também for tratado com clemência", observa Sievering. Em outras palavras: os infratores de hoje são julgados pelos potenciais infratores de amanhã.

Mesmo que, na prática, o mecanismo de punição não funcione, o economista considera essas duas regras indispensáveis. Segundo ele, o simples fato de haver um monitoramento e de que se fale sobre isso já surte um efeito disciplinar.