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Ruídos inovadores ajudaram a tornar "Os pássaros" um clássico do terror

Philip Hausmann (mas)24 de setembro de 2013

O alemão Oskar Sala criou os sons aterrorizantes que ajudaram a criar a fama dessa obra-prima de Alfred Hitchcok. Para isso, ele usou um precursor do sintetizador: o trautônio.

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"Os pássaros" é um dos mais populares filmes de Alfred Hitchcock, mestre do suspenseFoto: UNIVERSAL

Há 50 anos, Alfred Hitchcock chocava as plateias do mundo com um insólito cenário de horror: ataques de pássaros. Mas não só as imagens angustiantes de corvos e gaivotas avançando sobre pessoas aterrorizaram o público – também o desagradável e estridente trinado das aves se fixou na memória coletiva dos fãs do mestre.

O filme tem uma história envolvente, com toques surpreendentes. Depois de um breve encontro numa loja de animais, Melanie Daniels viaja para a costa californiana atrás do advogado Mitch Brenner, que quer passar o fim de semana em Bodega Bay. Lá, Melanie é atacada e ferida por uma gaivota. Os ataques de pássaros se tornam cada vez mais frequentes e violentos, gerando uma primeira vítima fatal – por fim, o bando de pássaros aterroriza toda a cidade. Muitos moradores tentam fugir, outros se refugiam em suas casas.

Hitchcock conseguiu transformar aves inofensivas em diabólicas bestas assassinas. Para a sonoplastia do filme, a equipe do diretor ofereceu a ele apenas sons de pássaros gravados no jardim vizinho. "Sons como esses eu ouço todos os dias lá fora. Eu preciso de algo que assuste as pessoas!", esbravejou o mestre do suspense. Hitchcock queria usar a trilha sonora para sublinhar o papel dos pássaros no filme.

Alfred Hitchcock Die Vögel Tippi Hedren
Melanie Daniels (Tippi Hedren) foi atrás de um pretendente, mas encontrou o terror na costa californianaFoto: picture-alliance

Novo instrumento

Quando Hitchcock conheceu Remi Gassmann (um ex-aluno do compositor alemão Paul Hindemith), ele disse ao diretor que conhecia a pessoa certa para o trabalho: um ex-colega de Berlim, o músico experimental Oskar Sala. Hitchcock não pensou duas vezes. Para chegar ao resultado desejado, Sala apostou num instrumento inusitado, o trautônio. Inventado por Friedrich Trautwein, esse instrumento eletrônico, semelhante a um órgão, é considerado o precursor do sintetizador analógico.

Hitchcock conhecia o instrumento. Ele o ouvira no final dos anos 1920, na emissora de rádio Berliner Rundfunk. Com o trautônio, Sala criou todos os efeitos sonoros do filme: o grito das aves, elas batendo nas portas e janelas, até o som das pessoas martelando, no desespero de reforçar suas casas. Tudo foi elaborado em 1961, no pequeno estúdio de Sala no bairro de Charlottenburg, em Berlim.

Trilha sonora inovadora

Com a sonorização de Os pássaros, Hitchcock foi – mais uma vez – inovador. Ele renunciou a uma trilha sonora convencional para acompanhar as imagens. O mestre estava interessado em sons experimentais e eletrônicos. Em sintonia com a época, o diretor britânico queria incorporar as experimentações vanguardistas da chamada Nova Música.

Musiker Oskar Sala
Oskar Sala e o trautônio, pioneiro instrumento musicalFoto: picture-alliance/dpa

"Nos anos 1960, a música dos filmes de terror deixa de lado ritmos periódicos e harmonias tradicionais. Ela se torna atonal, estridente e com uma rica dissonância", explica o musicólogo Frank Hentschel, da Universidade de Colônia. A melodia passa a desempenhar um papel secundário, e os ruídos ganham espaço.

Ruídos estilizados

"O fato de esse filme privilegiar os ruídos em detrimento da trilha sonora torna Os pássaros um caso particular na obra de Hitchcock", observa o musicólogo. Para o bater de asas e os trinados dos ataques dos pássaros, Hitchcock utilizou uma mistura de sons naturais e artificiais do trautônio.

Sala distorcia e estilizava o som dos pássaros, fazendo-o soar estranho e não natural, ameaçador e até mesmo agressivo. Os corvos e gaivotas de Hitchcock deliberadamente deveriam soar diabólicos.

Alfred Hitchcock Die Vögel
Ruidos estilizados e terriveis silêncios pontuam a obra-prima do suspenseFoto: picture-alliance/dpa

Terrível silêncio

Só a cena final é mais assustadora e aterrorizante do que o estridente e alto som dos ataques dos pássaros. Nela, os protagonistas que sobreviveram à fúria das aves saem de suas casas, que já não oferecem nenhuma proteção. Diante deles, revela-se uma cena apocalíptica: bandos de pássaros ocupam a área, mas só ocasionalmente o silêncio é quebrado pelo som de um corvo ou de uma gaivota.

No fim de sua história de suspense, Hitchcock utiliza um silêncio que não é natural. Sem música ou ruídos, ele coloca uma imagem sinistra em primeiro plano. Nada afasta o espectador dessa imagem apocalíptica. Também ele é deixado sozinho e aterrorizado.