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"Trabalhador não pode ser tutelado pelo Estado"

9 de março de 2017

Ronaldo Nogueira, ministro do Trabalho, afirma que a proposta do governo não retira direitos e tem como eixo principal dar segurança jurídica para que trabalhadores e empresas os negociem "da forma mais vantajosa".

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Ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, em audiência da comissão especial da reforma trabalhista na Câmara dos Deputados
Ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, espera aprovar a reforma trabalhista ainda no primeiro semestreFoto: Agencia Brasil

O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, eleito deputado federal pelo PTB do Rio Grande do Sul, rejeita as visões de que a reforma apenas será vantajosa para o empregador e que serão suprimidos direitos dos trabalhadores. As novas regras vão permitir que empregados tenham diferentes jornadas e até mesmo salários mais baixos, desde que isso seja aprovado em convenção coletiva e que a empresa faça adesão ao Programa de Seguro-Emprego (PSE). ​​​​​​"Só em 2016 tivemos mais de 3 milhões de ações trabalhistas no Brasil. Isso gera uma insegurança jurídica muito forte, e o empregador fica com medo de contratar."

DW Brasil: Por que o governo vê relação direta entre a aprovação da reforma trabalhista e a melhora do mercado de trabalho?

Ronaldo Nogueira:  A nossa proposta de modernização trabalhista é ancorada em três eixos. O primeiro é consolidar direitos. Todos os direitos especificados na Constituição e na CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), como férias remuneradas, décimo-terceiro, vales transporte e refeição, descanso semanal remunerado, jornada semanal de 44 horas, esses direitos estão consolidados. Nossa proposta não ameaça nenhum desses direitos.

O segundo eixo é a segurança jurídica. Estamos dando à convenção coletiva força de lei para deliberar sobre determinados pontos que vão permitir ao trabalhador usufruir de seus direitos de forma mais vantajosa.

DW Brasil: Vantajosa para o trabalhador ou para a empresa?

RN: Para o trabalhador. Temos hoje 39 milhões de trabalhadores formalizados pela CLT, 16 mil sindicatos. Nosso modelo sindical já tem maturidade para representar o trabalhador.

Vou citar o exemplo da minha cidade, Carazinho, no Rio Grande do Sul. O sindicato da construção civil decidiu, em convenção coletiva, que faria a jornada de segunda a sexta, para folgar sábado e domingo. Uma decisão judicial tornou nulo esse acordo. Será que o trabalhador é incapaz de definir a forma da jornada? O trabalhador não pode ser tutelado pelo Estado e pela Justiça.

Só em 2016 tivemos mais de 3 milhões de ações trabalhistas no Brasil. Isso gera uma insegurança jurídica muito forte, e o trabalhador fica com medo de contratar. Os direitos especificados na Constituição e na CLT, você pode pontuar de forma clara e explícita na planilha da empresa. Agora, como mensurar uma decisão judicial? Qual é o valor do dano moral?

DW Brasil: E qual é o terceiro eixo da reforma?

RN: Criar oportunidades de ocupação para todos. Com a reforma trazendo segurança jurídica, o empregador não vai ter medo de contratar. Dos 39 milhões de trabalhadores formalizados, 85% são empregados de micro e pequenas empresas. Precisamos quebrar paradigmas.

DW Brasil: Críticos da reforma pontuam que a redução do risco jurídico não necessariamente aumentará a geração de empregos. O sr. concorda?

RN: Eu respeito muito o contraditório. Acolho críticas com respeito. Mas preciso que alguém me diga, explicitamente, onde nossa proposta de modernização compromete direitos. E onde ela promove insegurança jurídica. E onde poderá promover desemprego. Preciso que alguém diga: tal artigo e tal inciso permite isso.

DW Brasil: O Brasil tem hoje quase 13 milhões de desempregados e um quadro de recessão econômica grave. Para o empresário, neste momento, contratar mais só é possível se ele tiver orçamento.

RN: Eu tenho feito uma pregação assim, deixe eu fazer e você vai entender: salário não é despesa, é investimento. Tanto o empreendedor quanto o trabalhador são partícipes do capital. E todo investimento que for realizado com relação ao trabalhador o empreendedor pode especificar numa planilha, férias, décimo-terceiro, encargos trabalhistas, etc. Isso ele pode especificar. Agora, quem pode mensurar o montante do valor de uma ação trabalhista?

DW Brasil: A CLT já permite pactos laborais e acordos coletivos desde que não retirem direitos. Há especialistas que não veem relação direta entre essa nova legislação e a segurança jurídica.

RN: Nós estamos especificando quais os itens em que a convenção coletiva poderá deliberar. Poderá deliberar sobre a forma que a jornada semanal de 44 horas será executada, observando os limites previstos na CLT. Não vai ter força de lei para aumentar a jornada.

DW Brasil: E os salários?

RN: A convenção coletiva vai deliberar sobre o dissídio. Não estamos prevendo, ali, que pode deliberar sobre redução de salário. Ela será aval para o Programa de Seguro-Emprego (PSE). Estamos expandindo para micro e pequenas empresas, quando determinado setor é afetado pela crise econômica. O PSE não é uma ferramenta para socorrer a empresa que entra em crise por má gestão. É uma ferramenta para socorrer a empresa afetada por uma crise sazonal em consequência econômica.

DW Brasil: Então o projeto de lei proposto não permite que empresas e sindicatos, por acordo, reduzam salários para preservar empregos?

RN: Dentro dos dispositivos previstos no Programa Seguro-Emprego, prevê casos especiais. Por determinado período, para preservar o emprego, (pode haver) redução de jornada com redução proporcional de salário. Porém o programa vai complementar para que o trabalhador não tenha prejuízo.

DW Brasil: Isso está aberto para qualquer tipo de empresa?

RN: Qualquer tipo de empresa, desde que comprovado que a empresa foi afetada pela crise econômica. Para preservar o emprego, para que não demita o trabalhador. A empresa vai aderir ao PSE, e a convenção coletiva é um dispositivo avalizador para a empresa entrar no programa. O prazo máximo são 24 meses. O trabalhador não vai ter redução salarial. O programa vai complementar a renda dele neste período.

DW Brasil: E o governo, neste momento de ajuste fiscal e recessão, tem orçamento para isso?

RN: Temos 327 milhões de reais, nos próximos dois anos. Vamos evitar a demissão de 200 mil trabalhadores.

DW Brasil: Sobre o contrato temporário, o texto permite 120 dias, prorrogáveis pelo mesmo período, mas o relator no Congresso já fala em 180 dias. É um prazo razoável?

RN: A proposta do governo é 120 dias mais 120 dias. É a média do mundo.

DW Brasil: Trabalhador temporário não recebe aviso-prévio, não tem direito à rescisão do FGTS por dispensa, não tem seguro-desemprego.

RN: Ele tem direito ao Fundo de Garantia. A natureza do contrato temporário é para substituir um trabalhador permanente. A rotatividade, a burla da lei, será fiscalizada pelo Ministério do Trabalho. O conceito do trabalho temporário não é para atender necessidades do desenvolvimento sazonal da atividade econômica.

DW Brasil: E o Ministério do Trabalho terá condições para fazer essas fiscalizações?

RN: Temos um capital intelectual extraordinário dos nossos auditores do trabalho. Vamos buscar ações conjuntas com o Ministério Público do Trabalho para combater a informalidade e tentativas de burlar a legislação. Jamais permitiremos que o trabalhador seja levado à situação de precarização. Direitos você precisa aprimorar. Você consolida. Temos em atividade 2.600 auditores.

DW Brasil: Há experiências mundiais de flexibilização das leis trabalhistas em que são apontadas como resultados a precarização laboral e queda na qualidade do trabalho. O Brasil não corre o mesmo risco?

RN: Nós não estamos flexibilizando. Estamos regulamentando para trazer segurança jurídica. Estamos estabelecendo balizas e dando à convenção coletiva limites para ela atuar. Não dá para comparar nossa proposta de modernização com o que ocorreu no México, principalmente. É totalmente diferente.

DW Brasil: A Câmara quer votar um projeto de 1998 sobre a terceirização, que é distinto do projeto de 2015. Um item preocupante é que a empresa que contrata os terceirizados não é obrigada a fiscalizar se contribuições previdenciárias estão em dia. O governo vai intervir?

RN: Você me botou no canto. Os 513 deputados representam uma pluralidade de opiniões e interpretações. Eu estou focado. As propostas de terceirização que lá tramitam não foram enviadas por nosso governo. Eu não vou manifestar minha opinião. Preciso primeiro conversar com o presidente.

DW Brasil: O senhor espera que a reforma seja aprovada no primeiro semestre?

RN: O Brasil não pode esperar mais. Quem está apostando que o Brasil não vai dar certo vai errar. Vamos superar as dificuldades e vamos gerar empregos.