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Um ano depois, EUA ainda não saíram de campanha

8 de novembro de 2017

Doze meses após eleito, Trump continua a agir como se a corrida eleitoral continuasse, com ataques a Obama, discurso incendiário e promessas que, tudo indica, não serão nem de perto cumpridas. Polarização permanece.

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Donald Trump em comício em Phoenix
Aparições públicas do bilionário se resumem a comícios montados especialmente para eleFoto: Reuters/R. Roberts

O 8 de novembro de 2016 foi um dia de enganos – talvez alguns dos maiores da história americana: pesquisadores, jornalistas, todos os democratas e até alguns republicanos acreditavam que Hillary Clinton seria eleita a próxima presidente, pondo fim à campanha eleitoral mais suja já vista nos Estados Unidos. Donald Trump foi eleito – e a campanha parece continuar até hoje.

A mídia pró-Trump continua a bater em Barack Obama e em Hillary como se eles fossem responsáveis ​​por tudo o que está acontecendo nos EUA e em todo o mundo. O presidente, por sua vez, se sente mais confortável em comícios que parecem organizados especialmente para ele, que não se diferenciam em nada dos atos eleitorais de 2016.

A política, ou seja, a organização de maiorias e o fechamento de acordos, a busca de consenso entre partes que pensam diferente, não é coisa para Trump. E isso se reflete, à primeira vista, no balanço de um ano após sua eleição.

Obamacare e muro

Obamacare – é a palavra que os republicanos usam para se referir à lei do governo Obama destinada a fornecer a todos os americanos um seguro de saúde acessível. Na campanha eleitoral, Trump repetidamente prometeu que iria, imediatamente após assumir o cargo, cuidar para que o programa fosse revogado e substituído por "algo muito melhor".

Mas até agora os correligionários de Trump no Congresso não conseguiram entrar em acordo sobre uma reforma da área da saúde. Para os republicanos que temem não ser reeleitos, todos os projetos de leis eram duros demais e poderiam fazer com que seus eleitores ficassem sem plano de saúde. Outros consideram que os projetos não vão longe o suficiente, porque, com eles, os cuidados de saúde não seriam entregues às forças indomáveis ​​de um mercado livre.

Protótipo do planejado muro entre EUA e México, durante apresentação em San Diego
Protótipo muro entre EUA e México, durante apresentação de empreiteira candidata a realizar o projetoFoto: picture-alliance-/Zuma/San Diego Union-Tribune/J. Gibbins

E os democratas no Congresso não querem ter nada a ver com a tentativa de acabar com o Obamacare. Após várias tentativas fracassadas, os republicanos se conformaram em continuar sem uma reforma da saúde. Enquanto isso, o presidente vai cancelando ajudas financeiras ao programa, comprometendo, dessa forma, o sucesso da lei.

A segunda grande promessa da campanha de Trump era a construção de um muro na fronteira com o México, para evitar a entrada de "homens maus" nos Estados Unidos. A conta deveria ser paga pelo México. Em agosto, o jornal Washington Post publicou um protocolo de uma conversa que Trump teve com o presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, em 27 de janeiro.

Nele, Trump admitia que sabia, é claro, que o México não pagaria pela construção do muro, mas pediu a seu interlocutor que não mencionasse isso, porque o prejudicaria diante da opinião pública americana. Os mais de 1 bilhão de dólares que Trump precisa só para começar a construir o muro até agora não foram liberados pelo Congresso – e provavelmente jamais serão.

"Drain the swamp" – "secar o pântano” de Washington era outra promessa. Trump gostava de se apresentar como alguém fora do sistema político disposto a dar um basta no lamaçal de décadas da capital.  De fato, Trump substituiu muitos veteranos de Washington em sua formação de governo – por multimilionários dos ramos da indústria, do setor bancário e de empresas de lobby. A promessa, feita relutantemente, de se afastar de seus negócios, ele cumpriu colocando seus filhos no comando do império Trump.

Política da canetada

Mas considerar a gestão Trump como uma coleção de promessas quebradas seria um grande erro. O prometido corte de impostos "para todos" continua em discussão e provavelmente vai acabar se revelando principalmente um presente fiscal para os superricos.

O presidente pode trabalhar através das chamadas ordens executivas, decretos presidenciais que não são lei, mas valem como se fossem. Obama também trabalhou bastante com essa ferramenta. E assim parece ser muito mais fácil para Trump desfazer as decisões de seu predecessor com uma assinatura – elas foram mais de 800 até agora. Ao mesmo tempo, Trump emitiu mais de 50 decretos próprios até agora.

Presidente durante assinatura de decreto: para enfraquecer Obamacare
Presidente durante assinatura de decreto: para enfraquecer ObamacareFoto: Reuters/K. Lamarque

Por decreto, Trump está tentando, por exemplo, implementar outra promessa eleitoral crucial: a restrição da imigração. Suas várias proibições de viagem, as primeiras assinadas apenas uma semana depois de assumir o cargo, podem ter sido declaradas inválidas por vários tribunais dentro de um curto espaço de tempo, mas o "Trump Promise Tracker" do Washington Post vê a questão no caminho para um acordo. Independentemente disso, o governo Trump está agindo de forma decidida contra pessoas que já estão ilegalmente no país. Mais de 28 mil foram presos até agosto, apesar de não terem violado nenhuma lei, exceto a de imigração.

Além disso, Trump gosta de trabalhar com anúncios: fazem parte deles tanto a retirada do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas quanto a renegociação de acordos comerciais ou o futuro do acordo nuclear com o Irã.

Mas a realidade é muitas vezes mais complicada e dura do que discursos de campanha eleitoral. E a chance de que o eleitorado esqueça um desses tópicos desconfortavelmente complexos na tempestade diária que o presidente promove no Twitter é grande. Tão grande como a esperança de Trump de que a suspeita sobre a cooperação com a Rússia também seja esquecida.

Conservadorismo toma as rédeas

O governo Trump pode comemorar como um grande sucesso a ocupação de um lugar antes livre no Supremo Tribunal. O assento foi desocupado pela morte do juiz Antonin Scalia. A maioria republicana no Congresso bloqueou a tentativa de Obama de preencher o cargo com um candidato moderado durante mais de um ano antes da eleição de Trump.

Depois, ficaram felizes com a nomeação do jurista Neom Gorsuch por Trump. Gorsuch não é apenas ultraconservador, com também é bastante jovem para o órgão, com seus 50 anos. Na Suprema Corte, onde os juízes geralmente ocupam seus cargos o resto da vida, ele influenciará por décadas a jurisdição do país – e, indiretamente, a política.

Mas também abaixo do Supremo Tribunal Trump está transformando com sucesso os EUA em um Estado onde os conservadores tomam as rédeas, e empresas e empresários podem fazer o que querem.

Uma atrás da outra, Trump derruba medidas que eram vistas como um freio para a economia. Cargos de juízes são ocupados sobretudo por juristas conservadores, e o secretário de Justiça dos EUA, Jeff Sessions, faz todo o possível para colocar mais dureza na repressão contra o crime e fortalecer os direitos das autoridades policiais.

Entretanto, uma coisa que não teve papel na campanha eleitoral, mas que pode ser sentida já desde meados de 1990, é que um ano após a eleição de Trump, os EUA estão mais profundamente divididos, os cidadãos são mais céticos em relação ao meio político e à mídia do que nunca, e os EUA parecem, tanto por dentro como por fora, tão incapazes de encontrar acordos como nunca antes.

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