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Um balanço sobre a lei alemã de cadeia de suprimentos

12 de abril de 2024

Norma inovadora exige desde 2023 que grandes empresas alemãs verifiquem condições trabalhistas, ambientais e sociais de seus fornecedores. Companhias reclamam de custos, mas governo já vê impacto positivo.

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Menino mexendo em grande mesa com grãos de cacau
Trabalho infantil ainda é muito comum no cultivo do cacau, como nesta fazenda na Costa do MarfimFoto: Jürgen Bätz/dpa/picture alliance

Extrair grãos do cacau com facões e carregar sacos pesados durante a colheita é o que meninos e meninas em idade escolar de Gana e outros lugares não deveriam estar fazendo. Mas uma investigação da emissora americana CBS e da suíça SRF revelou que a fabricante de chocolates Mars e a empresa suíça Lindt & Sprüngli poderiam estar envolvidas em casos de trabalho infantil no país africano. Estudos sugerem que cerca de 700 mil crianças continuam trabalhando na indústria do cacau em Gana.

Grandes empresas alemãs também estão sendo criticadas. Fornecedores dos supermercados Edeka e Rewe supostamente violaram direitos ambientais e humanos, afirma a organização não governamental Oxfam. De acordo com investigações das emissoras públicas NDR e WDR e do jornal Süddeutsche Zeitung, um fornecedor da BMW também é suspeito de poluição ambiental.

Tudo isso seriam violações à Lei da Cadeia de Suprimentos, que está em vigor na Alemanha desde o início de 2023. O objetivo da norma é garantir que as matérias-primas importadas de países do Sul Global não tenham sido obtidas por meio de violações de direitos humanos, trabalho infantil e destruição ambiental.

Quando questionada pela DW, a ministra alemã do Desenvolvimento, Svenja Schulze, fez uma avaliação inicial positiva da norma. A Lei da Cadeia de Suprimentos da Alemanha já trouxe conquistas, diz: "Estamos ouvindo de muitos países parceiros que os sindicatos estão sendo levados mais a sério, que escritórios de denúncias estão sendo criados e que há um movimento nas condições de trabalho locais."

Como funciona a lei

As empresas alemãs com pelo menos mil funcionários devem verificar se seus produtos e serviços atendem aos requisitos rigorosos da lei. O Ministério Federal do Trabalho e Assuntos Sociais, que é responsável pela norma, afirma que o objetivo é incentivar as empresas a cumprir as "obrigações de devida diligência". "Essas obrigações se aplicam às suas próprias operações comerciais, às ações de um parceiro contratual e às ações de outros fornecedores (indiretos). Isso significa que a responsabilidade das empresas não termina mais nos portões de suas próprias fábricas, mas se estende por toda a cadeia de suprimentos."

Em particular, a proteção deve ser fornecida contra trabalho infantil e forçado, grilagem de terras, destruição ambiental e salários injustos. O ministro do Trabalho alemão, Hubertus Heil, também lutou por essa lei durante muito tempo. A Alemanha é neste momento uma pioneira, disse ele quando questionado pela DW em uma coletiva de imprensa. Apesar de todas as críticas de algumas empresas, há também companhias engajadas "porque não querem ser criticadas".

O ministro alemão do Trabalho, Hubertus Heil, e a ministra alemã do Desenvolvimento, Svenja Schulze, observam costureira trabalhando em um local com diversas outras costureiras.
O ministro alemão do Trabalho, Hubertus Heil, e a ministra alemã do Desenvolvimento, Svenja Schulze, em uma fábrica têxtil em Gana em 2023 Foto: Christophe Gateau/dpa/picture alliance

Na Alemanha, uma autoridade federal é responsável pelo monitoramento da Lei da Cadeia de Suprimentos. O Escritório Federal de Economia e Controle de Exportação (BAFA), que também monitora os subsídios e as exportações de armas. Embora tenha havido inspeções iniciais e reclamações sobre violações da lei, ainda não foram aplicadas multas ou penalidades.

Críticas de empresas e da sociedade civil

Para muitas organizações não governamentais, as exigências da lei não são suficientes. As organizações empresariais, por outro lado, reclamam do excesso de burocracia e do custo para recolher toda a documentação.

Em resposta a uma consulta da DW, o presidente da Federação das Indústrias Alemãs (BDI), Siegfried Russwurm, afirmou por escrito: "Muitos efeitos negativos e não intencionais e altos encargos burocráticos estão evidentes na implementação da Lei da Cadeia de Suprimentos."

A organização ambiental e de direitos humanos Germanwatch elogiou de forma geral a norma em uma entrevista à DW. No entanto, seu assessor Finn Schufft também disse: "Ainda há pontos fracos. Entre outras coisas, o fato de que as empresas não podem ser responsabilizadas no âmbito civil."

Ninja Charbonneau, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), define a norma como um "marco", mas gostaria que os direitos das crianças tivessem sido incluídos de forma mais explícita. E "no longo prazo, seria bom se todas as empresas fossem incluídas".

Ruína de edifício desabado, com muitas pessoas em volta observando tratores trabalharem nos destroços
Norma em parte reagiu ao desastre do Rana Plaza em Bangladesh em 2013, que matou mais de 1.100 funcionários de uma fábrica têxtilFoto: Abir Abdullah/dpa/picture alliance

A lei alemã se insere em um contexto mais amplo de iniciativas normativas de países importadores de matérias-primas para ter maior controle sobre as condições ambientais e trabalhistas em que elas foram obtidas. Um exemplo é a lei antidesmatamento da União Europeia (UE), que proíbe a importação de produtos oriundos e áreas de mata recém-derrubadas, inclusive no Brasil, mas que também sofre críticas sobre sua implementação.

UE deve adotar norma semelhante 

Uma lei europeia sobre a cadeia de suprimentos deve receber luz verde na UE em abril. Ela é semelhante à lei alemã, mas é mais rígida em alguns aspectos. Por exemplo, ela será aplicada a empresas a partir de 500 funcionários. Na Alemanha, o corte ainda é de mil funcionários. Além disso, as empresas que violarem as futuras exigências da UE poderão ser processadas por danos.

No entanto, ainda levará alguns anos até que todos os obstáculos burocráticos sejam superados e a lei da UE entre em vigor. O ministro alemão do Trabalho, Hubertus Heil, disse que a lei alemã continuará a ser aplicada até lá. E acrescentou: "Sem a solução alemã, não teria havido o ímpeto para a solução europeia".