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Um prédio em quarentena e uma ferida aberta de Berlim

Kate Brady rpr
19 de junho de 2020

Enquanto a cidade celebra proximidade do verão e chance de sair de casa, edifício inteiro é posto em confinamento após novo surto de coronavírus. Majoritariamente imigrantes, moradores temem mais uma estigmatização.

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Prédio em Neukölln
Dezenas de moradores de prédio em Neukölln testaram positivo para covid-19Foto: picture-alliance/dpa/P. Zinken

Em Berlim, este início do clima de verão coincide com o levantamento da maioria das restrições de movimentação impostas devido à pandemia, permitindo que as pessoas aproveitem o tempo nas ruas. Mas os moradores de um prédio de esquina de Neukölln, distrito no sul da capital alemã, estão confinados: desde o último sábado (13/06), o edifício inteiro está sob quarentena, após um novo surto de covid-19.

Até agora, 85 pessoas testaram positivo – todos casos leves – e centenas de resultados de exames ainda estão pendentes. No total, elas terão que ficar confinados por duas semanas. 

Em um dia normal, o parque em frente ao prédio fica cheio de crianças brincando. Mas hoje, há apenas um punhado de policiais, com cara pouco amigável, vigiando as idas e vindas do prédio em quarentena. 

A caminho do trabalho, a moradora Sisa Lima é parada por um policial, que pede para ver seus documentos. Como médica, ela está isenta da quarentena. 

"Já estive em quarentena algumas vezes, por isso conheço essa situação", conta. "É muito difícil ficar em um apartamento com muita gente, e esse é o problema que muitos dos meus vizinhos têm. Alguns apartamentos têm pelo menos dez moradores. 

Pobres são mais afetados 

Também em Berlim, as camadas mais baixas da sociedade são as mais atingidas pela pandemia. O subprefeito de Neukölln, Martin Hikel, diz estar preocupado com o fato de que o coronavírus está afetando mais os mais pobres. 

"As pessoas que estão sendo afetadas neste momento são aquelas que não conseguem nem mesmo pagar um apartamento grande o suficiente para sua família", diz. 

Mais de um quarto da população de Neuköln está abaixo da linha de pobreza, o que em Berlim significa uma renda líquida mensal de menos de 1.004 euros. 

A Technisches Hilfswerk (THW), uma organização de proteção civil coordenada pelo governo, entrega alimentos gratuitos e o essencial do dia a dia para o prédio. Mas alguns inquilinos dizem que a ajuda não chegou cedo o suficiente. 

Na rua, Anne está voltando do passeio com o cachorro, o que lhe permite sair do prédio. "Não houve nenhum aviso – nem das autoridades sanitárias locais, nem da administração do prédio. Cinco pessoas bateram à minha porta na terça-feira e disseram que queriam me testar. Vieram novamente no sábado para dizer que o prédio inteiro foi colocado em quarentena. Claro, quando cinco homens com máscaras aparecem à sua porta, você fica assustada", diz ela. 

Polícia patrulha parque no bairro berlinense que vive novo surto de coronavírus
Polícia patrulha parque no bairro berlinense que vive novo surto de coronavírusFoto: DW

O prédio é o lar de muitas famílias de imigrantes com conhecimento limitado de alemão. Isso também dificultou a troca de informações no início. 

"Muitas pessoas não entendem o que está acontecendo com elas aqui, por que têm que ficar confinadas. E as pessoas que são saudáveis, que deram negativo, não entendem nem um pouco por que não podem sair", comenta Anne.

As autoridades locais oferecem informações online sobre a quarentena, em nove idiomas diferentes. Mas os ânimos estão acirrados. 

"Quanto mais tempo essas pessoas ficarem dentro de casa, mais provável é que haja uma escalada na situação", teme Anne. 

Um homem chegou a atirar ovos e batatas nos jornalistas. "Vocês só estão nos transformando em alvo de risadas", gritou uma mulher da varanda. 

Medo de estigmatização 

O político Bernd Szczepanski, do Partido Verde em Neukölln, diz que está preocupado que as minorias no prédio sejam estigmatizadas devido ao surto. 

"É totalmente injustificado", diz ele. "Há também um elemento discriminatório, já que há algumas famílias roma lá."

Szczepanski está preocupado que a situação em Neukölln esteja sendo comparada à de Göttingen: um surto num complexo habitacional na cidade na região central da Alemanha, lar de muitas famílias do Kosovo, também levou à quarentena e a que as minorias fossem responsabilizadas pelo ocorrido. 

A origem dos últimos surtos em Berlim ainda é desconhecida. As autoridades estão investigando se um pastor pode ter espalhado o vírus nos cultos religiosos cristãos. Ele foi hospitalizado para tratamento da covid-19.

O distrito diz que está trabalhando com a administração do prédio para permitir que inquilinos e crianças possam brincar em segurança no pátio, de modo a aliviar a tensão da quarentena. O subprefeito de Neukölln diz que a necessidade de disciplina vai além dos apartamentos afetados. 

"Precisamos da solidariedade de todos os berlinenses e que eles cumpram as regras de distanciamento social", diz ele. "Muitas pessoas parecem estar pensando que já podem viver como antes do coronavírus e que a covid-19 desapareceu de repente. Mas a realidade é bem diferente."

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