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À CPI, consultor relata erros na documentação da Covaxin

9 de julho de 2021

Consultor também mostrou e-mail que indica pressão pela liberação de vacina, que está no centro de escândalo que atinge Jair Bolsonaro. Mesmo com problemas, área de execução do ministério liberou avanço dos papéis.

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Brasilien | William Amorim Santana
O consultor Willaim Santana, que é subordinado ao servidor Luis Miranda, autor da denúncia no caso CovaxinFoto: Jefferson Rudy/Agência Senado

O consultor técnico William Santana disse em depoimento à CPI da Pandemia nesta sexta-feira (09/07) que se recusou a dar andamento à importação da vacina indiana Covaxin após detectar problemas e inconsistências na documentação enviada pela empresa Precisa Medicamentos ao Ministério da Saúde.

O contrato para a compra da Covaxin está no centro de um escândalo que envolve o presidente Jair Bolsonaro e Barros, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde Roberto Dias, e o ex-secretário-executivo da pasta coronel Élcio Franco, entre outros personagens.

Santana, que atua no departamento de importação da pasta, também afirmou que ouviu relatos de pressão para liberar a vacina Covaxin. Aos senadores, ele mostrou um email encaminhado pela Precisa. Na mensagem, a empresa pede auxílio dos trâmites de importação e pede celeridade no processo, destacando que conta "com a anuência da Secretaria Executiva" do ministério.

O servidor ainda apontou falhas em três diferentes invoices (documentos com informações fiscais) encaminhados pela Precisa ao ministério. De acordo com o consultor, os problemas persistiram até mesmo nas novas versões dos documentos enviados pela empresa. Segundo Santana, os erros incluiam problemas da quantidade de doses à descrição dos lotes. Aos senadores, ele relatou que tantos erros não são "comuns".

"Não é comum. Existem casos que fornecedores mandam documentação que precisa ser corrigida - não é adulterada, modificada, a palavra é corrigida. E o papel da divisão de importação é exatamente esse. Há casos de outros processos de importação que receberam uma proforma invoice que não tinha Incoterm, não tinha peso líquido, peso bruto, os dados ministério não estavam dispostos corretamente. Isso é comum. Agora, não nessa quantidade", disse.

Análises posteriores, realizadas com auxílio do despachante do ministério, identificaram mais erros. Não havia, por exemplo, a descrição sobre qual aeroporto receberia a carga, informações sobre peso bruto e líquido e códigos de importação. Nem mesmo o nome completo e o endereço do fabricante apareciam com precisão.

"Tanto eu quanto o despachante ficamos confusos porque a invoice não dizia se a vacina viria em frasco, viria em caixa, não estava claro", disse Santana.

Mesmo com a persistência desses erros nas documentações suplementares enviadas pela empresa a área de execução de contrato do Ministério liberou o avanço dos papéis, segundo Santana.

No entanto, a Covaxin nunca chegou a ser enviada ao Brasil. En 29 de junho, diante dos atrasos na importação e o escândalo público envolvendo o negócio, o Ministério da Saúde suspendeu o contrato.

Santana não é um servidor do ministério, mas sim um consultor técnico da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) que auxilia a pasta. Ele também é subordinado a Luis Ricardo Miranda, irmão do deputado Luis Miranda (DEM-DF), que depôs à CPI e relatou que vinha sofrendo "pressão atípica" para a aprovação da Covaxin. Os irmãos Mirandatambém  afirmaram ter avisado pessoalmente Bolsonaro de irregularidades no caso, incluindo um pedido de pagamento adiantado de 45 milhões de dólares (R$ 234 milhões) não previsto em contrato.

Em depoimento à CPI, o deputado Luis Miranda ainda relatou que, no encontro com o presidente, Bolsonaro afirmou que encaminharia o caso à Polícia Federal (PF) e que o deputado Barros estaria por trás do "rolo" da Covaxin. A PF não abriu, à época, investigação sobre o caso, e Barros – que nega ter participado de negociação relacionada à compra da vacina – seguiu líder do governo.

Os problemas na negociação fizeram com que a Covaxin nunca chegasse, de fato, ao Brasil.A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acabou barrando o pedido de autorização excepcional para importação.

Em 29 de junho, o Ministério da Saúde suspendeu o contrato em meio às denúncias de irregularidades.

Mesmo antes de entrar no radar da CPI, a vacina indiana já levantava questionamentos por causa do seu preço (15 dólares, a mais cara de todas as vacinas compradas pelo Brasil), a velocidade com que o governo fechou o negócio (em contraste com outros laboratórios, como a Pfizer), a falta de aval da Anvisa (Bolsonaro afirmou em 2020 que não compraria vacinas não autorizadas pela agência) e pelo fato de a compra não ter sido feita diretamente com a fabricante, mas com uma empresa intermediária, a Precisa.

As negociações para aquisição da Covaxin também são investigadas pelo Ministério Público Federal, pela Polícia Federal e pelo Tribunal de Contas da União. Na sexta-feira passada, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), ordenou ainda a abertura de um inquérito contra Bolsonaro para investigar se ele cometeu o crime de prevaricação ao ignorar denúncias sobre as negociações de compra da Covaxin.

jps (ots)