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EconomiaQuénia

Energia geotérmica desperta interesse na África Oriental

29 de janeiro de 2024

A África Oriental nunca se mostrou muito interessada na energia geotérmica — até agora. A política pioneira de transformação energética do Quénia está a inspirar outros países da região.

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Central geotérmica de Olkaria, no Quénia
Central geotérmica de Olkaria, no QuéniaFoto: David Ehl/DW

O Quénia não é propriamente conhecido pelos seus spas termais — mas o país da África Oriental tem planos ambiciosos para expandir as suas fontes de energia geotérmica para produzir eletricidade amiga do ambiente.

O Grande Vale do Rift — uma formação geológica que se estende por 6.000 quilómetros desde a Eritreia a Moçambique — oferece excelentes condições para o efeito: a área é rica em atividade geotérmica ao nível subterrâneo e a crosta terrestre é particularmente fina nesta zona, o que facilita a exploração.

A central geotérmica de Olkaria é o exemplo perfeito: as suas infraestruturas estendem-se por cerca de 200 quilómetros quadrados na região e desde que entrou em funcionamento, em 1981, a central já foi aumentada várias vezes para explorar esta fonte de energia limpa para os quenianos.

Atualmente, a Olkaria é capaz de fornecer cerca de 900 megawatts — mas isso não é nada, comparando com os mais recentes planos do Governo para produzir cerca de 5.000 megawatts até ao final da década. Mesmo esse número representa apenas metade do potencial geotérmico total do Quénia.

Aproveitar o calor da Terra para obter energia

Um futuro verde para o Quénia — e não só

Expandir o uso da energia geotérmica é fundamental para o Quénia conseguir alcançar o objetivo de produzir exclusivamente eletricidade ecológica até 2030.

A energia geotérmica é amplamente vista como a chave para a transformação da produção a longo prazo que irá ajudar a satisfazer as necessidades energéticas locais sem recorrer a combustíveis fósseis.

A Agência Internacional para as Energias Renováveis (IRENA, na sigla em inglês), considera que o chamado fator de capacidade da energia geotérmica é superior a 80%. Este fator refere-se à medida do valor da fiabilidade com que uma fonte de energia pode fornecer eletricidade de forma sustentável ao longo do tempo. Em comparação, a IRENA calcula menos de 20% para a energia solar.

"Os países com maior potencial neste setor são claramente o Quénia e a Etiópia", diz o vulcanólogo Jacques Varet, que há décadas presta consultoria sobre questões geotérmicas na África Oriental.

Ao contrário da Etiópia, "o Quénia tem estado a investir na energia geotérmica há muito tempo", aponta, em entrevista à DW. Mas a Etiópia quer expandir a utilização de centrais geotérmicas no futuro com alguma ajuda do Quénia - o líder africano no investimento em energia geotérmica.

A Etiópia dispõe de uma pequena instalação de energia geotérmica, que está a funcionar desde 1998.

Anna Mwangi trabalha como geóloga na empresa de produção de eletricidade do Quénia, a KenGen
Anna Mwangi trabalha como geóloga na empresa de produção de eletricidade do Quénia, a KenGenFoto: Philipp Sandner/DW

Simples — mas caro

A física por trás do funcionamento das centrais geotérmicas é relativamente simples: o vapor geotérmico, que é uma mistura de água e minerais, sai de um furo artificial no solo e é desviado para uma máquina, que funciona como uma turbina.

A turbina, pouco maior do que um carro, está ligada a um gerador que, por sua vez, produz eletricidade.

O processo quase não envolve emissões de carbono e é por isso que a energia geotérmica é considerada uma fonte de energia limpa.

Equipas de investigadores na Olkaria estão a testar vários novos furos com vista a expandir a central eléctrica.

Anna Mwangi, geóloga na empresa de serviços públicos KenGen, detida maioritariamente pelo Governo, explica a importância de testar completamente as capacidades destes furos antes de se assumir qualquer compromisso adicional: "Às vezes temos sorte e concluímos um projeto de sondagem por apenas cerca de 3,7 milhões de euros. Mas se nos depararmos com problemas subterrâneos, a fatura da exploração pode chegar aos 7 ou 8 milhões de dólares".

Existem atualmente 322 furos de exploração na Olkaria, cada um dos quais custou à KenGen cerca de 6 milhões de dólares para perfurar.

Além dos custos elevados, há que ter em conta os elevados requisitos de saúde e segurança, uma vez que a água pressurizada encontrada nestes furos pode atingir temperaturas de várias centenas de graus centígrados.

Energia geotérmica desmistificada

Ir mais fundo — sobretudo dos bolsos

O equipamento de perfuração especializado, utilizado habitualmente apenas para explorar fontes de combustíveis fósseis, representa a maior despesa de produção na exploração.

"As principais questões para a exploração da energia geotérmica são: o Governo ou a empresa privada têm o capital necessário para adquirir uma sonda de perfuração deste tipo? Esta é a única forma de avaliar verdadeiramente todo o potencial de uma área geotérmica. Simplesmente, é preciso perfurar", diz Antony Karembu, economista sénior do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD)

O custo do aluguer destas máquinas até desceu nos últimos anos, à medida que a taxa de exploração de petróleo e outros combustíveis fósseis caiu a pique, no âmbito do aumento do uso de energias limpas.

Os custos elevados estão associados a riscos desconhecidos, como um baixo rendimento ou alterações na atividade geotérmica devido a mudanças tectónicas, o que significa que os recém-chegados à exploração da energia geotérmica hesitam frequentemente em investir os seus fundos.

O chanceler alemão Olaf Scholz visitou a central de Olkaria em maio de 2023 para entregar um empréstimo ao desenvolvimento apoiado pela UE no valor de 45 milhões de euros
O chanceler alemão Olaf Scholz visitou a central de Olkaria em maio de 2023 para entregar um empréstimo ao desenvolvimento apoiado pela UE no valor de 45 milhões de eurosFoto: Michael Kappeler/dpa/picture alliance

Intenções geotérmicas

O Governo queniano estabeleceu a Empresa de Desenvolvimento Geotérmico estatal em 2008, que Karembu diz servir como uma espécie de seguro, com o Executivo a salvaguardar todos os riscos financeiros associados às atividades de exploração.

Desde então, o entusiasmo em torno da energia geotérmica cresceu, com parceiros de desenvolvimento como o BAD a aderir.

A União Africana (UA) criou mesmo um fundo específico para cobrir os riscos financeiros envolvidos na exploração geotérmica com investidores não governamentais e privados. Um dos contribuintes para este fundo é o banco de desenvolvimento alemão, KfW.

"Eles [a UA] dão garantias a empresas privadas para assumirem o compromisso da perfuração exploratória", explica Karembu.

Do Quénia para o mundo

Recentemente, tornou-se mais fácil para os países da África Oriental explorar as tecnologias de energia geotérmica, com o Burundi, o Ruanda, a Zâmbia, a Tanzânia e o Uganda a anunciarem planos para lançar projectos de exploração.

No entanto, Varet sublinha que o Quénia continua a liderar o grupo por uma longa margem.

"Os cientistas do Quénia estabeleceram padrões muito elevados ao longo do tempo com os seus engenheiros, vulcanólogos e afins. Não há muitos desses profissionais em locais como a vizinha Etiópia, apesar de o potencial [da energia geotérmica] ser enorme", afirma.

A Etiópia espera começar a recuperar o atraso, diz Karembu: "Um projeto de exploração privado chamado Tulu Moye encomendou à KenGen a realização de perfurações na Etiópia".

Ainda assim, o Quénia detém o melhor conhecimento acumulado na indústria geotérmica de África — um trunfo que pode vender não só à Etiópia mas também a toda a região, diz Karembu.

Karembu, que trabalhou para a KenGen, diz que a empresa "conseguiu realmente construir uma grande experiência interna, que depois utilizou em consultoria em locais como as Comores ou o Djibuti".

Ao expandirem-se para outras partes de África, os especialistas do Quénia estão também a trazer novas ideias para o seu país.

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