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Por que Temer não aparece na lista de Fachin?

12 de abril de 2017

Inquéritos autorizados por ministro miram cúpula do governo, mas não o próprio presidente. Para PGR, chefe de Estado tem "imunidade temporária", o que STF já disse não ser impedimento para investigação.

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Michel Temer
Temer é citado em dois inquéritosFoto: picture alliance/E. Conteudo/D. Sampaio

O fim do sigilo sobre os pedidos de inquérito baseados nas delações da Odebrecht, com a divulgação da chamada lista de Fachin nesta terça-feira (11/04), implicou a cúpula da classe política brasileira. Estão lá senadores, governadores, deputados e cinco ex-presidentes. Oito ministros do governo Temer foram arrastados para essa nova etapa da Lava Jato. Mas e o próprio Michel Temer?

Leia mais: Lista de Fachin estremece governo Temer

O atual presidente é citado em dois inquéritos. Um deles mira os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Ambos são investigados por suspeita de cobrar propinas para irrigar a campanha de Temer e outras candidaturas do PMDB em 2014.

Outro inquérito investiga o senador Humberto Costa (PT-PE), também por suspeita de pagamento de propina. Nesse último, há menção a depoimentos que afirmam que Temer participou em 2010, quando era candidato a vice-presidente, de uma reunião em que se discutiram repasses em troca de facilitar a participação da Odebrecht em projetos da Petrobras. O delator Márcio Faria afirmou que Temer comandou uma reunião em São Paulo na qual se acertou o repasse de 40 milhões de dólares. Temer nega que tenha falado sobre valores com Faria.

Apesar de ser mencionado por delatores e da presença de dois de seus colaboradores mais próximos na lista, Temer não foi incluído na investigação.

Justificativa 

Ao explicar a ausência de Temer, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que o presidente "possui imunidade temporária à persecução penal”. Esse entendimento invoca o parágrafo 4º do artigo 86 da Constituição, que determina que "o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções".

Por essa linha, o presidente não pode ser acusado ou julgado por algo que aconteceu antes da sua posse. Como as menções a Temer se referem a episódios ocorridos antes de 2016, quando ele assumiu a Presidência, elas não deveriam ser usadas como base para um inquérito contra o peemedebista.

Não é a primeira vez que isso ocorre com Temer. No fim de março, Janot usou o mesmo argumento quando analisou um trecho da delação do ex-diretor da Transpetro Sérgio Machado, que também implicou o presidente com repasses ilegais de campanha em 2012.

"Excepciona-se apenas o trâmite da investigação em relação ao atual presidente da Republica, Michel Temer (...) porque ele possui imunidade temporária a persecução penal", escreveu Janot no dia 28 de março. Ao justificar a atitude, ele afirmou que sua conclusão teve como base o "entendimento do Supremo Tribunal Federal".

Entendimento conflitante

Mas conforme o próprio Supremo, embora o presidente não possa ser responsabilizado, isso não quer dizer que ele não possa ser investigado ou se tornar alvo de um inquérito. Tal entendimento foi explicitado pelo antigo ministro Teori Zavascki, antecessor de Edson Fachin na relatoria da Lava Jato.

Em maio de 2015, Zavascki disse em um despacho que a então presidente Dilma Rousseff, poderia, sim, ser investigada se a Procuradoria-Geral da República (PGR) fizesse um pedido nesse sentido e oferecesse indícios.

"Não se nega que há entendimento desta Suprema Corte no sentido de que a cláusula de exclusão de responsabilidade prevista no parágrafo 4º do artigo 86 da Constituição não inviabiliza, se for o caso, a instauração de procedimento meramente investigatório, destinado a formar ou a preservar a base probatória para uma eventual e futura demanda contra o Chefe do Poder Executivo", disse o ministro.

Ou seja, a investigação pode começar quando o presidente ainda está no exercício do mandato, ele só não pode ser processado. Eventualmente, o que aparecer na investigação pode ser usado para montar um caso quando ele deixar o cargo. Teori citou que sua conclusão era baseada no entendimento de outro ministro, Celso de Mello, o decano do Supremo.

Teori se manifestou por causa de um pedido do PPS, partido que fazia oposição a Dilma. A sigla queria que a PGR levasse adiante uma investigação contra a petista por suposto envolvimento dela nos desvios da Petrobras. A investigação não foi adiante porque a PGR entendeu que não havia indícios suficientes para justificar a abertura do inquérito. Teori respondeu ao PPS que somente poderia aceitar abrir um inquérito se a PGR oferecesse o pedido, já que cabe ao Ministério Público acionar o Supremo.

À época, o teor do despacho de Teori foi tema de reportagens do jornal O Estado de S. Paulo e da revista Veja. Um dos colunistas desta última chegou a afirmar que "não dá mais para Janot se esconder numa lei que não existe" e que "Dilma começou a correr bem mais riscos".

Nesta quarta-feira, ao comentar a ausência de Temer como alvo dos inquéritos, o jornalista e blogueiro Josias de Souza afirmou que "valendo-se de um entendimento equivocado, Janot livrou Temer de ser investigado no STF".